Aplica-se a reforma trabalhista aos contratos em curso ou apenas aos novos empregados?

AutorMaria Cristina Irigoyen Peduzzi
Páginas62-66
APLICA-SE A REFORMA TRABALHISTA
AOS CONTRATOS EM CURSO OU APENAS
AOS NOVOS EMPREGADOS?
MARIA CRISTINA IRIGOYEN PEDUZZI
(1)
(1) Ministra do TST. Mestre em Direito, Estado e Constituição pela UnB. Ex-Conselheira do CNJ. Ex-Diretora da ENAMAT. Presidente
Honorária da ABDT.
(2) Essa, a redação do dispositivo: Art. 2º O disposto na Lei n. 13.467, de 13 de julho de 2017, se aplica, na integralidade, aos con-
tratos de trabalho vigentes.
(3) BERNARDES, Hugo Gueiros et. al. O contrato de trabalho e sua alteração. 2. ed. São Paulo: LTr, 1986. p. 19.
(4) BERNARDES, Hugo Gueiros et. al. O contrato de trabalho e sua alteração. 2. ed. São Paulo: LTr, 1986. p. 20.
(5) BERNARDES, Hugo Gueiros et. al. O contrato de trabalho e sua alteração. 2. ed. São Paulo: LTr, 1986. p. 20-21.
1. INTRODUÇÃO
A reforma promovida pela Lei n. 13.467/2017 tem sus-
citado debates a respeito de sua aplicabilidade às relações
de trabalho já constituídas. A lei alterou e acresceu dispo-
sitivos à CLT, trazendo mudanças substantivas às relações
trabalhistas.
Contudo, a lei foi omissa no estabelecimento de nor-
mas de direito intertemporal. Buscando suprir a lacuna
legislativa, o art. 2º da Medida Provisória n. 808, de 14
de novembro de 2017, expressamente previa a aplicação
imediata da reforma aos contratos de trabalho vigentes.(2)
Ainda que o texto da Medida Provisória deixasse dúvidas
passíveis de ser progressivamente solucionadas pela juris-
prudência no exame de casos concretos, ao menos definia
um critério claro de aplicabilidade da reforma. Todavia, a
Medida Provisória não foi convertida em lei e, em conse-
quência, perdeu sua eficácia (art. 62, § 3º, da Constituição).
Com isso, permanece a questão: a reforma trabalhista
é aplicável aos contratos em curso no momento da entrada
em vigor da Lei n. 13.467/2017 ou apenas aos novos con-
tratos, firmados após a vigência do texto legal?
Na presente exposição, examinarei a questão sob dois
prismas distintos. Em primeiro lugar, é importante ponde-
rar a incidência da nova lei sob o prisma da modificação
do contrato de trabalho pela via da alteração legislativa.
Trata-se de uma abordagem que discute as alterações sob
o prisma da própria natureza do contrato de trabalho. A
questão que orienta essa perspectiva é a seguinte: pode a
lei alterar o conteúdo normativo de um contrato firmado
anteriormente a sua vigência?
Provavelmente, talvez a segunda perspectiva a res-
peito da discussão seja mais evidente, por examinar a in-
cidência da nova legislação sob a perspectiva da eficácia
das normas no tempo. Sob essa ótica, questões alusivas à
preservação do direito adquirido e do ato jurídico perfeito
ganham proeminência quando interpretadas a partir da in-
cidência da lei nova.
2. PODE A LEI NOVA ALTERAR O CONTRATO DE
TRABALHO FIRMADO ANTERIORMENTE A SUA
VIGÊNCIA?
A alteração do contrato de trabalho é um dos temas
mais sensíveis da doutrina e jurisprudência justrabalhista,
já que coloca em questão duas das premissas fundantes do
sistema do direito do trabalho. Por um lado, a alteração
do contrato é uma das expressões máximas da autonomia
da vontade das partes. Por outro, os limites impostos pela
natureza cogente das normas regentes das relações de tra-
balho deixam pouca margem para que a vontade das partes
contratantes promova alterações substantivas ao contrato
de trabalho.
Não por menos, o saudoso professor Hugo Gueiros
Bernardes sustentou a semelhança entre o contrato jusla-
boral e os contratos de adesão, uma vez que, por se assen-
tar “numa precária autonomia de vontade”, “o contrato
de trabalho suscita graves problemas na área do consen-
timento, da interpretação da vontade contratual das par-
tes e da integração das lacunas”.(3) Daí porque o jurista já
sustentava a necessidade de uma interpretação das altera-
ções contratuais que equilibre as exigências de proteção
do trabalhador e de respeito à autonomia da vontade, uma
vez que levar “a proteção do fraco até a anulação de sua
vontade, no mundo jurídico, não é defendê-lo, mas ba-
ni-lo da sociedade dos homens livres”.(4) E conclui pela
necessidade de que, no exame da alteração contratual, o
intérprete deixe de lado as premissas de “absoluta boa-fé
do empregado e inarredável má-fé do empregador”, bus-
cando averiguar se, concretamente, há fraude, má-fé ou
abuso de direito.(5)

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