Racismo - aspectos antropológicos e jurídicos - Racism - anthropological and legal aspects

AutorOlney Queiroz Assis - Vitor Frederico Kümpel
CargoAdvogado, Mestre e Doutor em Filosofia do Direito e do Estado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). - Doutor em Direito, Juiz de Direito e Professor no Complexo Jurídico Damásio de Jesus e na FDDJ.
Páginas209-229
Racismo – aspectos antropológicos e jurídicos
Revista Jurídica Logos, São Paulo, n. 5, p. 209-229, 20 09 209
RACISMO – ASPECTOS ANTROPOLÓGICOS E JURÍDICOS
RACISM – ANTHROPOLOGICAL AND LEGA L ASPECTS
Olney Queiroz Assis*
Vitor Frederico Kumpel**
Resumo: este artigo aborda alguns aspectos da doutrina racista e
suas repercussões devastadoras, com a pretensão de mostrar: a) que os
fundamentos da doutrina racista são falsos e os desdobramentos que
resultam da sua prática são inúteis e indesejáveis porque criminosos; b)
que, embora proibitivas pelo Texto Constitucional, práticas racistas estão
enraizadas na cultura brasileira e atingem, preponderantemente, negros
e mulatos; c) que ainda persistem, em pleno século XXI, práticas
racistas amparadas por leis escritas e que atingem basicamente
imigrantes de países periféricos; essa situação vem se ampliando em
países europeus mais desenvolvidos, fato que não condiz com a imagem
europeia de protetora maior dos Direitos Humanos. Nessa trajetória,
discute alguns aspectos do racismo, enquadrando-o em algumas
dicotomias, como: a) fascínio pelo estranho x recusa do estranho; b)
choque de culturas: Ocidente x Oriente; c) cultura hegemônica x cultura
minoritária; d) cultura x civilização.
Palavras-chave: Racismo. Práticas racistas. Direitos Humanos.
Abstract: this article discusses some aspects of racist doctrine and its
devastating impact on social life. The article aims to show, among other
conclusions: a) that the foundations of racist doctrine are false and the
developments arising from its practice are unnecessary and undesirable
because are criminals b) that, although prohibiting by the constitutional
text, racist practices are rooted in Brazilian culture and affects, mainly,
colored people and mulatto c) that racist practices persist in the twenty-
first century protected by legislation and affecting mainly immigrants from
peripheral countries, this situation has been increasing in most developed
European countries, a fact that is inconsistent with the image of European
higher protective of human rights.
Keywords: Racism. Racist practices. Human rights.
*
Advogado, Mestre e Doutor em Filosofia do Direito e do E stado pela Pontifícia
Universidade Ca tólica de São Paulo (PUC/SP). Atua também como Professor
no Complexo Jurídico Damásio d e Jesus e n a Faculdade de Direito Prof essor
Damásio de Jesus (FDDJ), além de ser a utor de diversos livros.
** Doutor em Direito, Juiz de Direito e Professor no Complexo Jurídico Damásio
de Jesus e na FDDJ.
Olney Queiroz Assis e Vitor Frederico Kümpel
Revista Jurídica Logos, São Paulo, n. 5, p. 209-229, 200 9 210
1. DESCOBERTA DO NOVO MUNDO
A gênese da reflexão antropológica é contemporânea à descoberta
do Novo Mundo. A partir desse período, o problema das
descontinuidades e das diferenças culturais projetou-se sobre a
consciência ocidental de modo súbito e dramático.
Durante o século XVI, a Europa foi invadida por escritos e crônicas
a respeito dos povos até então desconhecidos. A maioria desses
escritos estava impregnada de informações fantasiosas. Chegou-se a
duvidar da condição humana do aborígine. A teoria monogenista,
segundo a qual todas as raças humanas descendem de um único
ramo, foi posta em dúvida. Muitos foram os relatórios, os comunicados
e as cartas que se ocuparam em descrever as novas terras e suas
gentes. Nesse sentido, as denominadas Relações Jesuítas, coletânea
de relatórios enviados pelos missionários dessa congregação religiosa
aos seus superiores. São 73 volumes repletos de descrições e opiniões
a respeito dos novos povos, dos produtos da terra, dos seus hábitos e
costumes (MELLO, 1982, p. 187).
Sobre esses relatórios, Barbachano apud Mello (1982, p. 188) fez
o seguinte comentário:
Em resumo, incansáveis viajantes e diligentes observadores, ambos
possuídos de luminar confiança em se u destino, fosse este secular ou
religioso, discorreram sobre o tema d e sempre: afinidades e
diferenças entre os homens e seus mundos sociais e culturais. Ideias
preconcebidas, considerações precipitadas e um forte sabor
passional, de humildade ou de infantilismo, permeiam o conteúdo das
páginas escritas.
2. ESTRANHAMENTO
Lévi-Strauss afirma que os homens da Renascença, ao estudarem
outras culturas, especialmente a cultura greco-romana, desenvolveram
um método intelectual, o qual pode ser denominado de
técnica do
estranhamento
.
Estranhamento significa perplexidade diante de uma cultura
diferente. Essa perplexidade implica reconhecer que algo, antes
considerado natural, passe a ser problemático. Assim, o encontro de
culturas distintas e distantes pode provocar um novo olhar sobre si
mesmo e sobre hábitos, práticas ou costumes antes considerados
evidentes. Acima de tudo, permite reconhecer que existem outras

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT