Aviso-prévio como direito fundamental social dos trabalhadores

AutorCarlos Henrique Bezerra Leite
Páginas365-370

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Homenagem

Este singelo estudo sobre aviso-prévio tem por objetivo prestar uma justa e merecida homenagem à professora, escritora, pesquisadora e jurista Gabriela Neves Delgado como reconhecimento pela sua incansável luta teórica e prática em prol da efetivação dos direitos humanos em nosso País, mormente os direitos humanos fundamentais sociais dos trabalhadores.

1. Conceito e natureza jurídica

O instituto do aviso-prévio encontra raízes históricas no Código Comercial de 1850 (art. 81) e no Código Civil de 1916 (art. 1.221).

No âmbito da legislação trabalhista, o Decreto n. 16.107/23 previa o aviso-prévio na locação de serviços domésticos, que tinha prazo determinado.

Posteriormente, a Lei n. 62/35 reconhecia o aviso-prévio como obrigação apenas do empregado, ou seja, o empregador que desejasse rescindir o contrato de trabalho não estava obrigado a dar aviso-prévio ao empregado.

Com o advento da CLT, de 1943 (arts. 487 a 491), o aviso-prévio passou a ser obrigatório para a parte (empregado ou empregador) que desejasse tomar a iniciativa de extinção do contrato de trabalho por tempo indeterminado.

Pode-se dizer, assim, que, à luz da CLT, o aviso-prévio é uma declaração unilateral de vontade da parte que pretende dar por extinto o contrato de trabalho por tempo indeterminado.

Tal declaração possui natureza:

receptícia, porque o aviso só se formaliza após a comunicação efetiva - do empregado ou do empregador - da deliberação de resilir o contrato; e

previdencial, uma vez que dá oportunidade de prevenção ao empregado (para procurar novo emprego) e ao empregador (para que possa contratar um novo empregado).

Além disso, é possível afirmar que é híbrida a natureza jurídica do aviso-prévio, ou seja, quando há trabalho durante o prazo respectivo, ele possui natureza salarial. Caso contrário, isto é, inexistindo trabalho durante o aviso, este passa a ter natureza indenizatória.

Para Valentin Carrion:

O caráter indenizatório que se concede ao pagamento do aviso prévio não trabalhado, que a lei denomina erradamente salário, não lhe retira uma diferença que a realidade impõe: o de seu caráter eminentemente alimentar, o que não acontece com as demais verbas tipicamente indenizatórias. Atribuem-lhe caráter salarial Oliveira Viana, Hirosê Pimpão e Dorval Lacerda, apud Iniciação, Amauri Mascaro Nascimento. O caráter alimentar do pagamento poderia permitir sua inclusão na falência, como crédito privilegiado (agora superado, cf. art. 449), e seu aspecto indenizatório deveria excluí-lo da incidência das contribuições previdenciárias. Russomano e o próprio STF já mudaram de orientação; o primeiro fixou-se na corrente dos que atribuem caráter indenizatório (Curso). O STF, recordando que já havia declarado a natureza indenizatória do aviso prévio (para negar-lhe incidência previdenciária), reafirmou essa qualificação jurídica para rejeitar a incidência do FGTS (RE 89.328 - 2ª T. - j. em 9.5.1978, unânime, LTr 42/1111). A Previdência Social havia aderido a esse entendimento (Parecer 40/81). A jurisprudência, entretanto, enveredou pela incidência do FGTS, preferindo considerar o pagamento como salarial.1

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Indenizado ou não, o aviso-prévio projeta a extinção do contrato de emprego para o término deste (CLT, art. 487, § 1º, in fine), devendo tal fato, inclusive, ser anotado na CTPS do trabalhador. Nesse sentido, dispõe a OJ n. 82 da SBDI-1/ TST: "A data de saída a ser anotada na CTPS deve corresponder à do término do prazo do aviso prévio, ainda que indenizado."

É imperioso ressaltar que a Constituição Federal de 1988 (art. 7º, XXI) elevou o aviso-prévio à categoria de direito fundamental social dos trabalhadores, nos seguintes termos: "aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei."

2. Espécies de aviso prévio

Há, nos termos do inc. XXI do art. 7º da CF, duas espécies de aviso-prévio, ambas constituindo direitos fundamentais sociais dos trabalhadores: aviso-prévio de, no mínimo, trinta dias, e aviso-prévio proporcional ao tempo de serviço.

2.1. Aviso-prévio de (no mínimo) trinta dias

Trata-se de aviso-prévio que atualmente encontra-se regulado na CLT (arts. 487 a 491), como direito que pode ser imediatamente exercitado pelo trabalhador.

