Atos e operações societárias em fraude à lei, visando à tomada ilícita do controle de companhia aberta - abuso do poder de controle e conflito de interesses caracterizados - invalidade
Autor | Erasmo Valladão A. e N. França |
Páginas | 255-270 |
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A empresa Consulente - doravante denominada simplesmente A, ou Consulente, por intermédio de seus ilustres advogados, Drs. Valdo Cestari de Rizzo e Sérgio Varella Bruna, nos submetem a seguinte
Consulta
Prezado Professor,
A pedido de nossa cliente, A, e na forma de nossos entendimentos anteriores, vimos solicitar seu parecer sobre as questões adiante expostas.
1.1 A empresa A, conjuntamente com a empresa B (em conjunto com as demais empresas pertencentes ao assirn denominado Grupo B, doravante designadas, em conjunto ou separadamente, e como o contexto permitir, simplesmente, como B) e a empresa C, são as principais acionistas da companhia D, sociedade holding cujo ob-jeto social é a administração de bens próprios e a participação em outra sociedade, qual seja, a D-1.
1.2 Pelas próprias características do Estatuto Social da D, pode-se depreender claramente que a sociedade foi moldada para que suas sócias exercessem o controle compartilhado da D-1.
1.3 O capital social e votante da D está distribuído entre as suas acionistas da seguinte forma:
(i) 33,43% é detido pela A;
(ii) 52,34% é detido pela B;
(iii) 12,8%, é detido pela O, e
(iv) o restante é detido por outros acionistas.
1.4 A D é a acionista controladora da D-1, a maior produtora de matéria-prima para fertilizantes do País, detendo 56,21% do seu capital social total e 81,53% do seu capital votante.
1.5 O Conselho de Administração da D é composto por nove membros e respectivos suplentes, com mandato de dois anos, sendo de 7 votos afirmativos a maioria exigida para as deliberações.
1.6 Nesse contexto, com a adoção do mecanismo do voto múltiplo e considerando a distribuição do capital votante respectivo, na composição do Conselho de Ad-
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ministração da D-1, a B teria direito a 5 cadeiras, a A a 3 cadeiras e a C a 1 cadeira. Essa distribuição sempre satisfez o acordo entre as acionistas da D para a administração do exercício do controle da D-L
1.7 Dentre as atribuições do Conselho de Administração da D, inclui-se a de deliberar sobre o exercício do direito de voto pela companhia, em qualquer matéria, na qualidade de acionista controladora da D-1 (artigo 21 do Estatuto Social),
1.8 Todavia, no momento atual, o Conselho de Administração da D,.com mandato em vigor até a AGO de 2007, é composto pelas pessoas abaixo, todos executivos da B, e por um ex-controlador da C, que foi mantido no exercício do.cargo de conselheiro da D e da D-1 pelos atuais controladores da empresa. Vejamos a situação de cada um dos representantes da B no Conselho de Administração da D:
(i) MABN, Diretor-Presidente da B, Presidente do Conselho de Administração da D-1 e Presidente do Conselho de Administração da D;
(ii) SSS, Vice-Presidente Financeiro da B, Vice-Presidente do Conselho de Administração da D-1 e membro do Conselho de Administração da D;
(iii) MN, Diretor da B Brasil; membro do Conselho de Administração da D;
(iv) HGH, Diretora Jurídica da B Brasií, membro do Conselho Fiscal da D-1 e membro do Conselho de Administração da D;
(v) ARN, Vice-Presidente de Operações da B e membro do Conselho de Administração da D;
(vi) PCMT, Vice-Presidente Comerciai da Be membro do Conselho de Administração da O;
(vii) RBB, Ex-Diretor da Área de Informática da B Brasile membro do Conselho de Administração da D;
(viii) RPCP, B Limited, membro do Conselho de Administração da D-1 e membro do Conselho de Administração da D;
1.9 Essa composição somente foi possível porque, em Assembleia Geral Ordinária ("AGO") da D, realizada em 27.4.2006 - ou seja, em pleno curso do mandato - os três membros do Conselho de Administração indicados pela na AGO de 2005 foram ilicitamente substituídos por três novos membros indicados pela B. Por intermédio desse artifício, a A foi violentamente afastada do Conselho de Administração da D e, por consequência, do controle da D-1.
1.10 Contra a deliberação assemblear (AGO de 2006) por meio da qual a B afastou, no curso do mandato, três conselheiros que haviam sido eleitos pela A, nossa cliente ajuizou ação anulatória, conforme cópias dos autos que lhe estão sendo encaminhadas nesta data.
1.10.1 O fundamento da ação anulatória não guarda qualquer relação com a não adoção do voto múltiplo pela 4 na AGO da D de 27.4.2006 - até porque ambas as acionistas concordam ser inadmissível a adoção de voto múltiplo naquela situação.
1.10.2 Ao revés, a demanda fundou-se no fato de que, em inequívoco abuso de direito, a B violou os acordos especificamente estabelecidos entre as acionistas para a eleição do Conselho de Administração da D na AGO de 2005 e para á substituição de alguns de seus membros na AGO de 2006.
