Apresentacao: 11 de marco de 2015.

Apresentamos a nova edicao da Revista Direito e Praxis (vol. 06, n. 10 de 2015, Dez-Mar), com o Dossie tematico Revisitando "Podera o Direito ser emancipatorio?", organizado pelos professores Orlando Aragon Andrade e Boaventura de Sousa Santos. Abaixo, segue o artigo dos editores, em portugues e espanhol, que apresenta detalhadamente o rico material produzido pelos pesquisadores do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, Portugal.

Neste numero, alem dos oito artigos ineditos e do dossie, trazemos a traducao do artigo "Behind Marx's hidden abode, for an Expanded Conception of Capitalism", da professora Nancy Fraser, originalmente publicado na New Left Review. Para realizar a traducao, recebemos o fomento do edital de apoio a periodicos cientificos Fundacao de Amparo a Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro --FAPERJ. Publicamos tambem a resenha, do livro de Sheila Jeffreys, Gender Hurts: a feminist analysis of the politics of transgenderism.

Este numero tambem inaugura uma nova fase de politicas editoriais da Direito e Praxis. A revista passa a ser quadrimestral, com publicacao nos meses de marco, junho e novembro. Alem disso, sera pulicado um Dossie especial em cada edicao. Esperamos com isso dar maior celeridade ao fluxo de artigos e contribuir com a discussao de temas relevantes para a sociedade e academia brasileiras.

Por fim, relembramos que as politicas editoriais para as secoes da Revista podem ser acessadas em nossa pagina e que as submissoes sao permanentes e sempre bem-vindas ! Em caso de duvidas, basta contatar nossa equipe editorial. Agradecemos, como sempre, aos autores, avaliadores e colaboradores pela confianca depositada em nossa publicacao e pelo trabalho de alta qualidade.

Boa Leitura ! Equipe Direito e Praxis

Revisitando "Podera o direito ser emancipatorio?"

Orlando Aragon Andrade

Investigador del Centro de Estudios Sociales de la Universidad de Coimbra e integrante del Colectivo Emancipaciones (www.colectivoemancipaciones.org).

Boaventura de Sousa Santos

Director del Centro de Estudios Sociales de la Universidad de Coimbra, Distinguished Legal Scholar de la Facultad de Derecho de la Universidad de Wisconsin-Madison y Global Legal Scholar de la Universidad de Warwick.

Faz sentido perguntar-se sobre as possibilidades emancipatorias do direito em realidades tao diversas como as do sul global na atualidade? Seria esta pergunta reducionista, ao deixar escapar os processos politico-juridicos complexos que intervem em nossas sociedades? Ela traz elementos relevantes para uma nova pratica e estudo critico do direito no sul global? Estas foram as questoes colocadas e problematizadas em um artigo de Boaventura de Sousa Santos (2003) (1), que completa doze anos de sua primeira publicacao na Revista Critica de Ciencias Sociais e que recebeu o titulo "Podera o Direito ser emancipatorio?".

A resposta geral que se deu a este questionamento, no momento, foi um sim condicionado, que convidava a uma nova analise e pratica do direito para alem das tradicoes classicas do reformismo e da revolucao, bem como para alem das orientacoes criticas recentes que invisibilizam e rejeitam a resistencia mantida por multiplos movimentos sociais do sul global atraves do direito estatal (Santos e Rodriguez-Garavito, 2007). Os argumentos desenvolvidos no referido artigo de Boaventura de Sousa Santos nao tiveram a finalidade de dar uma resposta definitiva e acabada, mas sim de oferecer um marco de analise e orientacao geral para ser explorado em um direito que, devido a globalizacao neoliberal, e cada vez mais heterogeneo, contraditorio e plural.

Os artigos reunidos nesse dossie tematico da Revista Direito e Praxis respondem a convocatoria de repensar o direito sob uma nova orientacao critica: a legalidade cosmopolita subalterna. Buscam, portanto, problematizar, particularizar e explorar em diversos contextos, principalmente brasileiros, os horizontes e limites do marco de analise proposto em "Podera o direito ser emancipatorio?". Para alcancar este objetivo, realizam diferentes aproximacoes teoricas, empiricas e metodologicas, proprias de cada especializacao do direito e da perspectiva politica de cada uma de suas autoras e autores.

Essas contribuicoes sao, ademais, o resultado de uma reflexao coletiva que se iniciou em 2010, em um seminario realizado no Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra e que teve o objetivo de discutir a atualidade do trabalho que da nome ao dossie. No primeiro encontro, compareceram estudantes de Doutorado em Pos-colonialismo e Cidadania Global, do Doutorado em Direito, Justica e Cidadania no Seculo XXI e do Doutorado em Democracia no Seculo XXI do CES, que tinham ja uma trajetoria formada no ativismo e/ou na advocacia popular. Este grupo foi completado por doutorandos de diferentes programas do Brasil e do Mexico, que compartilhavam do mesmo perfil de ativismo no campo do direito e que, naquele momento, se encontravam realizando estadias de pesquisa no CES.