Houve, aqui, o fenômeno da recepção constitucional parcial deste importante instituto justrabalhista, uma vez que não mais subsiste, por incompatibilidade com o inc. XXI do art. 7º da CF, o aviso-prévio de oito dias previsto no inc. I do art. 487 da CLT.

A CLT trata do instituto nos arts. 487 a 491.

2.2. Aviso-prévio proporcional ao tempo de serviço

Ampliando o catálogo dos direitos fundamentais sociais trabalhistas, o inc. XXI do art. 7º da CF outorgou aos trabalhadores urbanos, rurais e avulsos (por equiparação), além do aviso-prévio previsto na CLT, o aviso-prévio proporcional ao tempo de serviço.

Trata-se de instituto trabalhista novo, com natureza jurídica de direito fundamental social, que se encontra em harmonia com os princípios de proteção ao trabalhador, mormente o princípio da relação empregatícia protegida contra a dispensa arbitrária ou sem justa causa (CF, art. 7º, caput e I), uma vez que a elevação dos custos econômicos para o empregador desestimula, pelo menos do ponto de vista financeiro, a dispensa do trabalhador.

Reconhecendo tratar-se de instituto novo, o STF firmou entendimento no sentido de que o aviso-prévio proporcional seria direito fundamental cujo exercício estaria sujeito à regulamentação infraconstitucional.

Assim, em sede de mandado de injunção, o STF, num primeiro momento: i) reconhecia ser o aviso-prévio proporcional ao tempo de serviço um direito fundamental; ii) declarava a mora legislatoris; e iii) comunicava a decisão ao Congresso Nacional para a correspondente regulamentação do direito. Nesse sentido:

Mandado de injunção: ausência de regulamentação do direito ao aviso prévio proporcional previsto no art. 7º, XXI, da Constituição da

República. Mora legislativa: critério objetivo de sua verificação: procedência para declarar a mora e comunicar a decisão ao Congresso Nacional para que a supra. (STF-MI 695 - Rel. Min. Sepúlveda Pertence - j. em 1º.3.2007 - Plenário - DJ 20.4.2007.)

É importante lembrar que, segundo o Pretório Excelso, nem mesmo por meio de dissídio coletivo seria possível sanar a mora legislatoris do Congresso Nacional, como se depreende do seguinte julgado:

Dissídio coletivo. Recursos extraordinários providos, para excluir as cláusulas 2ª (piso correspondente ao salário mínimo acrescido de percentual) e 24ª (estabilidade temporária), por contrariarem, respectivamente, o inc. IV (parte final) e I do art. 7º da Constituição, este último juntamente com o art. 10 do ADCT, bem como a cláusula 29ª (aviso prévio de sessenta dias), por ser considerada invasiva da reserva legal específica, instituída no art. 7º, XXI, da Constituição. (STF-RE 197.911 - Rel. Min. Octavio Gallotti - j. em 24.9.1996 - 1ª T. - DJ de 7.11.1997.)

Recentemente, porém, o STF, fundado no fenômeno da mutação constitucional, passou a dar nova interpretação a respeito do papel do mandado de injunção para a efetivação de direitos fundamentais, pois, além de declarar a mora legislatoris, a Suprema Corte passou a atuar como legislador positivo (ativismo judicial) enquanto perdurar a omissão do Congresso Nacional. Nesse sentido:

Mandado de injunção. Garantia fundamental (CF, art. 5º, inc. LXXI). Direito de greve dos servidores públicos civis (CF, art. 37, inc. VII). Evolução do tema na jurisprudência do STF. Definição dos parâmetros de competência constitucional para apreciação no âmbito da Justiça Federal e da Justiça estadual até a edição da legislação específica pertinente, nos termos do art. 37, VII, da CF. Em observância aos ditames da segurança jurídica e à evolução jurisprudencial na interpretação da omissão legislativa sobre o direito de greve dos servidores públicos civis, fixação do prazo de 60 (sessenta) dias para que o Congresso Nacional legisle sobre a matéria. Mandado de injunção deferido para determinar a aplicação das Leis ns. 7.701/88 e 7.783/89. Sinais de evolução da garantia fundamental do mandado de injunção na jurisprudência do STF. No julgamento do MI 107/DF, Rel. Min. Moreira Alves, DJ de 21.9.1990, o Plenário do STF consolidou entendimento que conferiu ao mandado de injunção os seguintes elementos operacionais: i) os direitos constitucionalmente garantidos por meio de mandado de injunção apresentam-se como direitos à expedição de um ato normativo, os quais, via de regra, não poderiam ser diretamente satisfeitos por meio de provimento jurisdicional do STF; ii) a...

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