Representações sociais sobre meio ambiente de alunos que cursam Engenharia Ambiental

AutorDavid José Diniz - Rita de Cássia Magalhães Trindade Stano
Páginas100-115

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Introdução

Antes* de fazer o levantamento3 de representação social de meio ambiente, julga-se válido, neste momento, caracterizá-lo dentro do conceito de RS e não de conceito científico, respondendo à seguinte questão: Meio ambiente, conceito científico ou representação social?

São considerados conceitos científicos: nicho ecológico, fotossíntese, hábitat, ecossistema etc., pois são entendidos, definidos e ensinados universalmente como tais, representando um consenso. Por outro lado, nas representações sociais, podem-se encontrar os conceitos científicos na forma em que foram internalizados pelas pessoas, que podem estar ou não inseridas na comunidade científica. Dessa forma, se comparadas as várias definições de “meio ambiente” feitas por especialistas de diferentes ciências, transcritas do livro Meio Ambiente e Representação Social , de Marcos Reigota, vê-se que não existe consenso sobre o termo, na comunidade científica, podendo-se supor que ele ocorra fora dela. Assim, como conclui Reigota (1998), por seu caráter difuso e variado, meio ambiente pode ser considerado então uma representação social.

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A partir disso, este estudo baseia-se na necessidade de realizar uma pesquisa em educação, ato que vem evoluindo bastante pela importância de se caracterizar qualitativamente o processo de aprendizagem, de transmissão de conhecimento, ainda mais em se tratando de um tema tão abrangente e complexo, como meio ambiente. Para a realização desta pesquisa, lançou-se mão de metodologias baseadas nos conceitos de pesquisa qualitativa em educação e de estudos em representação social, utilizando-se métodos interrogativos, como desenhos e associações de palavras para detectar, conhecer e organizar os elementos constituintes das RSs.

Assim, objetivos deste estudo: a) Identificar as possíveis mudanças provocadas pelo curso de Engenharia Ambiental nas representações sociais sobre meio ambiente de seus alunos; b) Detectar semelhanças e diferenças nas RSs, estabelecendo uma comparação entre alunos que estavam iniciando (primeiro ano) e concluindo (quarto ano) o curso de Engenharia Ambiental; e c) Sugerir mudanças curriculares.

Fundamentação teórica
Representação social na construção do conhecimento

Por se tratar de uma pesquisa em educação, fica evidente a necessidade de caracterizar o processo de conhecimento. O conhecimento é pessoal e, ao mesmo tempo, coletivo, segundo Elias (1998), cada pessoa parte da palavra e entra na preexistente corrente de conhecimento, que ela pode melhorar ou aumentar e, assim como a linguagem, na qual ele é expresso, é específico de um grupo, o que permite que seja representado simbolicamente por diversas linguagens.

Além disso, diferentes tipos de conhecimento estão correlacionados às diferenças específicas na situação das sociedades em que são produzidos e usados (ELIAS, 1998). Dessa forma, considerando que uma das definições de sociedade é agrupamento de seres que vivem em estado gregário (FERREIRA, 2000), ou seja, conjunto de pessoas que vivem em certa faixa de tempo e espaço, seguindo normas comuns, e que são unidas pelo sentimento de consciência do grupo, corpo social, pode-se considerar que essas características cabem na microssociedade formada pelos sujeitos desta pesquisa.

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Outra característica relevante do conhecimento, que torna importante a realização de estudos na educação é o fato de que ninguém pode saber sem adquirir conhecimento de outros, sem partir de um grupo de conhecedores que dividem um fundo comum de conhecimento e, como parte disso, de uma linguagem específica do grupo, meio indispensável para adquirir qualquer conhecimento (ELIAS, 1998). Nesse sentido, segundo Elias (1998) as diferenças específicas nas estruturas do conhecimento podem esclarecer o fato de que o ponto de partida do conhecimento individual é a condição social do conhecimento, na época em que o indivíduo entra no processo de aprendizagem. Todavia, espera-se que o indivíduo sofra “modificações”, à medida que percorre esse processo. Devido às características do conhecimento, cabe, na pesquisa em educação, o caráter qualitativo e o estudo em representação social.

Por representações sociais, segundo Moscovici (apud SÁ, 1996), entende-se um conjunto de conceitos, proposições e explicações originados no cotidiano, no processo de comunicações, que se dá entre as pessoas. Elas equivalem, na sociedade ou grupo, aos mitos e sistemas de crenças tradicionais, podendo também ser encaradas como a versão contemporânea do senso comum.

Assim,

A representação social se constrói no processo de comunicação, no qual o sujeito põe à prova, através de suas ações, o valor – vantagens e desvantagens – do posicionamento dos que se comunicam com ele, objetivando e selecionando seus comportamentos e coordenando-os em função de uma procura de personalização (MALRIEU, apud LANE, 1991, p.35).

Uma análise concreta das representações que um indivíduo tem do mundo que o rodeia somente é possível se consideradas inseridas num discurso bastante amplo, no qual as lacunas, as contradições e, conseqüentemente, a ideologia possam ser detectadas. Compreender, então, representações sociais implica conhecer não apenas o discurso mais amplo, mas a situação que define o indivíduo que as produz.

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O pensamento complexo na relação meio ambiente e ser humano

O conceito de “meio ambiente” nem sempre é colocado de forma a traduzir a complexidade que lhe é inerente, perdendo ele, às vezes, o seu sentido mais abrangente. A palavra “meio” pode expressar metade em distância ou tempo, centro, maneira ou modo de agir, método para executar ou alcançar algo, uma via, um caminho, poder ou capacidade para praticar uma ação, além de já conter em si o sentido de ambiente, quando se refere à esfera social ou profissional, onde se vive ou trabalha, ao lugar com suas características e condicionamentos geofísicos. Já o substantivo “ambiente” traduz a definição de lugar, sítio, espaço, recinto, aquilo que cerca ou envolve os seres vivos ou as coisas, por todos os lados (FERREIRA, 2000).

Sendo assim, o termo “meio ambiente” transmite a idéia de um conjunto de condições naturais e de influências que atuam sobre os organismos vivos e os seres humanos (FERREIRA, 2000). Indo mais além, essa expressão engloba também as “coisas”, ou seja, o que não contém vida, como mostra a própria definição de ambiente, quando descreve que reúne espaços, locais naturais ou construídos pelos seres vivos. Meio ambiente deve abranger também, de maneira mais ampla, as relações socioculturais, já que “meio” também significa via, método, capacidade, ou seja, maneira de conseguir algo, que reúne aqui linguagem, comunicação, organização, ação e, conseqüentemente, aquilo que resulta desse agir.

Em se tratando de meio ambiente, torna-se indispensável o pensamento complexo, que, segundo Morin (1990), tem como desafio exercer um pensamento capaz de tratar o real, de dialogar e de negociar com ele.

O pensamento complexo, ao contrário do pensamento simplificador que desintegra a complexidade do real, integra o mais possível os modos simplificadores de pensar, mas recusa as conseqüências mutiladoras, redutoras, unidimensionais e, finalmente, ilusórias de uma simplificação que se toma pelo reflexo do que há de real na realidade (MORIN, 1990).

A relação entre meio ambiente e a teoria do pensamento complexo, talvez, esteja principalmente no fato de que, assim como este, aquele compartilha a ambição de dar articulações entre domínios disciplinares,Page 104que são quebrados...

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