Artigo 9

AutorCalil Simão
Ocupação do AutorDoutorando em Direito pela Universidade de Coimbra (PT). Mestre em Direito
Páginas105-129

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Art

Constitui ato de improbidade administrativa importando enrique cimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial inde-vida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no artigo 1º desta Lei, e notadamente:

Comentários
1 Enriquecimento ilícito

O enriquecimento ilícito representa o aumento patrimonial obtido pelo agente público em ofensa a uma norma jurídica. É aquele que ocorre ao arrepio da lei, porque não havia autorização legal ou havia vedação legal (CF, art. 37, caput).

2 Enriquecimento ilícito e enriquecimento sem causa

O enriquecimento ilícito representa uma ofensa à lei, ao passo que enriquecimento sem causa reclama apenas ausência de causa justa. Existe uma distinção entre ausência de causa e ato ilícito. O enriquecimento ilícito pressupõe uma vantagem auferida pelo agente em razão de uma causa: a ilicitude. Já no enriquecimento “sem causa” é essa “ausência de causa” que o subordina. Ele não depende de ato ilícito. É possível afirmar que ele não é formalmente antijurídico, mas apenas substancialmente antijurídico73. São elementos constitutivos do enriquecimento sem causa74: a) reprovação; b) injustiça75.

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3 O enriquecimento ilícito é sem causa porque não aprovado pelo Direito?

Essa afirmação é totalmente equivocada. O enriquecimento ilícito não é sem causa porque não aprovado pelo Direito. O enriquecimento sem causa não tem qualquer causa justificadora da vantagem patrimonial obtida. Logo, a ausência de causa não se confunde com ato ilícito.

4 Requisitos gerais

O caput do art. 9º da LIA traz os requisitos gerais para a configuração do tipo legal, que são: a) auferir vantagem econômica vedada por norma jurídica;
b) vantagem econômica ilícita decorrente ou relacionada com o exercício de uma função estatal; c) posse da vantagem ilícita; d) comportamento doloso.

5 Auferir

É obter um resultado patrimonial. Auferir pressupõe a posse do objeto material: recebê-lo.

6 Solicitar ou exigir

Os termos auferir e receber não são sinônimos de solicitar ou exigir. A conduta de solicitar não é abrangida pelo tipo legal do art. 9º. Solicitar ou exigir é pedir, buscar ou manifestar o desejo de receber. Quem solicita ou exige incide no tipo legal do art. 11 da LIA.

7 Formas de auferir

A vantagem patrimonial pode se incorporar ao patrimônio do agente público de forma direta ou indireta, como também por prestação positiva ou por prestação negativa. Na vantagem por prestação positiva o agente público experimenta dela diretamente. Por prestação negativa devemos entender a vantagem que integra o patrimônio do agente público de forma reflexa. Nesse tipo de vantagem o patrimônio não aumenta porque recebe um novo bem, mas porque deixa de diminuir. Fala-se ainda em vantagem direta e indireta para distinguir a forma com que a vantagem é obtida, ou seja, diretamente pelo agente público ou por terceiros (esposa, filho, cunhado, sobrinho ou outrem). Os terceiros podem, na verdade, ser verdadeiros testas de ferro quando, embora recebam a vantagem econômica em nome próprio (simulação), o fazem apenas para camuflar o seu verdadeiro destinatário: o agente público.

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8 Vantagem econômica indevida

A vantagem que gera subsunção ao tipo do art. 9º é a vantagem patrimonial, vale dizer, a vantagem tem que ter conteúdo econômico. É justamente a busca desse conteúdo econômico que faz com que o agente público cometa o ato de improbidade administrativa em comento. As vantagens de ordem pessoal, tal como prestígio, vaidade, ou até mesmo de natureza sexual, não se incluem como elementos do tipo e não podem ser consideradas “vantagens” para aplicação do art. 9º. Teremos, nessas situações, a aplicação do art. 11.

9 Nexo entre a vantagem econômica ilícita e o exercício de uma função estatal

A vantagem ilícita necessita decorrer de uma atribuição funcional do agente público (“em razão”). O termo “em razão” significa causa ou motivo. Esse liame é exigido pelo caput do art. 9º.

10 Atividade administrativa legal

Questão interessante refere-se a uma vantagem patrimonial devida por outros motivos, mas que somente é liberada ao agente público mediante a prática de um ato administrativo legal. Não pode o agente público utilizar a sua qualidade de agente do Estado para facilitar o adimplemento de um devedor particular. O exercício da função pública só pode beneficiar a coletividade, não podendo constituir um instrumento de conquistas pessoais e particulares do sujeito investido em uma função pública. Entretanto, esses casos não encontram subsunção no tipo legal do art. 9º, mas, por constituírem grave violação de princípios da Administração Pública, como pessoalidade e moralidade, encontram subsunção no tipo legal do art. 11.

11 Elemento subjetivo do agente

A vantagem ilícita punida é aquela proveniente de dolo do agente público. O agente público age desonestamente e deslealmente com a sociedade a fim de obter aumento patrimonial indevido. É impossível, assim, que o agente público se enriqueça ilicitamente por imprudência, negligência ou imperícia. Esse estado anímico não se compatibiliza com o tipo legal do art. 9º da LIA, caput e incisos.

12 Acúmulo ilegal de cargos ou funções públicas

O art. 9º não serve para abrigar a situação do acúmulo ilegal de cargos ou funções públicas, desde que, é claro, não haja conluio entre aquele compe-

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tente para a nomeação e o nomeado (CF, art. 37, XVI e XVII). Para aplicação do art. 9º deve ficar demonstrado nos autos, por provas testemunhais, perícias ou documentais, além da comprovação formal do vínculo de acúmulo, a intenção de utilizar a irregularidade de vínculo de trabalho para obtenção do acúmulo indevido de patrimônio.

Jurisprudência

ENRRIQUECIMENTO ILÍCITO – NECESSIDADE DE DOLO:

ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE. TIPICIDADE. INDISPENSABILIDADE DO ELEMENTO SUBJETIVO...

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