Ação de Execução

AutorManoel Antonio Teixeira Filho
Ocupação do AutorAdvogado. Juiz aposentado do TRT da 9.ª Região
Páginas80-90

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1. Comentário

Ao tempo em que vigorava o CPC de 1939, Liebman, comentando-o, observava que a execução da sentença, como decorria da própria expressão, se baseava em uma sentença condenatória exequível, devendo, por isso, ser precedida de um processo de cognição encerrado com o proferimento de sentença que normalmente deveria ter passado em julgado (art. 882) e excepcionalmente poderia dar lugar à execução provisória (art. 830). (Estudos sobre o processo civil brasileiro. São Paulo: José Bushatsky, 1976. p. 34).

A ação executiva, para ele, era cabente nos casos indicados pelo art. 298 daquele estatuto processual e, não tendo sido precedida de outro processo, oferecia “no próprio curso de seu desenvolvimento oportunidade para o exame da existência do direito” cuja execução se pleiteava (idem, ibidem).

Anotava, ainda, o festejado mestre milanês que o processo executivo oriundo do processo medieval italiano logo se difundiu por toda a Europa, vindo, mais tarde, a desaparecer, embora tenha sobrevivido nos países sul-americanos, em que chegou por intermédio das legislações da Espanha e de Portugal.

Liebman demonstrava, portanto, que era possível chegar-se à execução por duas vias distintas: a da execução da sentença e a da ação executiva. A primeira, por ele também denominada ação executória, correspondia à execução forçada e pressupunha um título executivo judicial, em regra a sentença condenatória, residindo na sanção que lhe era própria o objeto dessa modalidade de execução; a segunda (ação executiva) fundava-se em título extrajudicial, ao qual a lei atribuía eficácia executiva. A ação executiva era ação especial no sistema do CPC de 1939, pois, proferida a sentença, tinha início um procedimento ordinário, característico do processo de conhecimento, sendo que depois da sentença é que se verificava a prática de atos propriamente executórios.

Nesse ponto, o direito processual brasileiro da época diferia da maior parte dos ordenamentos processuais europeus, nos quais havia uma espécie de execução, sendo, portanto, aí desconhecida a ação executiva que o nosso meio consagrara.

Lembra José da Silva Pacheco que no texto do CPC de 1939 distinguia-se a execução em: a) simples cumprimento da sentença ou do que fora avençado (sentido impróprio de execução); b) execução aparelhada da sentença condenatória; c) execução antes e ao lado da cognição nos casos previstos em lei (Tratado das execuções — processo de execução. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1976. 1.º vol., p. 155). No primeiro caso, identificado de maneira

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imprópria, como execução de sentença declaratória, constitutiva ou mandamental, o que se tinha na verdade era o mero cumprimento própria declaração, constituição ou mandamento; no segundo, ocorria a execução da sentença, inerente à aparelhada, no âmbito do Poder Judiciário, da sentença condenatória; no terceiro, cuidava-se de execução aparelhada com a finalidade de tornar efetivo o apresamento judicial de bens, antes da cognição completa, sendo esta realizada ulteriormente: “consumando-se a plena cognição, com a sentença executiva, completava-se a execução” (obra cit., p. 155).

Leciona, ainda, o citado jurista que tanto na ação de execução de sentença como na ação executiva havia execução: “na primeira, havendo cognição completa, que já se deu no processo cognitivo em que se proferiu a sentença condenatória, nada restava senão executar. O executado, em sua defesa, só podia impugnar a execução com ação de oposição ou embargos. Na ação executiva havia apenas cognição incompleta, presumida por lei, com base em atos ou fatos extrajudiciais taxativamente enumerados, e com base neles se executavam bens do devedor. Era execução aparelhada (penhora, depósito). Como a cognição era incompleta ou meramente presumida por lei, dava margem ao contraditório, à ampla defesa, instaurando-se o processo cognitivo, que ensejava a sentença judicial executiva. Essa sentença não era sentença exequível ou executável, mas sentença executiva no verdadeiro sentido. A execução, no caso, embora seguida de cognição, não deixava de ser execução. Era mera questão de técnica legislativa. Em lugar de antepor a cognição à execução, como era comum na execução das sentenças, inverteu-se a ordem, começando pela execução para depois propiciar o processo de cognição. Em todo caso, execução perfeita e acabada” (idem, ibidem).