1.11 O fato é que, a partir da AGO realizada em 27,4:2006, a B passou a contar com 8 dos 9 membros do Conselho de Administração da De, com isso, a ser capaz de determinar, unilateralmente, as deliberações daquele órgão social, o que não ocorreria se o Conselho de Administração da D estivesse constituído por legítimos representantes das acionistas, eleitos na forma da lei na prdporção da distribuição de seu capital social.
2.1 Conforme Fato Relevante conjunto publicado em 22.12.2006 ("Fato Relevante"), as administrações da D-1 e da B anunciaram a intenção de (i) incorporar as ações da 8 no capital da D-1, com a consequente transformação da B em subsidiária integral da D-1; (ii) converter a totalida-
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de das ações preferenciais da D-1 em ações ordinárias; (iii) atribuir à totalidade das ações ordinárias de emissão da D-1 o direito de serem incluídas em eventual oferta pública da alienação do controle da D-1 por valor correspondente a 100% do preço das ações integrantes do controle ("tag alonc"); e (iv) aumentar o dividendo mínimo obrigatório de 25% para 27,5%.
2.2 Como o próprio Fato Relevante indica, após a implementação da referida operação ("Reorganização"), o capital da D-1 ficará distribuído entre seus acionis-tas da seguinte forma:
[VER PDF ADJUNTO]
2.3 Ou seja, por meio da Reorganização, a B pretende passar a deter o controle isolado e absoluto da D-1, com participação equivalente a 50,4% do capital social e votante da D-1.
3.1 No entender da Consulente, a Reorganização trará significativos prejuízos à D e a seus acionistas minoritários. Com efeito, a Reorganização significará, para a D, a perda do controle da D-1, sem que ao menos o prémio correspondente tenha sido considerado nos laudos de avaliação preparados para a operação.
3.2 Igualmente, a Reorganização poderá trazer prejuízos à D-1 ou, pelo menos, atrasar de forma significativa o seu desenvolvimento.
3.2.1 De fato, a B (neste caso especificamente a B Fertilizantes S/A) é uma empresa que não tem margens de lucra-tividade sequer parecidas com as da D-1.
3.2.2 Além disso, a Btem ativos ociosos e outros de origem questionável. Por óbvio, a B estendeu a sua avaliação o quanto pôde para, na relação de troca proposta na Reorganização, atingir os 50,4% do capital votante da D-1, no limiar da maioria das ações com direito a voto.
3.3 A justificativa da Reorganização divulgada no Fato Relevante aduz vantagens, mas são todas elas questionáveis.
3.3.1 Sinergias que serão utilizadas somente pela B, pois todas elas serão extraídas da D-1.
3.3.2 Fortalecimento da D-1 para competir com seus concorrentes internacionais, quando, na verdade, a B pertence a um grupo com sede nas Ilhas Virgens Britânicas e com ações na Bolsa de Nova Iorque. As concorrentes internacionais (A e Y, atual controladora da C) são aquelas que, juntamente com os demais acionistas minori-
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tários da D-1, estão sendo lesadas pela B na Reorganização.
3.3.3 Conversão das Ações Preferenciais em Ordinárias, "tag along" em caso de alienação de controle com 100% do respectivo prémio e aumento do dividendo mínimo. Convém notar que a adoção de práticas de governança corporativa buscada por meio da unificação das ações e do direito a tag along, bem como a majoração do dividendo mínimo obrigatório, independem da incorporação da B pela D-1. Na verdade, a conversão das ações preferenciais em ordinárias somente serve ao objetivo maior da B, de atingir a maioria absoluta do capital da D-1 após a conclusão da Reorganização. Isso porque a conversão das ações preferenciais atualmen-te detidas pela B no capital da D-1 contribuirá para que a B possa alcançar os almejados 50,4% do capital da D-1.
3.4 Assim, a Consulente entende que a Reorganização está sendo utilizada pela Bpara tomar de assalto o controle da D-1, sem considerar que os acionistas da D-1, exceção feita à própria B, não terão qualquer vantagem no processo. Apenas passarão de acionistas de uma empresa rica, saudável e em franco progresso, para acionistas de uma empresa com ativos ociosos e questionáveis e que passará a atuar na área menos lucrativa do negócio de fertilizantes, qual seja, a mistura e a distribuição.
3.5 A Consulente tem evidências claras, outrossim, de que a B Fertilizantes S/A recebeu, ao longo do ano de 2006, sucessivos aportes de capital que, objetivamen-te, contribuíram para a melhoria da sua situação patrimonial. Tais aumentos de capital - se considerados no contexto da Reorganização - permitiriam aos acionistas da B Fertilizantes S/A uma melhor relação de troca, 1.a, dando à B, mais ações do capital da D-1 do que ela receberia se tais aportes de capital não tivessem sido realizados (muito embora o laudo de avaliação da B Fertilizantes S/A contenha sérias inconsistências). Isso, a nosso ver, é mais um dos diversos atos que demonstram que a Reorganização toda não tem por objetivo senão a tomada do controle da D-1 pela B.
4.1 Como se pode observar da exposição dos fatos acima, a maioria (8 de...
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