Artigos 1º - 3º - 7º - 8º - 9º - 11 a 12

AutorAlmiro Eduardo de Almeida
Páginas37-49

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Almiro Eduardo de Almeida

Juiz do Trabalho vinculado ao TRT-RS. Professor de Graduação no Centro Universitário Metodista – Instituto Porto Alegre. Professor em cursos de Pós-Graduação em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho. Especialista em Direito do Trabalho pela Universidad de la República Oriental del Uruguay. Mestre em Direitos Sociais e Políticas Públicas pela Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC. Doutorando em Direito do Trabalho pela Universidade de São Paulo – USP. Membro do Grupo de Pesquisa Trabalho e Capital. Membro do Grupo de Pesquisa Direitos Humanos, centralidade do trabalho e marxismo. Coordenador do Grupo de Pesquisa sobre Direito do Trabalho do Centro Universitário Metodista – IPA.

TÍTULO I

Introdução

Art. 1º – Esta Consolidação estatui as normas que regulam as relações individuais e coletivas de trabalho, nela previstas.

Relação de trabalho é gênero do qual relação de emprego constitui uma de suas espécies. Para que reste configurada esta última é necessário que estejam presentes os requisitos previstos no artigo 3º da Consolidação: pessoalidade, não eventualidade, subordinação e onerosidade. Ausente algum desses requisitos, estar-se-á diante de outra espécie de relação de trabalho. Exemplificativamente, faltando o requisito da não-eventualidade, o trabalho será eventual; ausente o da subordinação, será autônomo; e quando lhe faltar a onerosidade, será voluntário. O gênero relação de trabalho abarca, ainda, dentre outras, as hipóteses de trabalho avulso, cooperativado e estágio.

Muito embora o texto legal fale em relações de trabalho, a Consolidação limita-se a regular especificamente a relação de emprego, categoria básica do próprio Direito do Trabalho. É a partir dessa relação que se constrói todo um sistema jurídico constituído por regras, princípios e institutos próprios.

O que determina se a relação de trabalho será individual ou coletiva são os sujeitos nela envolvidos. Relação individual de trabalho é aquela estabelecida diretamente entre trabalhador e empregador. Observe-se que, mesmo em se tratando de uma pluralidade de trabalhadores, ou uma pluralidade de empresas, não se estará diante de uma relação coletiva, mas sim de relação individual – contrato de trabalho plúrimo ou de equipe, no primeiro caso; grupo econômico ou consórcio de empregadores, no segundo.

Por relações coletivas de trabalho, entendem-se as relações que envolvam os entes coletivos de Direito do Trabalho, notadamente, os sindicatos representativos da categoria profissional ou econômica (remetemos o leitor aos comentários ao artigo 511) e a empresa. Especificamente quanto a esta última, ainda que seja considerada um ente coletivo, poderá participar de uma relação individual de trabalho, quando se relacionar diretamente com o(s) trabalhador(es). Por outro lado, sempre que estiver presente o ente representativo da categoria profissional, a relação jurídica de trabalho será considerada coletiva.

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Por fim, a Consolidação não se limita a regular os aspectos materiais das relações de trabalho, dispondo igualmente sobre a organização da Justiça do Trabalho (Título VIII), do Ministério Público do Trabalho (Título IX) e do Processo Judiciário do Trabalho (Título X).

Art. 3º – Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.

Parágrafo único – Não haverá distinções relativas à espécie de emprego e à condição de trabalhador, nem entre o trabalho intelectual, técnico e manual.

Ao definir a figura do empregado, o caput do artigo 3º da Consolidação apresenta os requisitos necessários para a configuração da relação de emprego: pessoalidade, não-eventualidade, subordinação e onerosidade. Para que reste configurada esta relação é necessário que estejam presentes, concomitantemente, esses quatro requisitos.

A pessoalidade caracteriza-se, em um primeiro momento, pelo fato de que o trabalho é humano, ou seja, prestado por um ser humano, e não por uma máquina ou um animal. Embora não seja suficiente para caracterizar a relação de emprego, haja vista estar presente em toda e qualquer relação de trabalho, esse elemento exerce uma função fundamental no Direito do Trabalho. É em razão da presença de um trabalho humano, da constatação que o trabalho, enquanto prestado, não se separa da pessoa de quem o presta, e da admissão de que esse trabalho seja de algum modo comercializado, que o Direito do Trabalho é fundado com base na proteção ao trabalhador1.

Em decorrência da pessoalidade o contrato de trabalho adquire a característica de ser intuito personae em relação ao trabalhador, uma vez que este se obriga pessoalmente. Alguns esclarecimentos se fazem necessários neste ponto.

