A Avaliação da Invalidez pelo Perfil Funcional e de Aptidões

AutorJorge Paulete Vanrell
Ocupação do AutorMedicina, Bacharelado em Ciências Jurídicas e Sociais e Licenciatura Plena em Pedagogia
Páginas177-192

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Ver Nota1

Como já mencionamos no capítulo anterior, este método trata essencialmente da valoração social da descapacidade, e não da valoração traumatológica da mesma. Contudo, constitui um pré-requisito e por tal razão não deve ser elidida, e sim realizada a priori.

1 Objetivos do método

O método de avaliação do perfil funcional e de aptidões destina-se a cumprir dois objetivos, partindo de um exame médico completo, realizado seguindo certas normas:

  1. Em relação ao Perito Médico, elaborar um roteiro de trabalho que permita:

    a) realizar um inventário completo das aptidões físicas, intelectuais e psíquicas do examinado;

    b) quantificar a descapacidade global;

    c) definir com precisão e clareza aquilo que pode fazer e aquilo que não pode fazer, de modo a encontrar uma solução adequada para a descapacidade: reparação por uma quantia específica ou pela constituição de um capital que gere uma renda; deter-minação da aptidão, ou não, para o trabalho; determinação

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    da aptidão, ou não, para realizar os atos essenciais da vida diária (e quantificar as necessidades do auxílio de uma terceira pessoa); aptidão para conduzir veículos; acesso a recursos técnicos (próteses, órteses, roupas especiais etc.).

  2. Em relação às pessoas e instituições encarregadas de oferecer soluções para a descapacidade: oferecer um relatório claro, legível, inteligível, explícito, imediatamente compreensível, sem necessidade de questionar o que o Perito quis dizer ou de consultar um dicionário.

    Trata-se de um método universal:

    1. Totalmente independente das contingências das normas nacionais, podendo ser aplicado em qualquer região ou país.

    2. Que tem a ver com quaisquer pessoas que sejam atingidas por algum grau de descapacidade: médicos, pessoal de apoio, operadores de Direito, corretores de seguro, centros de reabilitação, centros de readaptação profissional, organismos de seguro social etc.

    3. Aplicável em qualquer regime (mútua, montepio, programa de saúde etc.), para todas as descapacidades, não importando sua origem ou natureza (afecções congênitas, doenças adquiridas, lesões traumáticas, acidentes de trabalho ou de trânsito, exteriores ou domésticos etc.) e qualquer que seja o regime de indenização ou de reparação considerado: direito comum, acidente de trabalho, lesões intencionais, pensão vitalícia, renda por descapacidade ou por inaptidão, indenização atribuída a título de seguros individuais etc.

2 Um entrave severo

A medicina atual conta com métodos progressivamente aprimorados e com um vocabulário técnico altamente específico. Tudo isso faz parte dos avanços tecnológicos de complexidade crescente, os quais transformam a medicina e a cirurgia a cada ano.

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Mas todos esses progressos, tão úteis para o diagnóstico e o tratamento dos pacientes, mostram-se pouco apropriados quando se os tenta aplicar no procedimento pericial: é que, ao invés de haver uma convergência, assistimos a uma gradual divergência entre ambos os processos: o da medicina assistencial e o da medicina pericial. E é aí que surgem relatórios médico-legais cada vez mais confusos, laudos incompreensíveis, tanto mais sério o problema quanto mais se afastam os questionamentos e as exigências da medicina clássica.

Segundo Mélennec2, essa inadequação dos métodos de trabalho é devida a duas razões, a saber:

2. 1 Uma razão de mérito

O objeto da perícia moderna em minusvalia não consiste em efetuar um diagnóstico, pelo menos no sentido tradicional do termo, porque tal diagnóstico (e.g., paraplegia, infarto de miocárdio ou diabetes) já tenha sido realizado pelo médico assistente antes que o paciente compareça à perícia. A perícia não tem como objetivo proceder a um diagnóstico, e sim resolver uma situação médico-legal: descrição e quantificação da descapacidade; aptidão ou inaptidão para o exercício da profissão anterior; aptidão ou inaptidão para o desempenho de outra profissão; aptidão para levar a efeito, sozinho ou com o auxílio de terceira pessoa, os atos essenciais da vida diária etc.

2. 2 Uma razão de forma

A linguagem técnica utilizada pela maioria dos peritos é tão complexa e abstrata que a maioria dos relatórios médico-legais são incompreensíveis para os operadores do Direito. Estes são os que, em última análise, hão de esmiuçar os conteúdos, digladiar-se na liça da Justiça, tomar as decisões ou proferir as sentenças. Infelizmente, a perícia brasileira não foge desse padrão geral. Constituem exceção os denominados “laudos”, em que o expert se limita a responder quesitos, sem respeitar nem trilhar as sucessivas partes obrigatórias de um relatório.

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3 O método de valoração do perfil de aptidões
3. 1 Condições de forma
3.1. 1 Inteligibilidade

Utilizando apenas termos do vocabulário cotidiano para referir-se às descrições de sintomas e sinais presentes. Nos medicamentos, utilizar apenas nomes genéricos e os efeitos que produzem no organismo (analgésico, ansiolítico, antidepressivo etc.).

3.1. 2 Concisão

Expressando os achados de tal forma que o operador de Direito que lê o relatório, ao chegar ao final, não tenha esquecido o começo e evitando que os detalhes escondam o cerne da questão. Um relatório ideal sobre o perfil de aptidões não deve ultrapassar 15 a 20 linhas. Quando verbal, coram judice, entre um minuto e meio a dois minutos.

3.1. 3 Caráter completo

Isto é, citando todas as funções, ainda que com poucas palavras. Na maioria dos relatórios médico-legais tradicionais, a descrição é centrada na deficiência que ensejou a perícia. No perfil de aptidões, contrariamente, o objetivo não é descrever uma deficiência particular, e sim esboçar um balanço completo do periciado, no que diz respeito a suas funções orgânicas, intelectuais e psíquicas que permanecem saudáveis e úteis.

3. 2 Condições de mérito (como expressar as aptidões do paciente)

A forma como expressar as aptidões supérstites de uma vítima que se viu atingida por um acontecimento infausto, longe do que possa parecer aos menos avisados, é uma tarefa complexa. Isso porque exige, não uma visão tubular e puntiforme, com respeito às suas sequelas, mas

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uma visão mais abrangente e universal do indivíduo. Visão essa que exige um preparo todo especial do Médico Avaliador e que, amiúde, entra em rota de colisão com o escasso tempo de que dispõe o Perito para ver tantos pacientes/dia, limitado pela escassa flexibilidade das tabelas utilizadas em cada Serviço, quixotescamente lutando contra os moinhos de vento dos grandes interesses que, como é curial, têm muito a exigir e receber, e pouco a dar e devolver.

Assim, o Médico Avaliador, agindo como Perito, deverá garimpar profunda e proficuamente não apenas a saúde física, mas também a saúde psíquica e social do periciando, analisando:

3.2. 1 Curriculum vitae resumido

Que em poucas linhas registre tudo quanto o examinado tem feito ou deixado de fazer até a data, constituindo-se em um verdadeiro perfil de aptidões para o passado, devendo conter:

Idade;

Nível de estudos;

Profissões exercidas anteriormente;

Interrupções do trabalho;

Nível social;

Nível familiar, estado civil, tipo de vida;

Antecedentes médico-cirúrgicos, mencionando apenas os casos mais recentes e...

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