Biografias não autorizadas e a ilegitimidade da ficção
Autor | Melina Girardi Fachin |
Cargo | Doutora em direito constitucional |
Páginas | 38-46 |
38 REVISTA BONIJURIS I ANO 32 I EDIÇÃO 663 I ABR/MAIO 2020
cAPA
Melina Girardi Fachin DOUTORA EM DIREITO CONSTITUCIONAL
BIOGRAFIAS NÃO AUTORIZADAS
E A ILEGITIMIDADE DA FICÇÃO
Em que pese ter votado a questão, o STF não encerrou o debate, uma
vez que a ideia de última palavra é incompatível com o dinamismo
político-jurídico que se traduz no processo de tomada de decisões
A análise dessas diversas
formas de vislumbrar o direito
a partir da literatura é, em rea-
lidade, a apreciação de modos
plurais e maleáveis de incidên-
cia do fenômeno jurídico.
No caso das biografias, não
se trata de acondicionar a li-
teratura no direito, mas de
compreender seu sentido e
manifestação literária, para,
em debate construtivo, chegar
a uma solução jurídica mais
adequada.
Esse diálogo é bastante
interessante porque as bio-
grafias divisam o imaginário
da realidade e caminham, na
zona limítrofe, entre o real
e a fantasia. Não são uma ra-
diografia da realidade porque
sempre pressupõem a media-
ção do literato sobre o dado
que se reflete1. No caso das bio-
grafias não autorizadas essa
zona limítrofe se agudiza2.
Assim sendo, os limites do
sujeito e da personagem nem
sempre estão claros para de-
finir os contornos da intimi-
dade e do público. Todavia,
o direito é chamado a dar uma
resposta sobre a polêmica e
precisar a cerca entre o jardim
e a praça (S, 993).
Muitos podem se indagar o
que resta ainda falar do tema
se o Supremo Tribunal Federal
– em julgamento recente3 – já
decidiu justamente nesse sen-
tido.
Em primeiro lugar, estamos
entre aqueles que veem no
Poder Judiciário um dentre os
muitos abalizados atores da
interpretação constitucional4.
No que toca ao plano estatal, à
luz dessa tônica colaborativa,
INTRODUZINDO O TEMA:
AS BIOGRAFIAS ENTRE O
DIREITO E A LITERATURA
Atemática das biogra-
fias não autorizadas
ladeia o direito e a li-
teratura, a realidade e
a ficção, colocando em
conflito a liberdade de expres-
são e o direito à intimidade.
Entrever a temática não
apenas pelas lentes exclusi-
vamente jurídicas, mas consi-
derar a porosidade e o areja-
mento que o discurso literário
pode oferecer ao tema, coloca a
questão em novos planos. Pen-
sar o direito a partir da litera-
tura não é apenas pensar – ou
seja, as maneiras de conexão
entre esses dois discursos não
é discussão relegada ao plano
abstrato –, pois exsurgem daí
consequências práticas.
Rev-Bonijuris__663.indb 38 17/03/2020 17:33:34
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