Em primeiro lugar, o caráter intuito personae não significa dizer que o trabalhador não possa ser auxiliado por outros trabalhadores no desempenho de suas atribuições. Em sentido distinto, essa característica da relação denota que, não apenas o trabalhador auxiliado, mas também os seus auxiliares, serão sujeitos (empregados) das relações mantidas com o tomador (empregador) de suas atividades. Ou seja, o caráter personalíssimo da relação de emprego faz com que tais sujeitos-trabalhadores se vinculem ao tomador através de distintas relações de emprego. Como refere Ribeiro de Vilhena, “Não há empregado de empregado. O empregado deste é empregado de quem seja o primeiro e originário empregador”2.

Na mesma linha de raciocínio, o trabalhador que é substituído não perde, por essa circunstância, a sua condição de empregado. O que ocorre nesse caso é um fenômeno distinto e paralelo: o seu substituto – justamente pelo fato de que, quando substitui um empregado, tem a sua atividade laboral inserida na atividade econômica da empresa, integrando-a e passando a ser por ela “empregado” – passa a figurar também ele na condição de empregado. Desse modo, longe de descaracterizar o vínculo de emprego, o fenômeno da substituição de trabalhadores na dinâmica da empresa faz com que se formem novos vínculos dessa mesma natureza3.

Por fim, fenômeno amplamente reconhecido na doutrina e na jurisprudência e ainda relacionado com o elemento pessoalidade é a tentativa de mascarar a relação empregatícia, com o intuito de fraudar a legislação trabalhista através da “pejotização”, transformando uma pessoa natural em uma pessoa jurídica na tentativa de afastar o reconhecimento do vínculo de emprego, justamente pela ausência do requisito

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da pessoalidade. Por certo, sempre que verificada, a tentativa de fraude deve ser apontada e o vínculo empregatício reconhecido4.

A não-eventual caracteriza-se, conforme clássica lição de Maranhão, pela “utilização da força de trabalho, como fator de produção [correspondendo] às necessidades normais da atividade econômica em que é empregada”5. Em contraposição, deve ser considerado como trabalhador eventual aquele admitido “por circunstâncias excepcionais ou transitórias do estabelecimento”6. No mesmo sentido, Russomano, sustenta que “eventual é o trabalho que depende de acontecimento incerto, causal, fortuito”7. Não se tratando, de tais hipóteses, os serviços deverão ser considerados como não-eventuais por sua natureza. Irrelevante, portanto, o tempo de duração dos serviços, ou mesmo o interregno em que tenha havido a sua prestação (quantos dias por semana foram trabalhados, por exemplo). Isso porque, de acordo com o texto normativo, o requisito da não-eventualidade diz respeito à natureza dos serviços, e não à prestação por parte do trabalhador. Irrelevante, da mesma forma, o fato de os serviços estarem relacionados à atividade-fim ou à atividade-meio do empreendimento econômico. Tratando-se de serviço que atenda às necessidades normais da atividade econômica em que é empregado, deverá ser considerado não-eventual.

A subordinação pode ser identificada a partir de dois critérios: pelo subjetivo, caracteriza-se como a sujeição do trabalhador às ordens do empregador; pelo objetivo, corresponde à participação integrativa da atividade do trabalhador na atividade do empregador. Percebe-se que, sob essa última perspectiva, a subordinação não ocorre de sujeito para sujeito, mas de atividade para atividade, daí a razão de qualificá-la objetiva.8

Godinho Delgado identifica a subordinação objetiva (denominando-a estrutural) como “inserção estrutural do obreiro na dinâmica do tomador de seus serviços”9. É subordinado, portanto, não só o trabalhador que recebe ordens diretamente de seu empregador, mas todo aquele cuja mão de obra se insira na atividade, no empreendimento, na dinâmica empresarial, independentemente da efetiva existência de submissão a ordens patronais. Dito de outro modo, sempre que presente a subordinação objetiva (participação integrativa da atividade do trabalhador na atividade da empresa), estaremos diante de uma relação jurídica de trabalho subordinada.

O último elemento configurador da relação de emprego – a onerosidade – apresenta-se mais como uma decorrência do que propriamente como um pressuposto. Isso porque, inserido no sistema capitalista de geração de riquezas, o trabalho objeto do Direito do Trabalho é naturalmente econômico. Presentes os demais requisitos, necessários e suficientes para a configuração da relação de emprego – pessoalidade, não-eventualidade e subordinação, impõe-se o reconhecimento da onerosidade do trabalho prestado – o dever fundamental de pagar salário. Tanto é verdade que a ausência do pagamento de salários, ou mesmo de seu ajuste, não é suficiente para afastar o reconhecimento de uma relação de emprego, quando, estando presentes os demais requisitos, o trabalho prestado se inserir no âmbito da produção de determinada empresa.

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Apenas nos raríssimos casos em que se verifique efetivamente afastado o pressuposto da utilização de trabalho alheio em um contexto de produção econômica é que se poderá cogitar de trabalho voluntário. Trata-se das hipóteses em que entidades...

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