A abjunção legal e doutrinária que se fazia, na vigência do Código Processual Civil de 1939, entre os conceitos de execução de sentença e ação executiva apresenta hoje interesse meramente histórico, pois o atual CPC de 1973, com grande acerto, unificou as vias executivas, como revelava o seu art. 583, a teor do qual “toda execução tem por base título executivo judicial ou extrajudicial”. Na Exposição de Motivos do projeto desse texto processual, o Prof. Alfredo Buzaid pôde salientar que essa unificação se justificava a partir do fato de ser a ação executiva nada mais do que uma espécie de execução geral: “e assim, parece aconselhável reunir os títulos executivos judiciais e extrajudiciais. Sob o aspecto prático são evidentes as vantagens que resultam dessa unificação, pois o projeto suprime a ação executiva e o executivo fiscal como ações autônomas” (Capítulo IV, Do Plano da Reforma, III, Das Inovações, n. 21). Em França, e. g., o direito consuetudinário proclamou a equivalência das sentenças aos instrumentos públicos (lettres obligatoires par devant notaire au passés sous Seel Royal), motivo por que conferiu a ambos os títulos a possibilidade da execução forçada (exécution parée). O princípio da unicidade dos títulos executivos esteve presente nas Ordenações reinóis lusitanas e no Code de Procédure Civil napoleônico, de onde se espraiou para diversas outras legislações dos tempos modernos, notadamente as europeias, como é o caso da italiana, da portuguesa, da alemã e da austríaca.

Em edições anteriores, dissemos: “Coerentes com o que expusemos em linhas pretéritas, entendemos que a antiga separação da ação executiva, em relação à execução de título sentencial, mesmo que consagrada pela doutrina civilista do período, jamais encontrou ressonância no processo do trabalho, onde, segundo acreditamos ter podido demonstrar

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de modo satisfatório, a execução se calca, exclusivamente, em título judicial (sentença transitada em julgado ou acordo inadimplido).

O processo do trabalho de lege lata conhece, portanto, desde a sua origem, apenas a execução de título sentencial (sentença condenatória ou homologatória), nada obstante razões ponderadas aconselhem a inclusão, de lege ferenda, de títulos extrajudiciais, desde que relacionados ao contrato de trabalho”.

Essa nossa sugestão acabou sendo acolhida pela Lei n. 9.958, de 12 de janeiro de 2000, que deu nova redação ao art. 876 da CLT, para permitir que a execução se baseie em certos títulos extrajudiciais, consistentes no termo de conciliação firmado no âmbito das Comissões de Conciliação Prévia ou no termo de ajustamento de conduta, assinado perante o Ministério Público do Trabalho.

2. O princípio da demanda

No processo civil, o princípio da demanda, conforme o qual “O processo começa por iniciativa da parte e se desenvolve por impulso oficial, salvo as exceções previstas em lei” (art. 2.º), tem incidência tanto no processo de conhecimento quanto no de execução e mesmo no cautelar. Esse postulado da inércia jurisdicional, que vem do direito romano antigo (ne procedat iudex ex officio; nemo iudex sine actore), contudo, quando trasladado para o campo do direito processual do trabalho tem aplicação apenas no processo cognitivo — e, ainda assim, no plano das ações individuais; nas coletivas, permite a lei que a tutela jurisdicional seja subministrada por iniciativa do Ministério Publico, ou seja, mesmo sem provocação por parte de uma das categorias envolvidas no conflito coletivo de interesses (CLT, art. 856); o pressuposto para isso é a ocorrência de suspensão do trabalho, pelos empregados (ibidem). A faculdade que a precitada norma legal atribuía ao presidente do Tribunal competente para dar início à ação foi retirada pela Lei n. 7.783/89, art. 8.º.

A execução trabalhista era presidida pelo princípio legal da incoação do juiz, no que respeitava ao início desse processo (CLT, art. 878, caput); em termos práticos, essa peculiaridade era notável, considerando-se que, transitando em julgado a sentença, ou não sendo cumprido o acordo, poderia (logo, estávamos diante de uma faculdade) o juiz, por sua iniciativa, ordenar a citação do devedor para cumprir a obrigação, sob pena de penhora, exceto se, no primeiro caso, houvesse necessidade de liquidação por artigos ou por arbitramento.

Pensaram alguns intérpretes que a Lei n. 5.584/70, ao dispor, em seu art. 4.º...

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