Biodireito: fator de pré-disposição para a “religação dos saberes”

AutorPedro Jorge de Oliveira Rodrigues
CargoEspecialista em Direito Civil e os Novos Rumos do Direito Processual Civil e Mestrando em Direito pela URI Santo Ângelo-RS
Páginas214-226

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Introdução

Nossas relações com o mundo passam por um esgotamento de saberes que mais reproduzem um entendimento de acomodação do que criam e modificam as constantes demandas que carecem de novas respostas a estímulos diferentes de convivência e, principalmente, do” modus faciende” da elaboração dos mais diversos conhecimentos. Desta forma, projeta-se uma desorientação orquestrada por velhos paradigmas que moldam uma aceitação e representação de valores orientados para uma operação intelectiva de nossas ações, conduzidas por expectativas que nos desvirtuam da verdadeira rota de percepção reflexiva sobre a importância e as reações que os saberes exercem sobre a sociedade. Estamos, pois, nos referindo ao “risco” que está impregnado nas mais diversas atividades humanas. São nos estabelecidos padrões e normas de condutas dos quais deveremos seguir e respeitar segundo uma concepção pré-determinada para justamente dar uma sensação de “normalidade” e a tão esperada proteção e segurança que o mundo globalizado tenciona proporcionar exaustivamente.

Nesse sentido, quando um determinado fato ou evento social adentram uma determinada disciplina do saber e, em confronto com outra disciplina, o mesmo fato ou evento modificam-se e produzem outros significados à medida que vão se agregando outras disciplinas afetas para a elucidação de uma resposta a esses novos desafios. Estas inquietações formam um sistema complexo de relações que torna inviável continuar a entender que o verdadeiro sentido de compreensão está fora da transdisciplinaridade.

O Biodireito surge, pois, como um pressuposto dialético com os diversos saberes, rejuntando-os de maneira a tratar o conhecimento sem “causalidade ou determinismos”, vem dando-nos a possibilidade de resguardo e de uma abertura para a implementação de novas perspectivas que permeiam toda uma cadeia de saberes articulados atualmente de forma descompassada e respondem apenas a uma determinada gama de interesses, motivados pelo Estado ou pela iniciativa privada, sendo estes carregados de uma política de consumo persuasivo, direcionada única e exclusivamente à lucratividade. Mas ao tratarmos da ciência Biodireito, necessariamente adentramos a principiologia de outros dos ramos dessa ciência, que é a Biogenética e a Bioética. A primeira nos conduz ao conhecimento de uma ciência voltada para a estrutura da vida dos seres vivos pautada no estudo e aprimoramento genético e funcional a partir de características celulares produzidas pelos próprios seres, redimensionadas ou modificadas para a construção ou manutenção de outros seres vivos. Já a segunda trata das responsabilidades comPage 215que devemos nos comportar diante das constantes mutações genéticas. Essas poderão nos oferecer, formas de sabermos discernir os limites que são impostos a própria ciência pela natureza.

Portando, percebe-se com bastante acuidade que o Biodireito com suas ramificações, oferece, a partir de seus institutos e principiologia, um grato e satisfatório recurso para que possamos solavancar o estado de estagnação que assola uma determinada disciplina do saber, atuando apenas em seu entorno e esquecendo-se da complementaridade que se torna indispensável a partir da consideração e mensuração de uma outra disciplina compatível para que possamos dar a resposta mais ajustada, e com um certo grau de certeza, que perpassa, obrigatoriamente, pela consideração de outras opiniões e pontos de vista. A transdisciplinaridade, então, amenizará a complexidade das relações dos saberes, através de uma “religação”.

1 Transdisciplinaridade no mundo globalizado

O contexto de mundo em que vivenciamos atualmente nos remete obrigatoriamente para um sistema político pautado pela globalização, termo esse empregado nos dias de hoje fluentemente entre os mais diversos ramos do saber. Tudo se compreende e se reconhece a partir do grande, do abrangente, do todo. Ocorre que tal realidade traz consigo avanços e tormentos.

Para se ter uma ideia do que se aduz desses discursos, basta nos debruçarmos no contexto histórico da evolução humana e passaremos a perceber que nem sempre foi sempre assim. No passado longíngio, a realidade era outra, assim como formas e maneiras de pensar e compreender, lá como aqui, permanecem, ainda, lutas antagônicas de forças de um estabelecimento, de um determinado poder ou de um sistema. O global traz em si a conotação do capital, e este, por conseqüência, uma variedade de valores significativos que privilegiam o individualismo, a competição e, o que é mais afeto a nossa proposta, a especialização produzida por essa massa mercadológica persuadida e ditada pelo capitalismo apenas com a finalidade de amesquinhar comportamentos nocivos à verdadeira vocação de compreensão que os acontecimentos e fenômenos estão prenhes de um tratamento cientifico adequado de legitimação.2

Neste contexto, temos que, na ambiência desse mundo globalizado, gravitam o cenário nacional e o cenário internacional. O primeiroPage 216acomoda uma legitimação interna conduzida por uma política assistencialista que incorpora modos e maneiras de produzir saberes condicionados a uma determinada hegemonia e obediência a um conhecimento que não é propriamente nosso. O segundo se verifica a partir do momento que, para nos relacionarmos fora de nosso cenário original, somos compelidos a aceitar condições e saberes pré-dispostos por uma determinada ciência ou disciplina.

Criou-se, então, uma cultura que, em nome da racionalização e de resultados rápidos e seguros, considera correta a concepção de que basta se ter uma instrumentalidade oferecida pela tecnologia para realizaremos as tarefas sistematicamente, sem a mensuração e ajuda do pesquisador ou cientista de uma determinada disciplina.

A evolução histórica das disciplinas do saber, nesse sentido, nos mostra o caminho percorrido por esses entendimentos e nos remetem para os primórdios do reconhecimento de disciplinas como condição de um meio de estudo e legitimação dos fenômenos científicos ocorridos numa determinada área ou espaço. Ocorre que esse começo se iniciou através de experiências empíricas, associadas ao reconhecimento da religião. As vertentes da origem dos saberes serem tratados com a atual configuração em disciplinas passam obrigatoriamente por teorias de matematização, produzidas a partir de uma concepção racionalista de ver e perceber as coisas.

Estava, pois, estabelecida a especialização, acondicionada num saber que representa uma determinada disciplina. Disciplina essa formada por uma conceptuologia para dar as prováveis respostas a partir de paradigmas internos da própria disciplina do saber e com isso gerar uma acomodação no sentido de que a probabilidade foi alcançada, diagnosticada pelas causas e seus efeitos, determinando-se dessa forma, comportamentos em decorrência de saberes direcionados para uma finalidade em específico.

A tecnologia versus saber fez surgir um paradoxo entre ambas. A tecnologia como forma de apreensão científica, que, implicitamente, está adstrita a avanços e à modernidade de aparatos e engenhos orientados segundo um mandamento operativo direcionado para atender a uma situação determinada. Já o saber é a via oposta à técnica, pois nesta a experiência, somatório de conhecimentos adquiridos ao longo de um espaço de tempo e atrelado ao contato direito com o objeto a ser pesquisado ou analisado, oferece um estudo científico mais aproximado com a realidade, considerando não só o aspecto aparente, mas também a observação...

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