Audiência de apresentação/custódia (Resolução CNJ 213/2015)

AutorRenato Marcão
CargoJurista
Páginas169-179

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Ver nota 1

No dia 15 de dezembro de 2015, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou a Resolução 213, que entrou em vigor no dia 1º de fevereiro de 2016 e dispõe sobre a apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial, no prazo de 24 horas.

Sobredita resolução aponta dentre seus diversos fundamentos o disposto no art. 9º, item 3, do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos das Nações unidas; o art. 7º, item 5, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica); o art. 96, I, letra "a", da Constituição Federal, que "defere aos tribunais a possibilidade de tratarem da competência e do funcionamento dos seus serviços e órgãos jurisdicionais e administrativos"; e também o que fora decidido na Ação Direta de Inconstitucionalidade 52402, oportunidade em que o Supremo tribunal Federal declarou a constitucionalidade da disciplina pelos tribunais da apresentação da pessoa presa à autoridade judicial competente, e a determinação imposta por ocasião da apreciação da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental 3473, na qual a suprema corte fixou a obrigatoriedade de apresentação da pessoa presa à autoridade judicial competente.

Embora tardiamente, com tal proceder foi formalmente instituída entre nós, em âmbito nacional, a denominada audiência de custódia, que preferimos intitular audiência de apresentação, visto que idealmente não se destina à custódia de quem já se encontra preso, mas a outras deliberações, inclusive e especialmente com vistas ao relaxamento da prisão4ou concessão de liberdade provisória5a quem fora preso em flagrante delito.

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No caso de prisão em flagrante, nas 24 horas seguintes a autoridade policial deverá providenciar a comunicação da prisão e a apresentação da pessoa presa ao juiz competente, nos moldes do que fora decidido na ADPF 347, onde consta expressamente que a audiência deve ser realizada no prazo de 24 horas, contado do momento da prisão6.

De modo diverso ao anteriormente delineado, o art. 1º, caput, da Resolução 213 do CNJ, indica que a partir da comunicação da prisão começa a contagem de novo prazo de 24 horas, dentro do qual o preso deverá ser levado à presença do juiz para participar da audiência em testilha.

Ante a colidência de comandos evidenciada, é induvidoso que prevalece a contagem do prazo conforme fixada na decisão proferida pela suprema corte.

Vamos avante.

Se o flagrante envolver pessoa sujeita à competência originária de tribunal - foro privilegiado por prerrogativa de função -, a apresentação do preso poderá ser feita ao juiz que o presidente do tribunal ou relator designar para esse fim7.

Em casos tais, portanto, a audiência poderá ser realizada no tribunal ou por juiz de primeiro grau, e é inegável que a apresentação ao juiz de primeiro grau designado atende aos ideais de celeridade e economia, na medida em que permite a realização dos rituais na comarca em que os fatos se deram, muitas vezes distante do tribunal.

Mas não é correto pensar que apenas quem fora preso em flagrante deve ser levado à presença da autoridade judiciária em dia e hora que se realizar a audiência de apresentação, pois, a teor do disposto no art. 13, caput, da Resolução 213, também deverá ocorrer audiência de apresentação após o cumprimento de mandado de prisão, por força da decretação de prisão cautelar (temporária ou preventiva) ou condenação definitiva. toda pessoa presa deverá ser apresentada à autoridade judiciária no prazo de 24 horas, a contar do cumprimento do mandado de prisão.

A propósito, diz o parágrafo único do art. 13 que "todos os mandados de prisão deverão conter, expressamente, a determinação para que, no momento de seu cumprimento, a pessoa presa seja imediatamente

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apresentada à autoridade judicial que determinou a expedição da ordem de custódia ou, nos casos em que forem cumpridos fora da jurisdição do juiz processante, à autoridade judicial competente, conforme lei de organização judiciária local".

Se a pessoa presa em flagrante ou por força de mandado de prisão estiver acometida de grave enfermidade, ou havendo circunstância comprovadamente excepcional que a impossibilite de ser apresentada8 ao juiz no prazo de 24 horas, deverá ser assegurada a realização da audiência no local em que ela se encontre e, nos casos em que o deslocamento se mostre inviável, deverá ser providenciada a condução para a audiência de custódia imediatamente após restabelecida sua condição de saúde ou de apresentação9.

Seja como for, para que não ocorra constrangimento ilegal, a audiência sempre deverá ser realizada, inclusive nos dias de plantão judiciário (sábados, domingos e feriados) e durante o período de recesso forense, não servindo de justificativa para sua não realização, ademais, a afirmação no sentido de que a prisão se encontra revestida de legalidade ou que a convicção do juízo fora satisfatoriamente formada com a apreciação dos documentos enviados com a comunicação da prisão.

Nesse sentido, proclamou o Supremo tribunal Federal que:

Nos termos do decidido liminarmente na ADPF 347/DF (Relator(a): Min. Marco Aurélio, tribunal Pleno, julgado em 9-9-2015), por força do Pacto dos Direitos Civis e Políticos, da Convenção Interamericana de Direitos Humanos e como decorrência da cláusula do devido processo legal, a realização de audiência de apresentação é de observância obrigatória. Descabe, nessa ótica, a dispensa de referido ato sob a justificativa de que o convencimento do julgador quanto às providências do art. 310 do CPP encontra-se previamente consolidado. A conversão da prisão em flagrante em preventiva não traduz, por si, a superação da flagrante irregularidade, na medida em que se trata de vício que alcança a formação e legitimação do ato constritivo (STF, HC 133.992/DF, 1ª t., rel. Min. Edson Fachin, j. 11-10-2016, DJE 257, de 2-12-2016).

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Em sentido contrário ao que defendemos, segue firme o entendimento do Superior tribunal de Justiça - 5ª e 6ª turmas -, conforme demonstram as ementas que seguem transcritas:

A ausência de audiência de custódia não constitui irregularidade suficiente para ensejar a ilegalidade da prisão cautelar, se observados os direitos e garantias previstos na Constituição Federal e no Código de Processo Penal (STJ, RHC 76.100/AC, 5ª t., rel. Min. Felix Fischer, j. 8-11-2016, DJE de 2-12-2016).

A jurisprudência desta Corte orienta-se no sentido de não reconhecer a nulidade da prisão apenas em razão da ausência da audiência...

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