Acesso do Trabalhador às Contribuições Sociais do Contrato de Trabalho como Direito de Exigir

AutorOcélio de Jesús C. Morais
Páginas83-98

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A finalidade deste item é saber o que expressa o conteúdo normativo da Lei n. 12.692/2012 e para quais fins, relativamente ao direito de acesso do trabalho às contribuições sociais do seu contrato de trabalho.

O tema central, num segundo momento, é o acesso às informações relativas ao recolhimento das contribuições sociais como direito de exigir conduta positiva da empresa ou do tomador de serviços, que tem como corolário o direito de controlar a regularidade das retenções e recolhimentos das contribuições à base de dados do CNIS (Cadastro Nacional de Informações Sociais).

Objetiva-se também saber e mostrar a utilidade social e prática da Lei n. 12.692/2012 à vida do trabalhador e de seus dependentes no que concerne ao princípio da inclusão social previdenciária, a partir do cômputo das contribuições sociais ao tempo de serviço. Nessa perspectiva, a temática é desenvolvida com referência aos desafios dos riscos sociais no ambiente da sociedade de risco mundial, que exige um cosmopolitismo normativo ao enfrentamento desses riscos sociais.

Em decorrência das finalidades, apresenta-se o trabalho como uma contribuição para a solução de um inquietante e relevante problema nacional: o custeio do sistema nacional da seguridade social. E, a par disso, aponta-se a atualidade da temática, com relevância para a área do conhecimento e ao problema prático da falta de controle pelos trabalhadores brasileiros, quanto à retenção e recolhimento das contribuições do contrato de trabalho pelos empregadores.

Mas também é nosso objetivo comprovar que a referida lei vincula as decisões judiciais trabalhistas como critério indispensável à efetividade social de seu conteúdo normado, notadamente direcionado aos trabalhadores com vínculo empregatício e aos trabalhadores avulsos, brasileiros ou estrangeiros aqui residentes, igualizados pelo cosmopolitismo normativo presente no conjunto normativo nacional.

Como critério hermenêutico adotamos o método sistemático para melhor esclarecimento dos fins sociais dessa lei aos objetivos da Seguridade Social, seu ambiente legiferante específico.

Vamos investigá-la com espírito científico e com o pensamento de que adequadas sejam a sua interpretação e a sua aplicação à realidade de fundo a que se destina — o direito de o trabalhador exigir o regular e integral recolhimento das contribuições previdenciárias de seu contrato de trabalho destinadas à provisão dos riscos sociais aos quais está sujeito no âmbito das relações e dos contratos de trabalho.

Assim, entrego-me a esta breve pesquisa na busca do sentido e da revelação teleológica desta lei à efetividade do princípio da inclusão previdenciária dos trabalhadores no Brasil e com o espírito da colaboração social, estimulado por aquela animação de que “saber é conhecer pela causa”109.

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5.1. O espírito da Lei n 12.692/2012 na ordem jurídica brasileira

Livet110, analisando as normas e as instituições sociais, identifica nas primeiras uma concepção “holística” e uma concepção “individualista”. A concepção individualista da norma é inscrita na sociedade, conforme o auto, “porque são os indivíduos e seus interesses e seus raciocínios práticos que estão na origem da norma”111.

Mas, de forma simultânea ao caráter individualista, é a destinação da norma ao todo da sociedade que lhe define natureza holística.

Trata-se de uma característica universal da norma em qualquer tipo de sistema jurídico112 porque as normas são regras reguladoras e são regras constitutivas113 destinadas ao indivíduo e a uma função social, inerente à preservação da sociabilidade humana. É a conjugação da natureza reguladora e com a natureza constitutiva das normas jurídicas que as apresentam como “determinações”114, aos indivíduos e à coletividade porque constituem “disciplina obrigatória de condutas”115, e, por isso mesmo, “não são conselhos, opinamentos, sugestões”116.

No conjunto normativo nacional. O caráter holístico das normas está consagrado no art. 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB)117 porque a sua disciplina coletiva visa aos fins sociais, aos interesses básicos da coletividade e às exigências do bem comum, como seu telos118. E a concepção individualista está no art. 3º da LINDB porque sua disciplina obrigatória é indistinta e igual aos indivíduos considerados em si, isoladamente.

A Lei n. 12.692/2012119, que regulamenta o acesso do empregado às informações relativas ao recolhimento de suas contribuições ao INSS, acrescentando o inciso VI, ao art. 32, e Inciso I, ao art. 80 da Lei n. 8.212/91, apresenta o duplo caráter holístico e individualista como regra, e reguladora como regra constitutiva.

