A cidadania na ordem constitucional brasileira

AutorHamilton da Cunha Iribure Jr
Páginas95-115
Revista Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 6, n. 11, p. 95-115, jan./jun. 2015
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A CIDADANIA NA ORDEM CONSTITUCIONAL BRASILEIRA
Hamilton da Cunha Iribure Júnior*
RESUMO: O presente trabalho debate os principais aspectos do entendimento
acerca da cidadania no sistema constitucional brasileiro vigente, a partir da ótica
de ser possível sustentar sua delimitação, tendo em vista os parâmetros que
envolvem a justiça e a norma de direito. Uma possível conclusão indica que o
conceito de cidadania, em modelos constitucionais como o adotado pelo Brasil,
se forma a partir de valores eleitos pela norma jurídica e que representam,
geralmente, ideais de democracia, igualdade, liberdade e fraternidade.
Palavras-chave: Cidadania. Justiça. Norma Constitucional. Democracia.
1 INTRODUÇÃO
A análise das diversas dimensões que costumeiramente se atingem, a partir das
apreensões teóricas de cidadania e justiça, pode ser realizada sob diversas angulações. O
sistema constitucional brasileiro, ao adotar uma metodologia amplamente democrática,
inserindo conteúdos sociais em norma de Direito Constitucional, deu uma grande
contribuição para que fossem fixadas matrizes fundamentais, no âmbito dos Direitos e
das Garantias Individuais, para a tutela dos interesses do cidadão.
As pesquisas que são desenvolvidas e que fomentam o presente trabalho têm por
objetivo analisar e debater os fundamentos que demonstram a construção do ideal de
cidadania, tendo em vista o sistema e a ordem constitucional vigentes. As premissas
adotadas para a construção do objeto do presente artigo tomam por base os parâmetros
que envolvem a justiça e a norma de direito, aspectos esses, ainda, conectados com os
ideais de democracia, igualdade, liberdade e fraternidade. Essa é a proposta do vertente
trabalho.
O núcleo do entendimento aqui esboçado parte da premissa de aprofundamento
histórico, contemplado principalmente nos trabalhos de Sócrates e de Platão, dos quais
importante lição se extrai no sentido de que o homem recebe motivação fundamental
para o seu agir na busca e no entendimento do bem (GILISSEN, 1995, p. 76-77).
Assim, a noção ética de bem é a que envolve os ideais de conveniência, de
utilidade e de justiça e estes, por seu turno, inspiram as dimensões encartadas para o que
se pretende em termos de acesso à Justiça Social através do exercício da cidadania.
* Doutor e Mestre em Direito pela PUC/SP. Professor Adjunto da Faculdade de Direito do Sul de Minas
(FDSM), na Graduação e no Programa de Mestrado em Di reito Constitucional. Avaliador dos Cursos
de Grad uação em Direito do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
(INEP) e do Ministério da Educação (MEC). Advogado. E-mail: hamilton.adv@terra.co m.br.
A cidadania na ordem constitucional brasileira
Revista Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 6, n. 11, p. 95-115, jan./jun. 2015
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Pode-se imaginar que seres racionais e irracionais estejam ligados à noção do
bem, à medida que a natureza é harmônica e proporciona o equilíbrio a todo e qualquer
objeto ou ser vivente. É, portanto, indissociável o conteúdo da busca do bem através do
que pode ser entendido por justo. E nas hastes de uma sociedade regrada por normas de
conduta, o direito intercepta a noção de justiça.
Destarte, as dimensões consideradas para o que se tem por ideal de justiça traz
consequências importantes na forma pela qual se concebe a estrutura de uma Carta
Constitucional num Estado Democrático de Direito. Exemplo disso é a construção do
denominado Bloco de Constitucionalidade, mínimo existencial dos Direitos e das
Garantias Fundamentais que arrimam os Direitos Individuais numa determinada
sociedade.
Em todas as linhas de pesquisa ora desenvolvidas percebe-se a unanimidade na
questão de procurar caracterizar o direito a partir de uma concepção do que venha a ser
Justiça. A par de toda a gama de implicâncias conceituais, no presente invoca-se uma
abordagem para caracterizar alguns dos diversos critérios que são empregados para
entender a possibilidade de se fazer atingir a justiça tendo como ponto de partida a
incidência de um sistema jurídico. A seguir algumas dessas considerações de relevo
nesse talante.
A cidadania é um tema muito caro no sistema constitucional brasileiro atual. Na
história do constitucionalismo nacional, as Cartas Políticas anteriores a 1988 não deram
a dimensão devida à cidadania por não relacionarem em seu conceito o aspecto
interdisciplinar que essa locução agrega. Ademais, procurou-se fazer destaques nos
textos constitucionais associando o verbete “cidadania” nos contextos de ser nacional,
de poder votar, de estar em território nacional.
Na atual sistemática da Carta de 1988, ao contrário, buscou o legislador
constituinte quebrar com essa tradição de isolar o conceito de cidadania para irradiá-lo
pelos diversos setores e temáticas tratadas no bojo daquele documento. Tamanha
representatividade ganha esses contornos que, entre nós, desde sua promulgação, a
Constituição da República de 1988 recebe a alcunha de Constituição “Cidadã” por
agregar ao conceito de cidadania valores fundamentais, nos planos individual e social.
Reconhecendo à cidadania o status de fundamento republicano, a Carta Política
atual adverte que nas relações entre Estado e indivíduo, seja em que dimensão estas se
travarem, haver-se-ão de serem aplicados mecanismos que assegurem efeitos práticos

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