Os resultados deste primeiro encontro foram tao ricos que, em pouco tempo, ja se pensava em uma segunda reuniao, a qual ocorreu novamente no CES durante o verao de 2012. A esta nova convocatoria, somaram-se outros investigadores e investigadoras ativistas brasileiros que trouxeram novos trabalhos no campo da teoria critica do direito e que enriqueceram e diversificaram as discussoes iniciadas dois anos atras.

Destas reunioes e dos dialogos mantidos nos anos seguintes pelos pesquisadores e investigadores deste grupo (2), e que surgem os dez artigos reunidos neste dossie. E importante advertir novamente que cada um deles estuda subcampos diferenciados do direito com sua propria trajetoria, literatura especializada e com instrumentos metodologicos particulares (analises de sentencas, experiencias de mobilizacao social, casos emblematicos de judicializacao, historiografia brasileira, entrevistas com atores chaves, entre outros). Assim, a articulacao deste conjunto de trabalhos tem como referencia as perguntas, problemas e principios orientadores colocados em "Podera o direito ser emancipatorio?".

A principal riqueza deste esforco coletivo reside, entao, na amplitude de subcampos, escalas e experiencias que, desde multiplos enfoques e recursos metodologicos, se submetem ao marco orientador proposto pela legalidade cosmopolita subalterna. Desta maneira, os trabalhos aqui reunidos estudam desde o direito penal no contexto de emergencia de modelos de governanca cada vez mais fascistas e criminalizadores (veja-se os artigos de Vieira e Felix e Reis), ate as estrategias e praticas dos advogados populares e das defensorias publicas progressistas para defender os movimentos sociais e abrir maiores espacos de inclusao social (veja-se os artigos de Sa e Silva; Carlet e Lauris); bem como o uso do direito como instrumento de resistencia do periodo de transicao do escravismo ao pos-escravismo no Brasil (veja-se o artigo de Andrade, Fernandes e de Carli), ate a incorporacao deste nas estrategias de luta dos chamados novos movimentos sociais como os ambientais, indigenas e quilombolas (veja-se os artigos de Hagino e Quintans; e Carvalho); alem da crescente pluralidade juridica nas escalas globais (veja-se o artigo de Aragon), ate suas expressoes em espacos globais no Brasil (veja no artigo de Maldonado).

Apesar desta diversidade tematica e de estarem orientados por ferramentas analiticas da legalidade cosmopolita subalterna, os trabalhos que dao corpo a este dossie nao oferecem uma leitura monotona e homogenea. Ao contrario, neles se pode encontrar ricos dialogos e debates. Estes encontros, alguns mais explicitos, outros mais implicitos, oferecem uma contribuicao singular para continuar uma discussao mais ampla sobre o potencial emancipador que o direito pode ter nos diferentes campos, escalas e contextos sociais, nos quais se apresenta como um recurso de resistencia ou de luta para as coletividades que lutam pela transformacao social.

O artigo que abre este dossie tematico "A diversidade juridica em disputa na era da globalizacao neoliberal" de Orlando Aragon, interessa-se em analisar um fenomeno que nao foi discutido em "Podera o direito ser emancipatorio?", mas faz claramente parte da agenda la proposta. De fato, este trabalho pergunta sobre o carater politico do pluralismo juridico no atual contexto de hegemonia e contrahegemonia global do direito. Nao se pretende responder esta questao de forma generica, posto que a propria literatura especializada ja advertiu sobre o carater politico ambiguo do pluralismo juridico. O que se pretende, no trabalho, e o desenvolvimento de uma proposta teorica que permita avaliar e comparar, no contexto atual de heterogeneidade e pluralizacao do direito, o potencial emancipador de diferentes expressoes do pluralismo juridico. Para alcancar este objetivo, propoe, em resumo, uma caracterizacao tripla do pluralismo juridico: expressoes hegemonicas, contra-hegemonicas e nao-hegemonicas. Ao final do artigo, argumenta-se que, assim como o direito estatal, o pluralismo juridico nao possui conteudo politico fixo; no entanto, sua avaliacao politica exige uma nova relevancia no contexto da globalizacao neoliberal e do cosmopolitismo subalterno.

O trabalho de Fabio Sa e Silva parte da mesma discussao sobre a hegemonia e contra-hegemonia global do direito. Este trabalho traz um estudo comparativo entre a advocacia de interesse publico nos Estados Unidos e a advocacia popular ou de direitos humanos na America Latina. Atraves de uma ampla analise de entrevistas realizadas com varias advogadas e advogados nos EUA e em diferentes paises da America Latina, assim como uma cuidadosa revisao de experiencias brasileiras, o autor mostra as muitas diferencas entre as concepcoes e praticas destes organismos no norte e sul globais. Esta posicao supoe um contraponto a leitura critica que apresenta a proliferacao de organizacoes que defendem juridicamente os movimentos sociais na America Latina como a...

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