No inciso VI, art. 1º, da Lei n. 12.692/2012, o espírito impositivo da norma é destinado à empresa como determinação, como disciplina obrigatória de conduta, pois o conteúdo da norma lhe impõe o dever de “comunicar, mensalmente, aos empregados, por intermédio de documento (...), os valores recolhidos sobre o total de sua remuneração ao INSS”. Neste particular, o espírito imediato dessa norma de natureza constitutiva consiste em

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regulamentar uma conduta inescusável à empresa, visto que se trata de uma regra que faz existir a prática habitual exigida, comunicar aos empregados, e mensalmente os valores são recolhidos de suas remunerações à Previdência Social.

O conteúdo histórico ou a finalidade social imediata dessa norma é garantir ao trabalhador a incolumidade das contribuições sociais decorrentes de seu contrato de trabalho para fins de que lhe seja assegurada a inclusão social previdenciária, por meios dos benefícios sociais que o Sistema de Seguridade Social brasileiro dispõe.

Sob o aspecto da função social ou da teleologia desta norma, são as contribuições previdenciárias do contra de trabalho computadas na base de dados do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), que irão garantir ao trabalhador e seus dependentes o bem-estar como beneficiários individuais da proteção social colimada pelo sistema securitário brasileiro.

Por isso que o ver comunicar inscrito no inciso expressa dever, impõe obrigação, designa conduta simples a ser observada e cumprida com regularidade pelo empregador120. Ali, o verbo comunicar, por conseguinte, inscreve no conjunto normativo brasileiro, quando se trata de recolhimentos das contribuições sociais do contrato de trabalho, obrigação de fazer inescusável ao empregador no âmbito dos contratos de trabalho.

Além do caráter constitutivo, quando impõe ao empregador conduta suficiente a produzir eficácia jurídica à finalidade social das contribuições sociais do contrato de trabalho, o espírito regulatório na Lei n. 12.692/2012 tem por função essencial prevenir, limitar ou até mesmo resolver os conflitos que possam surgir da obrigação de recolher e do direito de acesso às informações relativas às remunerações ao INSS.

E por uma conjugação desses dois sentidos, na perspectiva do bem comum avisado a toda coletividade de trabalhadores, essa lei quer, sob o aspecto da solidariedade econômica da proteção social, preservar uma das fontes de custeio da previdência social: as contribuições sociais oriundas “do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, a qualquer pessoa física que ele preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício”121 (art. 195, I A).

Isso ocorre porque a seguridade social brasileira, estruturada para assegurar os direitos relativos à saúde, à Previdência e à assistência social, “compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade”, conforme prescrito no artigo 195, da CRFB/88, de caráter social holístico. Esse conjunto de ações integradas é o que se pode denominar de “responsabilidades partilhadas” 122, como escreve Ferreira Filho quando analisar que “A seguridade social, por exemplo, é claramente apontada na Constituição de 1988 como responsabilidade da sociedade inteira (art. 195)”123.

É nessa perspectiva que a Lei n. 12.692/2012 desfralda como conteúdo holístico a proteção Social previdenciária, portanto, visa garantir os serviços e benefícios da seguridade social, os quais também são custeados pelas contribuições sociais do contrato de trabalho.

Então, admitindo-se, como escreve Livet, que “nenhuma regra é instituída sem que se pressupunham práticas que a precedam” 124, é ponderável reconhecer que o Instituto Nacional de seguro social tem por objetivo evitar

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precisamente o crime de sonegação das contribuições sociais e o crime de apropriação indébita das contribuições previdenciárias125.

O crime de apropriação indébita previdenciária, definido assim pela Lei n. 9.983/2000, ocorre quando o empregador “deixar de repassar a previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional”. (art. 168-A).

Na prática, isso ocorre quando o empregador desconta do salário de contribuição do trabalhador as contribuições sociais, mas não repassa ao INSS, e delas se apropria indevidamente.

Logo, deixar de repassar ao INSS as contribuições sociais retidas do contrato de trabalho tipifique a conduta comissiva dolosa, daí que a obrigação de comunicar mensalmente as trabalhadores as informações relativas a essas contribuições, constitui meio de controle individual imediato, por parte do trabalhador, para que o empregador recolha, no prazo legal, contribuição social ou outra importância destinada a previdência social que tenha sido descontado...

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