Alguns problemas da execução. Pensão decorrente de acidente de trabalho ou doença profissional. Constituição de capital

AutorLuiz Alberto de Vargas e Vania Cunha Mattos
CargoDesembargadores do Tribunal Regional do Trabalho da 4a Região
Páginas149-160

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1. Introdução

A partir da especialização da competência da Justiça do Trabalho para o julgamento dos acidentes do trabalho e de todas as controvérsias derivadas da infortunística do trabalho pela Emenda Constitucional n. 45/2004, uma série de outras questões emergem, em especial as derivadas dos critérios a serem estabelecidos, desde a sentença de conhecimento, ou acórdão, relativamente ao pensionamento e à constituição de capital.

Entendemos que, quanto mais completo for o julgamento destas pretensões, desde o processo de conhecimento, haverá maior efetividade e celeridade na prestação jurisdicional, para que não haja novos questionamentos no processo de execução.

A experiência da Seção Especializada em Execução (SEEx), criada pelo TRT da 4a Região desde abril de 2012 e destinada exclusivamente aos agravos de petição — recurso especí?co do processo de execução trabalhista —, tem demonstrado que, a partir do trânsito em julgado dos processos relativos aos acidentes do trabalho, inúmeras são as discussões na execução sobre critérios de reajustes das pensões, valor da constituição de capital e, ainda, a quanti?cação do pensionamento em parcela única, na forma preconizada pelo art. 950, parágrafo único, do Código de Processo Civil.

A partir da especialização, aumenta, a cada ano, o número de processos em que postuladas indenizações por dano moral e material, possivelmente porque a Justiça do Trabalho implementou muito maior celeridade a estes processos, além de haver demanda reprimida indiscutível.

Uma signi? cativa parte desses processos contém pretensões em que alegada a ocorrência de lesões que importaram em incapacidade laboral do trabalhador e, consequentemente, com pretensão de pagamento de pensão mensal até o restabelecimento da plena capacidade laboral (incapacidade parcial) ou mesmo vitalícia (incapacidade permanente).

No que diz respeito às pensões, estas podem ser destinadas ao próprio trabalhador em todos os casos de redução ou perda da capacidade laborativa, ou aos seus dependentes, no caso de morte do empregado derivada de acidente do trabalho típico.

O acidente do trabalho, quando resulta na morte do trabalhador, remete a outro tipo de consideração de cunho mais ?losó?co do que jurídico, em relação ao grau de compensação econômica equivalente ao dano.

Não há dúvida de que a morte causada por acidente do trabalho em termos amplos é incompensável, por ser difícil a reparação por culpa do empregador ou mesmo de terceiro.

No entanto, o núcleo familiar tem de sobreviver e, portanto, há necessidade de reparação, não só em termos de indenização por danos morais, como em estabelecimento de pensão, objetivando a recomposição da renda familiar alterada, ou eliminada, pelo acidente do trabalho.

A reparação por danos morais leva em consideração a capacidade econômica das partes, a graduação da culpabilidade do empregador, tendo caráter pedagógico, estando vedado de qualquer sorte o enriquecimento sem causa, dentro de critérios razoáveis, para que haja reparação integral.

A jurisprudência trabalhista tem pautado as suas decisões com observância de parâmetros equitativos de justiça, para que haja a reparação mais ampla possível, capaz de propiciar a recomposição da situação anterior ao dano ao empregado ou ao de sua família.

A pensão é uma das formas de indenização material e tem por objetivo ressarcir a vítima de acidente de trabalho ou doença pro?ssional dos prejuízos decorrentes de sua incapacidade ou inabilitação para o trabalho. Tem a nature-za, portanto, de indenização por lucros cessantes, no caso pela privação dos ganhos futuros do trabalhador (art. 402 do Código Civil1).

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O seu fundamento legal está no art. 950 do Código Civil, caput2 e pode ser acumulado com a indenização previdenciária (Súmula
n. 229 do STF). E, ainda que tenha natureza alimentar, não se fundamenta na necessidade de garantir alimentos por parte do bene?ciário, mas na reparação do prejuízo pela perda da renda auferida pelo trabalho decorrente de fato gerado por ato ilícito cometido pelo empregador (OLIVEIRA, 2005, p. 193-4).

Constitui a pensão, especialmente nos casos de incapacidade permanente, a principal reparação alcançada à vítima de acidente do trabalho, porque importa garantia do sustento em um futuro laboral incerto e sombrio, onde o desemprego é certamente o cenário mais provável, em um mercado de trabalho cada vez mais exigente, em que há pouco espaço para a reabilitação de acidentados ou portadores de doenças pro?ssionais.

