O aspecto semântico: os sentidos atribuídos à substituição tributária
Autor | Jacqueline Mayer Da Costa Ude Braz |
Páginas | 93-204 |
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4. O ASPECTO SEMÂNTICO: OS SENTIDOS
ATRIBUÍDOS À SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA
O aspecto semântico determina o estudo da relação dos
signos com os objetos significados. Trata-se da relação que a
norma guarda com a conduta por ela regulada. Nesse movi-
mento de atribuição de sentido aos signos, é preciso compreen-
der que os vocábulos jurídicos podem revelar ambiguidade e
vagueza e variar a depender daquele que valora os signos.
A substituição tributária é um fenômeno de grande reper-
cussão no direito brasileiro tendo em vista os inúmeros ques-
tionamentos a que se submete, especialmente no que concerne
a sua constitucionalidade. O maior desafio que o instituto sus-
cita é, segundo Marco Aurélio Greco (2001, p. 21), encontrar o
equilíbrio entre os valores simplificação e arrecadação e a pro-
teção do patrimônio e de outras garantias asseguradas ao con-
tribuinte. Nesse sentido, ele prossegue (2001, p. 21) afirmando
“a necessidade de haver segurança e certeza seja quanto às in-
cidências tributárias, seja quanto aos montantes devidos”.
Neste capítulo, analisaremos também os sentidos atribuí-
do à substituição tributária para, a partir disso, analisar a rela-
ção que ela estabelece com a responsabilidade e diferençá-la
da figura da antecipação. Responderemos, ainda, às questões
correlatas a sua constitucionalidade e aos limites a que o le-
gislador infraconstitucional, ao instituí-la, está adstrito. Além
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JACQUELINE MAYER DA COSTA UDE BRAZ
disso, será apresentado o posicionamento do STF a respeito
da análise da constitucionalidade da substituição tributária,
bem como da restituição em caso de inocorrência do “fato ge-
rador” ou de ocorrência em montante inferior ao presumido.
4.1 Substituição e responsabilidade tributária
E o que seria a substituição tributária? Muito se discute se ela
constitui apenas uma modalidade de responsabilidade tributária.
Clélio Chiesa (2011, p. 100) considera a substituição tri-
butária como hipótese em que o dever de recolher o tributo
é imputado a terceiro diverso daquele que realiza ou poderá
realizar o fato que se submeterá à tributação. Haveria, pois, a
substituição do destinatário constitucional da carga tributária
por outra pessoa vinculada ao “fato gerador”59, nos termos do
mento. Assim, haveria a distinção entre a norma instituidora
do tributo, que prevê como sujeito passivo a pessoa direta-
mente vinculada ao “fato gerador” e a norma de substituição
tributária, de caráter instrumental, que imputa ao terceiro o
dever de recolher o tributo.
A responsabilidade tributária é norma jurídica em sentido
amplo que altera a regra-matriz de incidência do ICMS. Ela re-
tira do polo passivo da relação jurídica o contribuinte, que pos-
sui relação pessoal e direta com o tributo, para incluir uma ter-
ceira pessoa, a quem poderá ser atribuída a responsabilidade
pessoal, subsidiária ou solidária. Remanesce, portanto, o con-
tribuinte enquanto parte desse vínculo jurídico, especialmente
em caso de descumprimento da obrigação pelo responsável.
A substituição tributária, nas modalidades para frente e
para trás, não se enquadra nessa definição, por não se tratar
de norma jurídica em sentido amplo que modifica a regra-ma-
triz de incidência do ICMS e por não conferir ao contribuinte
59. Aqui a expressão também foi usada para se referir ao fato jurídico tributário,
antecedente da norma individual e concreta.
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SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA NO ICMS:
CONSTRUÇÃO DE SENTIDO E APLICAÇÃO
responsabilidade supletiva. A substituição tributária possui
regra-matriz de incidência própria e o substituto figura no
polo passivo da relação jurídica tributária de forma definiti-
va, respondendo totalmente pelo débito e pelos deveres ins-
trumentais correlatos. Os deveres advindos do nascimento da
obrigação tributária alcançam o substituto tributário, que, a
partir de então, deverá defender suas prerrogativas adminis-
trativa e judicialmente.
Não se tratando de hipótese de responsabilidade tributá-
ria, não se aplica a ela o disposto no art. 121, parágrafo único, II,
de problema do ponto de vista da derivação60, ou seja, da busca
por fundamentação da substituição tributária. No entanto, não
se faz necessário que o CTN traga em seu texto a definição e as
hipóteses em que a substituição tributária são aplicadas.
A CF prevê o instituto no art. 150, § 7º, e art. 155, § 2º, XII,
b. A lei a que se refere o art. 150, § 7º, é a lei editada pelo Estado
ou pelo Distrito Federal para criar o tributo em seu território.
Por outro lado, o art. 155, § 2º, XII, b, faz referência especifica-
mente à lei complementar. Com base nesse último dispositivo,
a substituição tributária está suficientemente delineada na Lei
Complementar 87/96, norma geral em matéria de ICMS, con-
forme anteriormente salientado. Esse é, portanto, o veículo in-
trodutor que traz as normas gerais aplicáveis à matéria.
Vale notar que o art. 5º, da aludida lei complementar, trata
especificamente da responsabilidade tributária, ao dispor que
“lei poderá atribuir a terceiros a responsabilidade pelo paga-
mento do imposto e acréscimos devidos pelo contribuinte ou
responsável, quando os atos ou omissões daqueles concorre-
rem para o não recolhimento do tributo”. O dispositivo atribui
responsabilidade como sanção pela prática de ato ilícito, se
60. Segundo Paulo de Barros Carvalho (2011, p. XIX), a positivação e a derivação
constituem processos simétricos. A positivação relaciona-se à sequência de atos que
instituem normas no sistema jurídico em trajeto uniforme e direção descendente. Já
a derivação é uma operação lógico-semântica em que a unidade normativa é articula-
da a outras que estão sobrepostas ou sotopostas na hierarquia do conjunto.
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