Cidade, universidade e percepções docentes no contexto da expansão interiorizada do ensino superior público no Estado do Ceará

AutorCarlos Henrique Lopes Pinheiro
CargoDoutor em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará
Páginas38-54
R. Inter. Interdisc. INTERthesis, Florianópolis, v.15, n.2, p.38-54 Mai.-Ago. 2018
ISSN 1807-1384 DOI: 10.5007/1807-1384.2018v15n2p38
Artigo recebido em: 29/06/2017 Aceito em: 11/05/2018
Esta obra está licenciada com uma Licença Creative Commons
CIDADE, UNIVERSIDADE E PERCEPÇÕES DOCENTES NO CONTEXTO DA
EXPANSÃO INTERIORIZADA DO ENSINO SUPERIOR PÚBLICO NO ESTADO DO
CEARÁ
Carlos Henrique Lopes Pinheiro
1
Resumo:
Este artigo tem como objetivo discutir a relação cidade/universidade a partir do
processo de expansão e interiorização das instituições públicas de ensino superior no
estado do Ceará. O desenvolvimento deste trabalho apoiou-se na pesquisa de base
qualitativa, privilegiando abordagens narrativas sobre as trajetórias docentes,
investigando o modo como os mesmos percebem e mantêm relações com o local de
trabalho. Foram realizadas entrevistas com diretores de centros e com 49 docentes
(27 do gênero masculino e 22 do gênero feminino) em todos os campi onde existem
cursos presenciais de Instituições de Ensino Superior Públicas - IESP (estadual e/ou
federal) no Ceará. A partir do material produzido foi possível constatar que existem
inúmeras dificuldades de reconhecimento e pertencimento do/a docente com seu local
de trabalho, que a análise da interiorização do ensino superior deve ser realizada,
também, considerando aspectos subjetivos dos sujeitos que as constituem, que as
dificuldades estruturais das cidades e o modo como o/a docente percebe, senti e se
identifica com estas cidades pode resvalar sobre as condições e organização do
trabalho por ele/a desenvolvido.
Palavras-Chaves: Ensino Superior. Expansão e Interiorização. Cidade e
Universidade. Trabalho Docente.
1 INTRODUÇÃO
Fruto de inúmeras e profundas transformações pelas quais tem passado a
educação superior brasileira nos últimos anos, o fluxo ou a circulação de professores
universitários pelo interior do estado do Ceará tem se tornado um evento cada vez
mais constante e significativo. O processo de interiorização proporcionou,
indubitavelmente, uma crescente mobilidade socioespacial dos docentes neste
Estado. No entanto, a “expansão territorializada” expôs uma relação, muitas vezes
conflituosa, do/a docente com o a cidade onde trabalha e, de certo modo, uma
1
Doutor em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará. Pós-Doutorado em Conhecimento e
Inclusão social em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professor na área das
Ciências Humanas dos Cursos de Bacharelado e do Mestrado Interdisciplinar em Humanidades do
Instituto de Humanidades e Letras da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro -
Brasileira em Redenção, CE, Brasil. E-mail: carlos.henrique@unilab.edu.br
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“negação” em permanecer nestes municípios um tempo maior do que o efetivamente
“necessário” para o exercício de suas atividades laborais. Não raro,
independentemente do tempo de permanência semanal em seus locais de trabalho,
os/as docentes expressam sentimentos como “eu trabalho aqui, mas moro em
Fortaleza” ou “Aqui é meu lugar de trabalho, meu lugar de vivência é outro”.
Mas, afinal, “por que ficar, principalmente, aqui e não em outro lugar”? O
questionamento de Schaller (2008, p.67), elaborado para conceber o lugar enquanto
espaço dialético, constitutivo do eu, aprendente
2
em suas palavras, que remete à
relação da pessoa com ela própria e com os outros, se mostra bastante pertinente às
nossas análises. Para além da existência corpórea (material) o lugar, conforme Santos
(2012), se define aqui por sua existência relacional, pela sua funcionalidade e por
onde ele é vivido e percebido empiricamente, no qual através e a partir dele é possível
tomar consciência do mundo. Nesta perspectiva, a inversão da pergunta se mostra
igualmente relevante para pensarmos sobre decisões e percepções dos docentes
interlocutores: Por que não ficar, principalmente, aqui e sim em outro lugar?
Este trabalho traz elementos e algumas reflexões sobre a problemática da
relação cidade/universidade dispostas pela apreensão dos/as docentes
interlocutores/as da pesquisa. Pela pertinência que o tema ganhou nas abordagens
de campo por ocasião da tese de doutorado “Percepções e Trajetórias Docentes:
mobilidade no contexto da interiorização e expansão do ensino superior público no
estado do Ceará, desenvolvida no programa de Pós-Graduação em Sociologia da
Universidade Federal do Ceará (2013), optamos por dá-lo um tratamento especial,
específico, voltado para a reflexão tanto do papel que as universidades desempenham
nas cidades que se instalam (ao menos o que se espera que elas desempenhem)
como da percepção dos agentes que nelas atuam, no caso, seus professores efetivos
já aprovados no estágio probatório, ou seja, com no mínimo três anos de exercício
profissional no serviço público.
2
Ao longo de todo o texto referendado, o autor faz inúmeras definições do que denomina de “lugar
aprendente”. Aqui apresentamos uma delas que, no nosso entendimento, sistematiza a ideia proposta:
“Um lugar, através da atualização das redes de atores que o atravessam é aprendente porque permite
deixar marcas do conjunto das relações, das ligações, das associações entre os atores. Cada elo
dessas redes pode se tornar um evento, uma bifurcação, traduzindo a inteligência coletiva dos atores
e os processos de historização aos quais se submetem as práticas, as experiências e as ações
transformadoras desses atores. Nesse sentido, todo lugar é aprendente. Assim os lugares se
constituem e aprendem ao mesmo tempo em que ensinam e constituem os atores que vivem neles”.

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