Experimentação Animal: Entrevista com Steven Wise

AutorMarco Túlio Pires
CargoJornalista da Veja Ciência
Páginas325-334

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"A moral de alguns cientistas é do nível de jardim da infância", diz especialista em direitos dos animais

Steven Wise quer estender direitos fundamentais exclusivos aos seres humanos a alguns animais, impedindo que eles sejam usados em pesquisas científicas

"Faz apenas 60 anos desde que os seres humanos decidiram que não fariam testes em outros seres humanos sem o consentimento deles. E cerca de um século e meio desde que humanos, neste país, deixaram de escravizar outros humanos. Será que essas coisas que costumávamos fazer uns aos outros, que só agora admitimos que eram grotescamente imorais, podem ser repetidas em outros seres?" -Steven Wise

Para o advogado e especialista americano em direito dos animais Steven Wise, alguns animais deveriam ser elevados ao "status de pessoa". Wise investigou sete espécies - chimpanzés, orangotangos, gorilas, papagaios africanos, elefantes, cães e golfinhos - e concluiu que, assim como os seres humanos, todas deveriam ter direitos legais que protegessem sua integridade e liberdade física. O especialista já escreveu quatro livros discutindo o cativeiro, a inteligência animal e por que al-guns bichos não deveriam ser usados em pesquisas científicas. Wise dá aulas sobre direitos dos animais em quatro faculdades nos Estados Unidos, incluindo Harvard. Também é bacharel em

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química e diretor do Non-Humans Rights Project (Projeto pelos Direitos dos Não-Humanos), organização que reúne cerca de 40 pesquisadores nos Estados Unidos. Eles estão prestes a entrar na Justiça para tentar convencer o Superior Tribunal de Justiça da Flórida de que chimpanzés ou golfinhos têm condições de receber direitos fundamentais que ainda são exclusivos de nossa espécie.

O advogado conversou com o site de VEJA para explicar quais são os argumentos morais e éticos envolvidos na pesquisa com animais, e sua relação com os argumentos científicos. Ele diz não ser contra a utilização de certos animais como cobaias, desde que alguns critérios sejam atendidos.

O senhor toma remédios quando está doente?

Sim, eu tomo remédios, sei que eles foram testados em animais e penso que não deveria ser assim. O modo como o nosso mundo funciona nos impossibilita de viver sem ferir, de alguma forma, os animais. A questão é aceitar passivamente viver nesse tipo de sociedade, ou fazer o melhor possível para reduzir nossa cumplicidade.

O senhor seria voluntário em pesquisas de remédios que nunca foram testados em animais?

Sei onde você quer chegar. Gostaria, contudo, que você refletisse em termos morais. Ao fazer testes com animais, aprisionamos um ser indefeso e determinamos o seu destino. Nós, humanos, fizemos isso uns com os outros por muito tempo. Agora que atingimos determinado ponto na nossa evolução moral e ética, não queremos mais repetir os mesmos procedimentos tomados por alguns médicos nazistas na Segunda Guerra Mundial. Passaram apenas 60 anos desde que os seres humanos decidiram que não fariam testes em seres humanos sem o consentimento deles. E cerca de um século e meio desde que humanos, neste país, deixaram de escravizar outros humanos. Será

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que essas coisas que costumávamos fazer uns aos outros, que só agora admitimos que eram grotescamente imorais, podem ser repetidas em outros seres? Eles estão à mercê do ser humano. E nós os exploramos o máximo que podemos. Sob o ponto de vista moral isso é tão terrível quanto escravizar a nossa própria espécie.

Mas, repito, o senhor seria voluntário em testes de remédios que não foram testados em animais primeiro?

Depende da motivação.

Que tal salvar vidas humanas?

Pode ser que eu salve vidas humanas, concordo. Mas e os pesquisadores, por que eles não são voluntários nessas pesquisas? Eles querem viver, eles querem ter casas bonitas, famílias, férias... Por isso, preferem pegar animais indefesos e escravizálos. Fazemos esse tipo de coisa há milhares de anos...

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