Bônus de contratação - Impactos previdenciários

AutorTheodoro Vicente Agostinho/Marcelino Alves De Alcântara/Marco Dulgheroff Novais
Páginas223-233

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O bônus de contratação, também chamado de hiring bonus, sign-on bonus, bônus de atração de executivos, bônus de admissão, gratificação sobre contratação ou, simplesmente, luvas de contratação378, trata-se de uma recente prática corporativa, consistente no oferecimento a empregados de vantagens diversas (como o bônus por receita, bônus por equipe, bônus por lucros em transações, opções de ações, opções de ações fantasmas, uma variedade de prêmios, participação nos lucros e/ou resultados e até crédito em cartões, entre outros tantos) para fins de mudança de emprego (com o desligamento de contrato de trabalho de uma empresa — para fins de ingresso na outra — que oferece o atrativo).

A grande celeuma da concessão desta verba é a possibilidade de que seja reconhecida a natureza salarial de tais pagamentos, gerando, consequentemente, seus respectivos encargos trabalhistas, fundiários e, especialmente na discussão em tela, tributários.

Um dos primeiros pontos a serem destacados é que a legislação trabalhista brasileira — exceção feita à Lei n. 6.354/1976379 (já revogada pela Lei n. 12.395, de 2011), a qual versa especificamente sobre atletas profissionais — não prevê ou disciplina diretamente tal instituto.

Neste sentido, nem a doutrina nem a jurisprudência enfrentaram de forma satisfatória a questão, haja vista tratar-se de um tema relativamente isolado e também em razão de não ser tão comum a sua concessão. Nos poucos casos julgados, na esfera trabalhista, o TST tem sido favorável à natureza salarial das luvas, pois, ao seu entender, não correspondem à indenização, pois não visam ao ressarcimento, compensação ou reparação de nenhuma espécie.

Entretanto, mesmo não havendo grande número de empregados que a recebem, atualmente, o Fisco está, reiteradamente, analisando a sua natureza jurídica, de forma a demonstrar que estes valores sejam reconhecidos como verbas de natureza salarial, motivo pelo qual encontrariam caracterizados como salário de contribuição.

A primeira controvérsia a ser enfrentada consiste no fato de inexistir no ordenamento pátrio previsão específica sobre a incidência ou a não incidência de contribuições sociais sobre esta verba.

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Sob esta discussão, é possível adotar dois posicionamentos:

Para o primeiro entendimento (normalmente o fiscal), a legislação previdenciária excluiu determinadas parcelas da incidência previdenciária, enumerando em lista exaustiva as verbas que estariam fora do campo de tributação na modalidade de regra isentiva (§ 9º do art. 28 da Lei n. 8.212/1991), e não em lista exemplificativa, pois seria temerário submeter à análise discricionária do Fisco de afastar ou não a incidência da contribuição previdenciária, bem como largar ao arbítrio interesses ou conveniência das empresas a ocorrência dessa incidência.

Para robustecer este posicionamento, argumenta-se que a interpretação da norma isentiva não permite incluir nela situações ou pessoas que não estejam expressamente previstas no texto legal instituidor, em face da literalidade em que deve ser interpretada, nos termos do art. 111, inciso II, do Código Tributário Nacional — CTN380, do contrário estaria imprimindo-lhe um alcance que a norma não tem nem poderia ter, já que as regras de isenção não comportam interpretações ampliativas.

EMENTA: TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. IMPOSTO DE RENDA. TERÇO CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. ISENÇÃO. MOLÉSTIA GRAVE. VERBAS SALARIAIS. ART. 6º, XIV, DA LEI N.
7.713/88. 1. As regras que tratam de suspensão ou exclusão de crédito tributário são interpretadas literalmente, nos termos do inc. I do art. 111 do CTN, devendo ser observado o estrito teor dos dispositivos contidos na legislação tributária. 2. A isenção do imposto de renda em função de moléstia grave restringe-se aos proventos de aposentadoria ou reforma, nos termos do art. 6º da Lei n. 7.713/88. 3. A não-incidência de imposto de renda sobre os valores pagos a título de férias indenizadas e seu adicional de 1/3 já foi, inclusive, objeto dos Atos Declaratórios n. 5 do Procurador-Geral da Fazenda Nacional, de 07.11.2006, publicado no DOU de 17.11.2006, e n. 6 do Procurador-Geral da Fazenda Nacional, de 1º.12.2008, publicado no DOU de 11.12.2008, contudo, o terço constitucional de férias gozadas não tem como escapar do enquadramento de acréscimo patrimonial tributado pelo IR, uma vez que a própria CF/88 qualifica-o como produto pecuniário do trabalho. (TRF4, AC 5006258-75.2013.404.7100, PRIMEIRA TURMA, Relator Jorge Antonio Maurique, juntado aos autos em 15.01.2015.)

Dessa forma, todas as verbas não excluídas pelo § 9º do art. 28 da Lei n. 8.212, de 1991, seriam consideradas salário de contribuição.