A pensão mensal, assim, acompanha literal-mente o acidentado laboral por toda a vida e, por se constituir em prestação continuada, exige uma execução também prolongada, muitas vezes por dezenas de anos. Do ponto de vista da gestão judiciária, os processos de execução de pensão mensal são os mais trabalhosos por se prolongarem no tempo, não podendo ser de?nitivamente arquivados. Exatamente por isso, não são poucas as críticas de que esse tipo de execução não deveria ocorrer no Judiciário, que não tem estrutura adequada para a gestão de pagamentos de prestações continuadas de cunho previdenciário.

Não há como se concordar com tais críticas, pois compete ao Judiciário assegurar o estrito cumprimento de suas decisões, sendo que justamente as que deferem pensões em processos de acidente do trabalho e de doença pro?ssional são as mais relevantes do ponto de vista social.

E mesmo que se reconheça as di?culdades para o cumprimento dessa missão social pelo Poder Judiciário Trabalhista, o prosseguimento da execução perante o Judiciário é uma garantia de que as pensões sejam efetiva e tempestivamente pagas, até mesmo porque qualquer eventual incidente pode ser resolvido de forma imediata pela autoridade judiciária, que tem inequívoca competência para decidir tais questões.

Pretende-se, aqui, indicar alguns desses problemas recorrentes nas execuções de pensões acidentárias e que, em nosso entender, devem ser resolvidos levando em consideração, precipuamente, o interesse do jurisdicionado acima de qualquer outra consideração de natureza institucional.

2. Primeiro problema: atualização monetária da pensão

A pensão deve ser atualizada ao longo do tempo, sob pena de esvaziamento do crédito do exequente, o que importa dizer que, necessariamente, o título executivo deve prever a correção periódica do valor da pensão mensal, como forma de preservar seu poder aquisitivo ao longo do tempo.

Neste ponto, não há como não se estabelecer algumas premissas econômicas que interferem no fato de se constituir o pensionamento em parcela a ser paga ao longo do tempo e que mantenha valor original concebido e destinado à reparação mais ampla possível.

Em outros termos, o valor reparatório que se estabelece no tempo presente tem de manter no futuro idêntica capacidade econômica e ?nanceira, considerada a projeção de um largo período de tempo — vinte, trinta ou quarenta anos —, dependendo da idade do trabalhador vitimado e o tempo de vida média considerada

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—, com base na expectativa de vida do brasileiro atual, num quadro sensivelmente alterado nas últimas décadas.

Ora, se na década de setenta a expectativa de vida do brasileiro não ultrapassava a sessenta, sessenta e cinco anos, na atualidade, se pode, com dados nas tabelas do IBGE, estabelecer que a expectativa de vida média do brasileiro se insere no patamar dos setenta e cinco anos, havendo, inclusive, algumas regiões do país com patamar mais alto.

Estas considerações são relevantes para se ter a dimensão aproximada da necessidade da importância da pensão com base em critérios mais completos possíveis, porquanto, no mínimo, se estará estabelecendo obrigação por muitas décadas, além de que se deve garantir que o valor deferido hoje, e tido como expressão do valor da reparação compatível com o dano, seja mantido no futuro, em um país em que a economia não mantém nível estável, como de resto ocorre em muitos outros países.

No Brasil, em mais de trinta e cinco anos, vivenciamos os mais diferentes planos econômicos que sempre se destinaram à salvação nacional e à estabilidade da moeda.

Nos vários planos econômicos, a maioria visando à salvação do País, muitos, com propostas de congelamento de preços e salários e desvalorização da moeda; outros, com con?sco de valores depositados em bancos e cadernetas de poupança, previsão de gatilhos automáticos em face da in?ação veri?cada, dentre outros, a maioria, no entanto, sem qualquer viabilidade ?nanceira ou econômica de produzir efeitos compatíveis com as altas taxas de in?ação existentes no País, nas mais diversas épocas, que corroíam o poder de compra da moeda.

Os vários planos econômicos, em seus diversos desdobramentos, apenas tiveram a virtualidade de desorganizar a economia do País, produzir ganhos excessivos de determinadas classes, reduzir salários e aumentar preços, além das visíveis consequências de desvalorização da moeda e a implementação da verdadeira ciranda ?nanceira, pelas altas taxas de juros capazes de atrair apenas os capitais voláteis e, como tal, improdutivos.

Os Planos Collor I e II, para ?car em apenas um exemplo, além do con?sco realizado em aplicação tradicional como as cadernetas de poupança, o que acarretou a desmotivação da população nos anos posteriores dado o nível de incerteza, também pretenderam expurgar índices de in?ação de mais de oitenta por cento, por meio dos decretos instituidores do Plano como forma de salvação nacional. Os resultados são de conhecimento de todos; resultado de sua despreparada equipe econômica.

Portanto, não há como prever que nos próximos mais de trinta e cinco anos — projeção média no tempo do cumprimento das obrigações de pagamento das pensões —...

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