Breves considerações sobre o assédio sexual nas forças armadas com base no Código Penal Militar
Autor | Marco Aurélio Aguiar Barreto - Camila Pitanga Barreto |
Páginas | 56-61 |
Page 56
Destaca-se o fato do Código Penal Militar Brasileiro não prever tipiicação para ocorrências de assédios sexual e moral. Alguns autores entendem que no momento em que houve a edição do Decreto-lei n. 1.001, de 21 de outubro de 1969, não haviam mulheres integrando os quadros das instituições militares.
Com todo o respeito, há de se entender que a justiicativa não faz sentido, considerando que a prática desse delito não se restringe às mulheres como alvos, porque a prática independe de gênero ou opção sexual. Por óbvio, as mulheres são as principais vítimas. E, por seu turno, mais uma razão para não justiicar a ausência de previsão da tipicidade do assédio sexual, considerando que o próprio Código Penal Militar47, em seu Título IV – DOS CRIMES CONTRA A PESSOA, no Capítulo VII trata DOS CRIMES SEXUAIS, como o Estupro e a Prática de Ato Libidinoso, apesar de editado na vigência de um Ato Institucional em período de Exceção, não ignorou a igura da mulher, fazendo a ela referência expressa como vítima no caso de estupro, ou, contra homossexual ou não, no caso de prática de ato libidinoso em lugar sujeito à administração militar. Eis a literalidade:
Estupro
Art. 232. Constranger mulher a conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça.
Pena – reclusão, de três a oito anos, sem prejuízo da correspondente à violência.
Page 57
Atentado violento ao pudor
Art. 233. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a presenciar, a praticar ou permitir que com ele pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal.
Pena – reclusão, de dois a seis anos, sem prejuízo da correspondente à violência.
Corrupção de menores
Art. 234. Corromper ou facilitar a corrupção de pessoa menor de dezoito e maior de quatorze anos, com ela praticando ato de libidinagem, ou induzindo-a a praticá-lo ou presenciá-lo.
Pena – reclusão, até três anos.
Pederastia ou outro ato de libidinagem
Art. 235. Praticar, ou permitir o militar que com ele se pratique ato libidinoso, homossexual ou não, em lugar sujeito a administração militar.
Pena – detenção, de seis meses a um ano.
Presunção de violência
Art. 236 – Presume-se a violência, se a vítima:
I – não é maior de quatorze anos, salvo fundada suposição contrária do agente;
II – é doente ou deiciente mental, e o agente conhecia esta circunstância;
III – não pode, por qualquer outra causa, oferecer resistência.
Aumento de pena
Art. 237. Nos crimes previstos neste capítulo, a pena é agravada, se o fato é praticado:
I – com o concurso de duas ou mais pessoas;
II – por oicial, ou por militar em serviço.
(...)
Ora, se desde a origem do Código Penal Militar já havia previsão das práticas delituosas acima transcritas perpetradas contra as mulheres, não tem razão alguma não ter sido alterado o referido Código para, também, ser incluída a prática do assédio sexual, como o fez o Código Penal Brasileiro, com a inclusão do art. 216-A.
Por oportuno, merece ênfase o julgamento parcialmente procedente, da ADPF – Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 291/DF48, requerida pela Procuradoria Geral da República, sob a Relatoria do Ministro Roberto Barroso, julgada pelo Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal, para declarar que não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988 as expressões “pederastia ou outro” e “homossexual ou não”, contidas no art. 235 do Código Penal Militar, porque têm sentido pejorativo e discriminatório, marca de intolerância, em violação ao reconhecido direito à liberdade de orientação sexual e à liberdade existencial. Eis a íntegra da Ementa do Acórdão:
Page 58
Ementa: ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. ART. 235 DO CÓDIGO PENAL MILITAR, QUE PREVÊ O CRIME DE “PEDERASTIA OU OUTRO ATO DE LIBIDINAGEM”. NÃO RECEPÇÃO PARCIAL PELA CONSTITUIÇÃO DE 1988. 1. No entendimento majoritário do Plenário do Supremo Tribunal Federal, a criminalização de atos libidinosos praticados por militares em ambientes sujeitos à administração militar justiica-se, em tese, para a proteção da hierarquia e da disciplina castrenses (art. 142 da Constituição). No entanto, não foram recepcionadas pela Constituição de 1988 as expressões “pederastia ou outro” e “homossexual ou não”, contidas, respectivamente, no nomen iuris e no caput do art. 235 do Código Penal Militar, mantido o restante do...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO