Ação Declaratória

AutorAdailson Lima e Silva
Ocupação do AutorBacharel em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU)
Páginas67-127

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2. 1 Surgimento

O surgimento da ação declaratória é controvertido na doutrina pátria e alienígena, pairando as divergências quanto ao seu alcance e ao ordenamento jurídico do qual se originou.

No Brasil, Edson Prata1, representante da escola de processualistas do Triângulo Mineiro, informa que os precedentes da ação declaratória advêm do Direito romano, de forma mais precisa do Período das Legis Actiones, quando leciona: “Trata-se do primeiro período do sistema de justiça privada romana. Surgiu provavelmente com as primeiras manifestações do sentimento de direito do povo romano e se corporificou, em definitivo, com a Lei das XII Tábuas”. E encerra dizendo: “Podemos dividir as ações da lei em declaratórias e executivas. São declaratórias: a) per sacramentum, por aposta sacramental; b) iudicis postulatio, ou petição de juiz; c) per condittionem, ou pedido de prazo”.

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Na Argentina, sustenta Guillermo J. Enderle2que seu nascedouro foi no direito egípcio, com estas considerações: “Los primeiros antecedentes de la figura em estúdio los hallamos em los documentos juducuales grego-egípcios”.

Na Itália, Giuseppe Chiovenda3entende que a origem da ação declaratória ocorreu de forma bifronte, citando para tanto o direito romano ao lado do direito egípcio, quando doutrina: “Nel processo classico servivano a questo scopo le formulae o praeiudicia”. E termina: “Quanto ai documenti giudiziali greco-egizi essi ci presentano esempi di tipiche azioni d’accertamento”.

Na Alemanha, Weismann4, citado por Prieto Castro5, faz um brilhante estudo sobre as origens e conteúdo da ação declaratória, quando leciona: “Casos especiales de declaracion ofrece algunos el Derecho germânico: a) El litígio entre pretendientes... b) Provocatio ad agendum... c) Obetencion de seguridad”. Continua: “El derecho franco: a) procedimiento inquisitorial... b) procedimientos que se há encontrado em algunos documentos(...) solicitandase su reconocimiento(...) renovado el documento em que constaban em el mismo plazo, so pena de extincion del credito y de la caducidad del titulo”. E termina: “El Derecho italiano: a) las acciones as silentium imponi... b) Confirmacion judicial... c) Accion de nulidad (querella nullitatis) (...) d) La demanda incidental... e) la provocacion singular que hemos visto antes para la renovacion de los títulos de deuda... f) Publicatio testium... g) El procedimiento provocatirio... h) las provocaciones especiales ex lege diffamari y lex si contendat. Son el llamado litígio entre pretendientes y la apelation extrajudicial”.

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Apenas por entendê-la como a mais completa e a mais cientificamente defensável dentre as pesquisadas, passaremos a tecer alguns comentários sobre a doutrina de Weismann, acima mencionado, da forma que se segue:

2.2. As ações prejudiciais

Duas facções doutrinárias disputam a primazia de terem encontrado a origem das ações declaratórias. Ambas tem origem alemã, como demonstraremos a seguir.

Uma corrente é liderada por Weismann6, com sua “Die Festellungsklage”, que se traduz do alemão para o português por “ação declaratória”, que sustenta a origem miscigenada, a origem mesclada de ação declaratória, fundindo institutos e princípios de várias culturas jurídicas para chegar ao que chamamos hoje de ação declaratória, disciplinada pelo art. 4º, como também pelos arts. e 325 do Código de Processo Civil.

Outra facção doutrinária é liderada por Degenkolb7, com exposição feita na obra “Einlassungszwang und Urteilsnorm” cuja tradução para o vernáculo é “Intervenção coativa e força normativa da sentença”, que assevera que a ação declaratória se originou dos praejudicia do Direito romano.

A segunda corrente, ou seja, a liderada por Degenkolb, na obra acima mencionada, tem em solo brasileiro seguidores de nomeada, dentre eles podem ser citados Alfredo Buzaid8, como líder pátrio desta corrente de pensadores, em sua Ação declaratória, que sustenta: “A despeito do brilho com que foi sustentada, esta opinião não merece acolhida. A existência das formulae et actiones praeiudiciales, no direito romano clássico, denota claramente que, além da tutela judicial poste-

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rior à violação do direito, existia uma forma autônoma, sem condemnatio e composta somente de intentio, denominada praeiudicium, consistente em um juízo normativo de eventual juízo sucessivo, aplicado de incerteza jurídica. Os romanos não só tiveram consciência da função declaratória das ações prejudiciais, mas as distinguiram das ações de condenação”.

Na mesma linha o entendimento de Celso Agrícola Barbi9, no compêndio Ação declaratória principal e incidente, quando leciona: “As fórmulas prejudiciais não existiam, porém, apenas como juízos preparatórios de outros a serem decididos, mas também como questões principais e independentes de quaisquer outras”.

Segundo Chiovenda10, são numerosos os casos obtidos nas fontes romanas em que os “praejudici” constituíam casos típicos de ação declaratória, tal como hoje é admitida. Acompanham o mesmo raciocínio Adroaldo Furtado Fabrício11,

Ada Pellegrini Grinover12e João Batista Lopes13.

Não obstante, ousamos discordar da doutrina retro mencionada, pois o próprio Alfredo Buzaid14, na sua Ação declaratória, leciona: “O direito brasileiro, em face desse instituto, deu-lhe um tratamento diverso do que é dispensado na França, na Itália, na Inglaterra e noutros países da Europa. Enquanto lá só pode ser declarada a usucapião quando o réu exerce o direito de defesa, o Brasil deu um passo adiante, atribuindo ao possuidor uma ação tendente a declarar a aquisição da propriedade”.

Na mesma linha de raciocínio, Celso Agrícola Barbi15, no compêndio Ação declaratória principal e incidente, in-

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forma: “Ao elaborar-se o código processual para o império alemão, foram abandonados esses juízos, sendo a lacuna preenchida pela introdução da ação declaratória. A origem desta nesse código não deve, porém, ser buscada na actio praejudicialis romana, nem nos juízos provocativos. O direito processual francês usava, tradicionalmente, um tipo de ação destinada ao reconhecimento de escritos e títulos – action em reconnaissance d’ecrit ou de titre –, a qual se encontra na ordenança de Villers-Cotterets, de agosto de 1539, no § 92, e essa ação foi introduzida na Alemanha na segunda metade do século XVI”.

Logo, se na Alemanha a ação declaratória não advém das ações prejudiciais, porém das ações de reconhecimento fran-cesas; se a ação de usucapião é exemplo de ação declaratória, como menciona o saudoso Prof. Alfredo Buzaid; se, na ver-dade, a ação de usucapião não retrata uma descendente das “ações prejudiciais”, mas caso típico de “litígio entre pretendentes” de um bem corpóreo, logo nem toda ação declaratória teve origem nas ações prejudiciais.

As evidências doutrinárias estão a indicar a origem multiprocessual, multifária, da ação declaratória hoje vigente no...

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