Aplicações da extrafiscalidade no direito brasileiro

AutorBruna Alexandre Marques Alves, Francisco Carlos Duarte
Páginas280-300
Aplicações da extrafiscalidade no direito brasileiro
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Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 7, n. 2, p. 280-300
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APLICAÇÕES DA EXTRAFISCALIDADE NO DIREITO BRASILEIRO
Bruna Alexandre Marques Alves*
Francisco Carlos Duarte**
RESUMO: O presente trabalho tem por objetivo analisar a extrafiscalidade no âmbito da sua
aplicação. Quando a instituição de uma espécie tributária ocorre com um propósito que vai
além do meramente arrecadatório, diz-se que tais espécies são dotadas, além da fiscalidade, de
um viés extrafiscal. O emprego das normas tributárias com o objetivo de induzir
comportamentos intersubjetivos e influir nas tomadas de decisões torna a ordem econômica
verdadeiro suporte para realização de politicas públicas.
Palavras-chave: Extrafiscalidade. Tributação. Intervenção. Política fiscal. Efetividade.
INTRODUÇÃO
Dentre os maiores poderes concedidos pela sociedade ao Estado, está o poder de
tributar. A tributação está inserida no núcleo do contrato social estabelecido pelos cidadãos
entre si para que se alcance o bem-comum (VIOL, 2015). Sem ela o Estado não poderia
realizar os seus fins sociais a não ser que monopolizasse toda a atividade econômica
(MACHADO, 2012, p. 24)1.
Na atual concepção de Estado, a tributação constitui autêntico poder-dever, cujo
exercício traduz-se no emprego de instrumentos que lhe possibilitem a obtenção dos recursos
necessários ao desempenho de suas atividades (MURPHY, Liam; NAGEL, Thomas, 2005, p.
101)2.
Nesse sentido, compreender a atual relação entre tributação e sociedade requer uma
visão holística sobre os poderes do Estado e as diversas finalidades da tributação. Reduzir a
* Mestranda em Direito Eco nômico e Socioambiental pela PUC-PR. Atualmente é advogada. E-mail:
.
** Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela UFSC e pela Universitá di Lecce Itália. Pós-doutor pela
Universidade Técnica de Lisboa Portugal, pela Universitá di Lecce Itália e pela Universidad de Granada
Espanha. Atualmente, é Procurador do Estad o do Paraná e professor titular nos cursos de graduação, pós-
graduação, mestrado e doutorado em Direito da PUC-PR. E-mail: .
1 Para Hugo de Brito Machado, ―o tributo é inegavelmente a grande e talvez única arma c ontra a estatização da
economia.‖(MACHADO, 2012, p. 24).
2 Como b em identificaram Liam Murphy e Thomas Nagel, a tributação tem duas funções precípuas: ―(1) Ela
determina que proporção de recursos da sociedade que vai estar sob controle do governo para ser gasta de acordo
com algum procedimento decisão coletiva e que proporção será deixada, na qualidade de propriedade pessoal,
sob o arbítrio de indivíduos particulares. Essa é a repartição ente público e privado. (2) Ela é um dos principais
fatores que determinam de que modo o produto social é dividido entre os diversos indivíduos, tanto sob a forma
de propriedade privada, sob quanto a forma de benefícios fornecidos pela ação pública. Essa é a distribuição.‖
(MURPHY, Liam; NAGEL, Thomas, 2005, p. 101).
R: 24. 03.2016
A: 12.11. 2016
Bruna Alexandre Marques Alves Francisco Carlos Duarte
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Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 6, n. 12, p.
Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 7, n. 2, p. 280-300
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tributação simplesmente à sua finalidade arrecadatória é desconhecer a força de seu poder,
pois o financiamento do Estado não se esgota em si mesmo. ―Qualquer formulação de política
tributária que não leve em consideração a abrangência da tributação estará fadada a um
reducionismo arrecadatório e a uma miopia de visão estratégica que poderá a longo-prazo,
inviabilizá-la.‖ (VIOL, 2015).
Nesse contexto, dentre as funções que desempenham os tributos no Estado
Democrático de Direito, a extrafiscalidade é a que melhor pode ser explorada em prol da
garantia de direitos fundamentais e da concretização dos demais objetivos constitucionais.
Através dela, a imposição tributária busca objetivos alheios à mera arrecadação, sendo
intencionalmente moldada para orientar os cidadãos a agir, direta e imediatamente, em favor
da realização de determinado bem público.
Com efeito, ―a extrafiscalidade é a utilização do tributo como meio de fomento ou de
desestímulo a atividades reputadas convenientes ou inconvenientes à comunidade. É ato de
polícia fiscal, isto é, de ação de governo para o atingimento de fins sociais através da maior ou
menor imposição tributária‖ (MEIRELLES, 1993, p. 151).
Tal contexto impõe verificar se a manipulação da carga e das hipóteses de incidência
tributária para fins diversos da arrecadação está sendo adequadamente formulada dentro dos
limites constitucionais, e se tem, efetivamente, contribuído para o estímulo ou inibição de
comportamentos, otimizando a implementação de políticas públicas.
Para tanto, o presente estudo contextualiza, inicialmente, como a tributação, enquanto
instrumento de financiamento do gasto público e enquanto instrumento de política econômica,
é regulada pelo direito. Posiciona, a seguir, as funções dos tributos no Estado Democrático de
Direito: a fiscalidade, a parafiscalidade e a extrafiscalidade.
Posteriormente, analisam-se os contornos atuais do fenômeno extrafiscal no
ordenamento jurídico nacional. E por fim, são detalhadas as medidas usualmente empregadas
em relação ao comércio exterior, como forma de proteção do mercado interno e incentivo às
exportações. Do mesmo modo, abordam-se as medidas de política sobre o consumo e
injustiça fiscal. Também são referidas as medidas extrafiscais atinentes à propriedade imóvel,
calcadas, sobretudo, no princípio da função social da propriedade.
A abordagem metodológica que permitiu traçar os caminhos a serem seguidos se deu
essencialmente através do método de abordagem dedutivo, que permite o encadeamento do
raciocínio partindo de uma análise geral do tema, na tentativa de fornecer um embasamento
teórico sobre o assunto, e, a posteriori, entender melhor a extrafiscalidade em alguns aspectos.

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