Neste sentido, há, inclusive, decisões exaradas pelo e. Superior Tribunal de Justiça, conforme aresto abaixo:

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 282/STF. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. VERBAS SALARIAIS. INCIDÊNCIA. AUXÍLIO-DOENÇA. NÃO-INCIDÊNCIA. (...) 11. Com efeito, a Lei n. 8.212/1991 determina a incidência da Contribuição Previdenciária sobre o total da remuneração paga, com exceção das quantias expressamente arroladas no art. 28, § 9º, da mesma lei. 12. Enquanto não declaradas inconstitucionais as Leis ns. 9.032/1995 e 9.129/1995, em controle difuso ou concentrado, sua observância é inafastável pelo Poder Judiciário (Súmula Vinculante n. 10/STF). 13. O STJ pacificou o entendimento de que não incide Contribuição Previdenciária sobre a verba paga pelo empregador ao empregado durante os primeiros quinze dias de afastamento por motivo de doença, porquanto não constitui salário. 14. Agravos Regimentais não providos. (STJ, 2ª Turma, AgRg nos EDcl no REsp 1098218, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 09.11.2009.)

Todavia, em sentido diverso, existe entendimento de que a base de cálculo da contribuição previdenciária está prevista no texto da lei, motivo pelo qual não comporta ilações, muito menos alargamento para a inserção de verba não prevista legalmente.

Assim, somente é cabível a cobrança de contribuição, exclusivamente, para rendimentos advindos do exercício do trabalho. Como há discussão sobre se o bônus de contratação é decorrente de vínculo laboral, estaria fora, por expressa previsão legal, da base de incidência.

Ademais, as isenções do § 9º do art. 28 da Lei n. 8.212, de 1991, seriam exemplificativas, pois o legislador não poderia prever todas as verbas que estariam fora da hipótese de incidência das contribuições previdenciárias.

EMENTA: AVISO PREVIO INDENIZADO — CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA — NÃO INCIDÊNCIA. A simples supressão da expressão aviso prévio indenizado do rol das parcelas não integrantes do salário de contribuição não induz, por si só á conclusão de que o título se tornou tributado. Isso porque o art. 28, § 9º, da Lei n. 8.212/1991 é meramente exemplificativo; afinal, o que determina a incidência da contribuição previdenciária é a natureza salarial ou não da parcela. (TRT6, Processo 0138800-94.2009.5.06.0003, Relator Joselia Morais da Costa, Publicação 09.07.2010)

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Outrossim, pelo fato de não haver previsão legal sobre pagamento do bônus de contratação não se poderia chegar à interpretação de viés arrecadatório de que esse valor deveria integrar o salário de contribuição e a base de cálculo da contribuição previdenciária da empresa.

Por fim, a própria Constituição determina que não é possível se exigir tributo sem lei que o estabeleça381.

Neste sentido, a ausência de específica norma que regule a questão atuaria como um limitador ao poder tributar.

Outro ponto deveras controvertido decorre da divergência sobre a natureza jurídica dessa verba.

Teria natureza remuneratória, assumindo uma feição de “antecipação salarial”; seria um ganho eventual, totalmente desvinculado do salário; seria uma indenização ou poderia ser entendida como um contrato de natureza cível, sem qualquer tipo de vinculação às normas laborais e previdenciárias?

O posicionamento fiscal, normalmente, entende que o pagamento de bônus de contratação a profissional, destinado a atraí-lo para trabalhar na empresa, corresponde, por seu caráter contraprestacional, à remuneração antecipada, integrando, por isso, o salário de contribuição previdenciário. No mesmo sentido, vide o entendimento do CARF:

EMENTA: CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS E DE TERCEIROS. OBRIGAÇÃO DO RECOLHIMENTO. A empresa é obrigada a recolher, nos prazos definidos em lei, as contribuições a seu cargo, incidentes sobre as remunerações pagas, devidas ou creditadas, a qualquer título, aos segurados empregados e contribuintes individuais a seu serviço. (...) CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. PRÊMIOS E GRATIFICAÇÕES. SALÁRIO DE CONTRIBUIÇÃO. Os valores auferidos por segurados obrigatórios do RGPS a título de prêmios e/ou gratificações integram o Salário de Contribuição para todos os fins previstos na Lei de Custeio da Seguridade Social. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. HIRING BONUS. SALÁRIO DE CONTRIBUIÇÃO. O valor pago pela empresa a segurado obrigatório do RGPS a título de hiring bonus, configura-se como antecipação salarial, integrando o conceito jurídico de Salário de Contribuição para todos os fins previstos na Lei de Custeio da Seguridade Social. (...) Recurso Voluntário Provido em Parte. Recurso de Ofício Negado. (CARF, Processo 16327.720384/2011-07, RECURSO VOLUNTÁRIO, Data da Sessão: 08.03.2016, Relator(a) Arlindo da Costa e Silva, n. acórdão 2401-004.194.)

Neste ínterim, o fato da verba (hiring bonus) ter sido paga na contratação do empregado, porém, antes da prestação do serviço, que se concretizará ao longo da vigência do contrato de trabalho, não teria o condão de descaracterizar a sua natureza remuneratória, pois seria evidente o seu caráter contraprestacional ao serviço que será prestado futuramente pelo empregado.

Analisando especificamente esta questão, o TRF3, decidiu que:

EMENTA...

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