O acesso à justiça como 'direito humano básico' e a crise da jurisdição no Brasil

AutorFabiana Marion Spengler - Theobaldo Spengler Neto
CargoDoutora em Direito pelo programa de Pós-Graduação stricto sensu da Universidade do Vale do Rio dos Sinos-UNISINOS-RS - Mestre em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul (2000)
Páginas53-74
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O acesso à justiça como “direito humano básico” e a crise da jurisdição no Brasil
Scientia iuriS, Londrina, v. 15, n. 2, p. 53-74, dez. 2011
O ACESSO À JUSTIÇA COMO “DIREITO HUMANO BÁSICO” E A
CRISE DA JURISDIÇÃO NO BRASIL*
THE ACCESS TO JUSTICE AS THE “BASIC HUMAN RIGHT” AND THE
CRISIS IN THE JUDICIARY IN BRAZIL
Fabiana Marion Spengler**
Theobaldo Spengler Neto***
Resumo: O presente texto tem como objetivo discutir o acesso à jutiça
como o mais “básico dos direitos humanos” e o modo como ele vem se
concretizando no Brasil pós Constituição de 1988. Nessa mesma linha
de raciocínio o texto aborda o Estado como detentor do monopólio da
força enquanto instituição legitimada a “dizer o direito” determinando
quem ganha e quem perde a demanda. Assim, as crises pelas quais passa
a jurisdição atual serão abordadas bem como se debaterá as possíveis
alternativas a estas crises.
Palavras-chave: Direitos humanos. Acesso à justiça. Jurisdição. Mediação.
Abstract: The present text inquiry the access to Justice as the “basic
human right” and the way they are enforced in Brazil, after the adoption
of the Constitution of 1988. Trough this reason the text focuses the
State as the possessor of the monopoly of the use of force, while a
lawful institution to “decide the rights”, determining who succeed and
who loses the litigation. Though, the crisis through which the actual
jurisdiction faces are going to be exposed, as well as, inquiring the
possible alternatives to this crisis.
Key-words: Human Rights. Access to Justice. Jurisdiction. Mediation.
* O presente texto foi elaborado a partir de pesquisa realizada junto ao projeto
intitulado “Mediação de conflitos para uma justiça rápida e eficaz” financiado pelo
CNPQ (Edital Universal 2009  processo 470795/2009-3) e pela FAPERGS (Edital
Recém-Doutor 03/2009, processo 0901814) coordenado pela primeira autora.
** Doutora em Direito pelo programa de Pós-Graduação stricto sensu da Universidade
do Vale do Rio dos Sinos  UNISINOS RS, mestre em Desenvolvimento Regional,
com concentração na área Político Institucional da Universidade de Santa Cruz do Sul -
UNISC  RS, docente dos cursos de Graduação e Pós Graduação lato e stricto sensu da
última instituição, advogada Email: fabianaspengler@viavale.com.br e fabiana@unisc.br.
*** Mestre em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul (2000), onde atualmente é
professor adjunto. Professor de Direito Processual Civil (Processo de Conhecimento,
Processo de Execução, Procedimentos Especiais e Processo Cautelar) e de Direito
Civil - Responsabilidade Civil. Integrante do Grupo de Pesquisas “Políticas Públicas
no tratamento dos conflitos”, vinculado ao CNPq sob a coordenação da Prof.º Dr.º
Fabiana Marion Spengler. Sócio titular do escritório Advocacia Spengler Assessoria
Empresarial - SC. Email: theo_spengler@hotmail.com.
DOI: 10.5433/2178-8189.2011v15n2p53
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Fabiana Marion Spengler; Theobaldo Spengler Neto
Scientia iuriS, Londrina, v. 15, n. 2, p. 53-74, dez. 2011
INTRODUÇÃO
Todas as considerações sobre a jurisdição brasileira e suas crises (criadas e fomentadas
a partir da globalização cultural, política e econômica) são também consequências da
crise estatal. Nascida de um delibe rado processo de enfraquecimento do Estado, a
crise se transfere para todas as suas instituições, pois o Direito que imediatamente
conhecemos e aplicamos, posto pelo Estado, assim o é porque seus textos são escritos
pelo Legislativo, mas também porque suas normas são aplicadas pelo Judiciário.
Em decorrência das pressões centrífugas da desterritorialização da produção e
da transnacionalização dos mercados, o Judiciário, enquanto estrutura fortemente
hierarquizada, fechada, orientada por uma lógica legal-racional, submisso à lei, se
torna uma instituição que precisa enfrentar o desafio de alargar os limites de
sua jurisdição, modernizar suas estruturas organizacionais e rever seus padrões
funcionais para sobreviver como um poder autônomo e independente. Em
termos de jurisdição, os limites territoriais do Judiciário, até então organizados de
modo preciso, têm seu alcance diminuído na mesma proporção que as barreiras
geográficas vão sendo superadas pela expansão da informática, das comunicações,
dos transportes, e os atores econômicos vão estabelecendo múltiplas redes de
interação. Quanto maior a velocidade desse processo, mais o Judiciário é atravessado
pelas justiças emergentes, nos espaços nacionais e internacionais, representadas
por formas “inoficiais” de tratamento de conflitos. Em termos organizacionais, o
Poder Judiciário foi estruturado para atuar sob a égide dos códigos, cujos prazos e
ritos são incompatíveis com a multiplicidade de lógicas, procedimentos decisórios,
ritmos e horizontes temporais hoje presentes na economia globalizada. Nestes
termos, o tempo do processo judicial é o tempo diferido. O tempo da economia
globalizada é o real, isto é, o tempo da simultaneidade. Ainda, para o Judiciário
faltam meios materiais de dispor de condições técnicas que tornem possível
a compreensão, em termos de racionalidade subjetiva, dos litígios inerentes a
contextos socioeconômicos cada vez mais complexos e transnacionalizados
(FARIA, 2001, p. 8-9).
Diante de tais circunstâncias, a jurisdição torna-se alvo de uma preocupação
constante voltada para a compreensão da racionalidade instrumental de
aplicação do direito e, especialmente, da estrutura funcional necessária para
sua realização. É possível observar que as várias instâncias determinadoras da
perda de centralidade e de atribuição do Estado, no momento de produzir ou
de aplicar o Direito. Nesse contexto, demonstrada a incapacidade do Estado
de monopolizar esse processo, tendem a se desenvolver outros procedimentos
jurisdicionais, como a arbitragem, a mediação, a conciliação e a negociação,
almejando alcançar celeridade, informalização e pragmaticidade.

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