Arqueologia forense

AutorAlana de Cássia Silva Azevedo/Jeidson Antonio Morais Marques/Mona Lisa Cordeiro Asselta da Silva
Páginas403-417

Page 403

1. Introdução à arqueologia forense

Define-se a arqueologia como uma ciência que utiliza processos de coleta e escavação para estudar as sociedades passadas por meio de restos materiais, tais como: fósseis, cerâmica, ferramentas de pedra, arte, arquitetura (ISCAN, 2001). No tocante à arqueologia forense, tem-se por definição geral uma disciplina que aplica a teoria arqueológica e métodos para escavação e recuperação da cena e/ou objetos de um crime (MENEZ, 2005).

A arqueologia forense é um campo novo no contexto da investigação da cena de crime e, sendo assim, poucos compreendem quem são os arqueólogos forenses e qual sua contribuição na resolução de um crime. Segundo Menez (2005), a arqueologia forense é o uso da ciência forense para exame e interpretação de dados arqueológicos e o emprego de métodos arqueológicos para uma investigação criminal. O arqueólogo forense combina o conhecimento de osteologia e restos humanos com técnicas arqueológicas para ajudar na recuperação de evidências que forneçam provas vitais para um processo investigativo. A aplicação do conhecimento em mapeamento do território associado às etapas de exumação em locais de acometimento de crimes, ou onde os corpos foram eliminados, compõem a atividade rotineira de um profissional que atua no campo da arqueologia forense (SKINNER; ALEMPIJEVIC; DJURIC-SREJIC, 2003).

Os arqueólogos forenses devem ter conhecimento de todas as habilidades associadas à arqueologia tradicional, além de compreender como aplicá-las em um contexto forense. As principais habilidades e conhecimentos relacionados à arqueologia forense estão relacionados a seguir:

• métodos de pesquisa no solo (exemplo: alterações ambientais associadas ao enterro, composição do solo (Figura 1);

• técnicas de pesquisa (exemplos: bússola, estação total);

Page 404

métodos de pesquisa geofísica (exemplos: radar de prospecção geotéc-nica — GPR, levantamento eletromagnético, detector de metais);

análise e descrição da formação do local;

técnicas de mapeamento;

controles espaciais (exemplos: estabelecer os pontos de referência, GPS (Figuras 2-3);

uso de equipamento pesado (quando o uso é apropriado no tipo de escavação);

técnicas de escavação;

reconhecimento básico da anatomia esquelética humana e não humana;

coleção de artefatos, documentação e preservação;

gravação no local (exemplos: moldagem de recursos, fotografia digital, documentação);

coleta de amostras em campo (exemplos: amostra de solo, amostra entomológica);

coleta e preservação de restos esqueléticos e evidências associadas.

Page 405

Figura 3. Localização por satélite.

Dentre os principais papéis desempenhados pelos arqueólogos forenses, é possível citar sua competência em compreender e interpretar as histórias de transformação da cena de um crime (eventos tafonômicos), bem como sua expertise em reconstruir e interpretar os eventos ocorridos à medida em que a cena em estudo estava sendo criada e o corpo depositado no sítio arqueológico (DUHIG, 2003).

Técnicas arqueológicas meticulosas podem ajudar a recriar a cena e também podem ser utilizadas para corroborar ou refutar a versão de criminosos sobre o que aconteceu em uma situação particular (SPENNEMANN; FRANKE, 1995) (SKINNER; ALEMPIJEVIC; DJURIC-SREJIC, 2003).

2. Princípios da arqueologia

Compreender os princípios gerais e a terminologia utilizada na arqueologia será fundamental para aplicação de técnicas arqueológicas na recuperação de restos humanos para estudo forense.

  1. PROVENIÊNCIA: é a localização exata de um item em um espaço tridimensional, com os dados referentes a sua latitude (norte-sul), longitude (leste-oeste) e posição vertical (profundidade).

  2. CONTEXTO: é o local exato de um objeto no espaço e no tempo, além de sua relação com outros itens. O contexto é facilmente comprometido quando há remoção do objeto do local.

  3. CARACTERÍSTICAS: são estudadas, analisadas e documentadas no local, diferentemente dos artefatos que podem ser removidos para análise posterior. Em cenas de crime com restos mortais inumados, a cova é considerada uma característica, pois não pode ser removida, mas pode fornecer informações valiosas a serem verificadas no local.

  4. ESTRATIGRAFIA: é a análise da sequência de depósitos no solo que se formaram através de atividades naturais ou humanas. Com o passar do tempo, o acúmulo gradual desses depósitos forma um estratificado (camadas uma acima da outra). Os estratos são distinguíveis devido às

    Page 406

    diferenças de cor, textura, tamanho de grão e composição. As deposições que formam os estratos variam devido às alterações climáticas e ambientais, bem como à intervenção humana (Figura 1). No contexto forense, cavar um túmulo perturba a estratificação natural do solo que inevitavelmente torna o túmulo detectável, quer para o olho treinado do investigador, quer por meio de equipamento especializado (radar).

  5. SUPERPOSIÇÃO E DATAÇÃO: em pesquisa arqueológica, é fundamental ordenar os eventos em uma sequência de tempo. A estratigrafia auxilia na compreensão desta sequência, através do uso de superposição. De acordo com esse princípio, em estratos não perturbados, os materiais mais antigos estão na parte inferior e os mais recentes no topo (Renfrew e Bahn, 2000). A data das camadas pode ser determinada ao considerar que um objeto mais próximo da superfície será tipicamente mais recente que os objetos localizados abaixo dele.

  6. GEOTAFONOMIA: envolve o uso de técnicas arqueológicas para reconhecer características geofísicas e mudanças que afetam as características do enterramento, o cadáver e o meio envolvente (Hochrein, 2002). A coleção deste tipo de evidência se concentra na própria sepultura e pode levar à identificação do método utilizado inicialmente para realizar aquela escavação, além de propiciar o reconhecimento da fonte de perturbações que agiram no local.

    • ferramentas na formação de sepulturas: as marcas de ferramentas deixadas durante o processo de enterramento são comumente negligenciadas, embora possam estar bem preservadas acima e abaixo da superfície do solo. Compreender como foi feita a sepultura e quais ferramentas foram empregadas fornece conhecimento sobre o planejamento realizado para obtenção da cova. Alguns solos, tais como argilas e sedimentos, retém com facilidade marcas de ferramentas; contudo, os solos arenosos e os cascalhos são...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT