A cédula de crédito bancário (Medida Provisória 1.925, de 14.10.1999)

AutorHaroldo Malheiros Duclerc Verçosa
Páginas129-135

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Reecente estudo feito pelo Banco Central do Brasil procurou avaliar a razão do grande spread que se verifica entre as taxas de captação e as de aplicação das instituições financeiras. Os resultados, divulgados ao público, demonstraram que, além da cunha fiscal e de outras causas diversas, uma grande parte do aludido spread é originado do risco de inadimplência dos toma-dores de empréstimos daquelas empresas. Entre diversas medidas que foram propostas pelo BACEN ao Governo, e que estão sendo progressivamente adotadas por meio de normas jurídicas legais e regulamentares diversas, está o novo título de crédito criado por meio da Medida Provisória 1.925, de 14.10.1999 (DOU 15.10.1999).

Esse novo papel objetiva dar às instituições financeiras mecanismos mais aptos a garantir seus interesses na concessão de crédito, eliminando antigos entraves na constituição do crédito sob a forma de um título representativo de dívida líquida e certa e lhes dando um amplo e enorme poder para sua cobrança. Nesse sentido, pode-se comparar a Cédula de Crédito Bancário com o mais poderoso míssil nuclear dotado de múltiplas e mortais ogivas. É o que se poderá verificar a partir do breve estudo que em seguida se faz.

1. Os favorecidos da Cédula de Crédito Bancário - CCB (art 1°)

O foco na CCB não está voltado para o emitente (qualquer pessoa física ou jurídica), mas, isto sim, para as pessoas de seus favorecidos, na condição exclusiva de instituições financeiras e a entidades a estas equiparadas.

O conceito de instituição financeira é dado, como se sabe, pelo art. 17 da Lei 4.595/64, ou seja, "as pessoas jurídicas públicas ou privadas que tenham como ativi-dade principal ou acessória a coleta, inter-mediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a custódia de valor de propriedade de terceiros".

As instituições financeiras dependem de autorização do BACEN para funcionar (Lei 4.595/64, art. 18) e, de maneira geral, correspondem aos diversos tipos de bancos, de sociedades de crédito, financiamento e investimentos e de caixas económicas.

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A elas são equiparadas, para os fins da legislação bancária, as empresas de leasing.

O novo título de crédito será utilizado, portanto, para favorecer a cobrança de operações de crédito concedidas por instituições financeiras ou entidades a elas equiparadas, integrantes do Sistema Financeiro Nacional, cuja composição é dada pelo art. l9 da Lei 4.595/64, do qual fazem parte o próprio BACEN, o Banco do Brasil S/A e o Banco Nacional do Desenvolvimento Económico e Social, que, evidentemente, poderão valer-se da CCB em suas próprias operações de crédito.

Desde que a obrigação representada pela CCB esteja exclusivamente sujeita à lei e ao foro brasileiros, o título poderá ser emitido em favor de instituição financeira domiciliada no exterior. Neste caso, o valor poderá ser expresso em moeda estrangeira.

2. A natureza jurídica da CCB (art 1° "caput" e art 3°)

A CCB assume a forma de uma promessa de pagamento, emparelhada, portando, à Nota Promissória, mas que passa a apresentar contornos nitidamente diferenciados, previstos no texto legal que a criou.

Do ponto de vista processual, trata-se de um título executivo extrajudicial, representando dívida em dinheiro certa, líquida e exigível. O seu valor corresponderá à importância nela expressamente indicada ou, se for o caso, pelo saldo devedor demonstrado em planilha de cálculo, ou nos extratos de conta corrente, emitidos pelo credor.

Com essa solução, o legislador ad hoc procurou afastar as exceções que os devedores pudessem fazer quanto à certeza, liquidez e exigência da dívida, na forma de defesa prévia. Os lançamentos feitos pelo credor contra o devedor gozarão de fé pública, e formarão com o principal da CCB ou por si próprios, o montante da obrigação cartular, uma vez que integram o valor do título.

Caberá ao devedor o ónus de provar que os cálculos efetuados pelo credor destoaram das avenças entre eles celebradas e, assim, procurar elidir eventuais excessos praticados por este último.

Pode-se, dessa forma, classificar a CCB como um título de crédito estrito senso, dotado de cartularidade, literalidade, autonomia, causalidade e dependência. Causalidade porque necessariamente originada de uma determinada operação de crédito. Dependência porque está vinculada ao fato de que elementos externos à cártula a integrarão nos direitos e obrigações nela mencionados.

3. A extensão monetária das obrigações do devedor (art 3°, § 1°)

Considerando que, atualmente, em face da falta de regulamentação do art. 192 da Constituição Federal, as instituições financeiras não estão sujeitas a qualquer limitação na fixação dos encargos fixados para seus devedores, a expressão desses fica na exclusiva dependência do credor que pode livremente estabelecê-los.

Dessa forma, somando-se ao valor do principal da operação de crédito concedida, na CCB poderão ser pactuados:

- os juros da dívida, capitalizados ou não, os critérios de sua incidência, a periodicidade da capitalização (se for o caso), bem como as despesas e os demais encargos decorrentes da obrigação;

- os critérios de correção monetária ou de atualização cambial da dívida, na forma da lei;

- os casos de mora, de multas e penalidades contratadas e as hipóteses de vencimento antecipado da dívida; e

- o valor do ressarcimento à instituição financeira concedente do crédito, pelo próprio emitente ou por terceiro garantidor, das despesas de cobrança da dívida e dos honorários advocatícios extrajudiciais, que não poderá ultrapassar o limite de 10% do...

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