Assédio moral no ambiente de trabalho: relevância, consequências e meios de provas

AutorCamila Caroline Ferreira Gomes
Páginas27-33

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1. Introdução

A palavra trabalho origina-se do latim vulgar tripliare1 que significa martírio, procedente de uma antiga técnica de sofrimento em que um condenado era posto em três paus fincados no chão. A essência desse vocábulo remete a uma ideia de dor, padecimento. Demonstrando com isso como eram as relações trabalhistas entre empregado e patrão, ou seja, de subserviência.

Diante desse conceito e os vários modelos de segmentos trabalhistas que nos deparamos ao longo dos tempos, podemos perceber que houve notórias mudanças no que se refere às questões de trabalho e seus vínculos empregatícios. Com o passar dos tempos, as preocupações com as relações trabalhistas começaram a surgir e o homem em uma tentativa de amenizar os conflitos, de garantir seus direitos e se proteger buscou elaborar leis especificas que regessem o ambiente trabalhista assegurando, assim, tanto os empregados quando os empregadores.

A aprovação das leis do trabalho propiciou muitos direitos e deveres e impediu que certos dilemas surgissem ou perdurasse nesse meio. Diante de tantas situações dificultosas como abuso de autoridade, desrespeito às normas, falta de profissionalismo, temos o tema que culminou nesse texto: assédio moral.

É sabido que o assédio moral não é uma circunstância que acomete, apenas, na relação empregatícia, mas qualquer ambiente que mantenha o mínimo de coletividade como, por exemplo, colégios, congregações religiosas, associações militares. Porém, ateremos nosso estudo, exclusivamente, na esfera trabalhista.

Nosso objetivo é realizar uma análise sobre assédio moral no ambiente trabalhista destacando a relevância desse tema e, principalmente, a eficácia nos meios de comprovação de um possível caso de perseguição no trabalho.

Explanaremos a pesquisa mediante uma análise bibliográfica e documental na área do Direito Trabalhista,

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Constitucional e Civil tendo como fonte de investigação a doutrinária e jurisprudencial. Adentrando um pouco em ramos da Sociologia e Psicologia.

Portanto, dividimos o artigo em 3 capítulos: no primeiro, conterá o Referencial Teórico em que explanaremos sobre a história do trabalho, conceito sobre o assédio moral e suas consequências, além de dispor sobre os meios de provas mais eficazes. No segundo, definiremos a metodologia utilizada. E, por fim, as considerações finais.

2. Breve contextualização histórica

Desde os primórdios da criação do mundo, segundo o livro de Gênesis, nota-se que o trabalho é tratado como pena; como uma forma de redimir-se, nesse caso, do pecado original, carregando uma concepção de ônus. Alguns historiadores confirmam isso com a própria etimologia da palavra trabalho que está, intimamente, atrelada a tortura, sendo seu significado concatenado a ideia de cansaço, dor. Dessa maneira, qualquer tipo de esforço físico e intelectual no intuito de realizar qualquer atividade conceitua trabalho (Furquim, 2001).

Essa ideologia de martírio transcendeu gerações influenciando muitos modelos de trabalho ao longo dos tempos. Em uma análise cronológica, observamos que, desde a antiguidade clássica, o regime de escravidão dominava os povos egípcios, gregos e os romanos. Viana (apud Reis, 2012) relata que naquele tempo a escravidão era algo justo e necessário, de maneira que em seus escritos Aristóteles deixou evidente que para a ascensão financeira o melhor caminho era a subordinação.

Em uma segunda instância, esse espécime de trabalho foi dando lugar para a servidão, ou seja, o feudalismo (XVI) - em que mesmo perdendo o título de escravo, não se desfrutava da liberdade -. Com o advento da Revolução Industrial - iniciada na Inglaterra, século XVII - o padrão de trabalho modificou-se, isto é, a preocupação capitalista remodelou o sistema formalizando as relações entre patrão e empregado em uma perspectiva de trabalho de execução livre; contudo, as condições decentes ainda eram utopia.

A chegada da Revolução Francesa (1789), arraigada de convicções iluministas com ideologia de liber-dade política e econômica, reconheceu o Direito Social e Trabalhista e pessoalizou o trabalhador, antes visto como objeto. Partindo-se desse episódio da história, as pessoas começaram a preocupar-se com empregado enquanto ser humano e para assegurar os direitos e deveres desse indivíduo necessitou-se universalizar as normas de proteção ao trabalho. Na conferência geral da Organização Internacional do Trabalho, instituíram-se os fins e objetivos da OIT oficializando as ações. Podemos citar também a Declaração dos Direitos Humanos (1948) que demonstra um cuidado com a dignidade do trabalhador e as condições que permeiam o ambiente trabalhista. Comprovamos isso no art. 4º da OIT, que dispõe sobre a proibição de qualquer um ao regime de escravidão ou servidão, sob nenhuma hipótese isso poderia ser descumprido.

O Brasil teve como modelo de trabalho, exclusivamente, a escravidão de índios e escravos que não dispunham de personalidade jurídica. Com a chegada, mesmo tardia, dos ideários da revolução francesa iniciaram-se as preocupações com as medidas sociais. A Constituição de 1988 reforça isso quando procura proteger não somente o trabalho humano bem como sua dignidade. O art. 170 da Constituição Federal, prevê que "a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre-iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, [...]" (BRASIL, 2003). Assim sendo, esse cenário de socialização dentro do âmbito trabalhista aconteceu de maneira geral, de modo que se criou normas para que resguardasse e demarcasse os direitos e deveres do empregador e empregado.

Contudo, o interesse do nosso artigo está no amparo jurídico dado as vítimas de agressão moral no trabalho. Especificamente, no Brasil, as leis cuidam de maneira geral dos trabalhadores e suas relações trabalhistas. A CLT, por exemplo, retrata indiretamente desse assunto quando tenta proteger a saúde do indivíduo. No entanto, podemos afirmar veementemente que nesse período ainda não havia legislação específica que discutisse dessa temática apesar de a Constituição Federal em seu art. 1º proteger a dignidade de qualquer cidadão não deixando o trabalhador, nessa perspectiva, desprotegido.

Nessa problemática podemos citar como pioneira Margarida Barreto que em sua obra Violência, Saúde e Trabalho - Uma jornada de humilhações - retrata o primeiro processo de assédio moral julgado no país (Stephan, 2013). A partir desse momento, o assédio moral começa a ganhar destaque na área jurídica, mesmo não existindo leis diretas.

Portanto, entende-se, que no Brasil, esse fenômeno emergiu na escravidão em que os cativos eram mal tratados e mesmo libertos ainda existia um preconceito com a mão de obra escrava reduzidos a condições degradantes, mesmo recebendo salários. Com a modernidade, o mundo capitalista começou a exigir mais qualificação e disponibilidade dos trabalhadores que cada vez...

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