Ação Civil Pública - Du Pont do Brasil S/A - Terceirização Ilícita e Fornecimento de Mão de Obra por meio de Cooperativa de Trabalho Fraudulenta

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EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DO TRABALHO DA VARA DE CAMAÇARI(BA)

O Ministério Público do Trabalho através da Procuradoria Regional do Trabalho da 5- Região, localizada na Avenida Sete de Setembro, n. 308, Bairro da Vitória, Município de Salvador, Estado da Bahia, por sua Procuradora do Trabalho infra firmada, vem à presença de V. Excelência, com fulcro na Constituição da República, arts. 127 e 129; na Lei Complementar n. 75, de 20.5.1993, art. 83, inciso III; na Lei n. 8.078/1990 (CDC), arts. 81, 91 e seguintes, e na Lei n. 7.347, de 24.7.1985 (LACP), arts. 1e, inciso IV, e 3e, propor a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA C/C AÇÃO CIVIL COLETIVA, COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA,

em face da sociedade empresária Du Pont do Brasil S/A, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n. 61.064.929/0021-12, com endereço na Rua Oxigênio, n. 748, COPEC, CEP: 42180-270, Município de Camaçari, Estado da Bahia, pelas razões de fato e de direito que passa a expor:

I - Dos fatos

1. No percurso de Inquérito Civil n. 1.006/2008, instaurado por esta Procuradoria Regional do Trabalho da 5- Região, no qual se investigava

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terceirização ilícita e fornecimento de mão de obra através de cooperativa de trabalho fraudulenta, a Procuradora Regional que esta sub-assina, considerou necessária a instauração de investigação contra a empresa ora acionada diante do teor da ata de audiência e petição firmada pela cooperativa de trabalho COOINSP.

2. Instaurou-se, via de consequência, Procedimento Preparatório no âmbito da Coordenação de Defesa dos Interesses Difusos e Coletivos da instituição ministerial, em seguida convertido em Inquérito Civil — cópias das peças indispensáveis em anexo. Cientificou-se a SRTE — Gerência Regional de Camaçari — BA sobre a instauração do Inquérito Civil, ao tempo em que lhe foi solicitado que procedesse fiscalização no estabelecimento da empresa.

3. Em fevereiro de 2009 o Relatório de Ação Fiscal foi enviado ao órgão ministerial, relacionando as fiscalizações ocorridas entre os meses de novembro de 2008 e fevereiro de 2009, cujo documento apontou as irregularidades constatadas, as quais foram detalhadamente discriminadas.

4. As diligências fiscalizatórias empreendidas na Unidade de Camaçari da Du Pont do Brasil S/A, no período de novembro de 2008 a fevereiro de 2008, evidenciaram a existência de ilegalidade na contratação de mão de obra mediante a intermediação por meio da COOINSP — Cooperativa dos Inspetores Autônomos, da empresa terceirizada Cegelec Ltda. e da empresa terceirizada Sólida Soluções Industriais Ltda. como restará evidenciado.

4. O relatório da ação fiscal promovida pela SRTE — Gerência do Trabalho em Camaçari, ao qual foram incorporados 11 (onze) autos de infração, bem como diversos outros documentos que serão adiante mencionados, é minucioso na demonstração da ilegalidade da conduta da acionada na utilização de trabalhadores cooperativados, assim como em descumprimento de direitos trabalhistas.

5. Identificou-se a existência de trabalhadores laborando nas instalações da acionada, a princípio identificados como trabalhadores cooperativados, mas que, a partir da análise das circunstâncias em que exerciam suas atividades, ostentavam a condição de seus empregados.

6. Durante a inspeção realizada foram entrevistados trabalhadores das três intermediadoras citadas, estando todos em situações semelhantes: laborando em atividades que consistem na atividade-fim da Du Pont, qual seja, a indústria e comércio de produtos químicos orgânicos (conforme estatuto social e inscrição no CNPJ do estabelecimento).

ATIVIDADE-FIM DA DU PONT DO BRASIL S/A E ATIVIDADES DOS TRABALHADORES CONTRATADOS ATRAVÉS DAS EMPRESAS INTERPOSTAS COOINSP — COOPERATIVA DOS INSPETORES AUTÔNOMOS, CEGELEC LTDA. E SÓLIDA SOLUÇÕES INDUSTRIAIS LTDA.

7. De acordo com o Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica da Du Pont do Brasil S/A, a sociedade tem como atividade econômica principal a fabricação de

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produtos químicos orgânicos não especificados anteriormente (no estatuto social da empresa, na parte relativa ao seu objeto social, estão contemplados indústria e comércio de produtos químicos). Segundo o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA), a Du Pont do Brasil S/A é uma empresa que atua na área de industrialização de defensivos agrícolas. Destarte, trata-se a Du Pont do Brasil S/A de uma fábrica de produtos químicos, especificamente, associados aos defensivos agrícolas (item constante no estatuto social da empresa).

8. Nos relatórios de fiscalização do trabalho, informam os auditores que, através de verificação física, entrevista com trabalhadores e prepostos, verificação do PPRA da Du Pont do Brasil S/A, exame dos contratos de prestação de serviços firmados entre a Du Pont do Brasil S/Ae a COOINSP, a Cegelec Ltda. e a Sólida Soluções Industriais Ltda., foi constatado que as tarefas exercidas pelos trabalhadores contratados pela Du Pont do Brasil S/A através das intermediadoras supracitadas eram inquestionavelmente constituintes da atividade-fim da demandada. Os trabalhadores entrevistados realizavam diversas atividades produtivas no bojo do processo de produção da Du Pont do Brasil S/A, tarefas essas essenciais e que constituem condição necessária para consecução dos produtos finais da empresa ré, conforme será apresentado nestes autos.

9. O processo produtivo desenvolvido pela Du Pont do Brasil S/A é conhecido como processo contínuo. O processo contínuo difere do padrão clássico de processo de trabalho verificado no modelo taylorista-fordista nos seguintes aspectos: Não há uma linha de produção com montadores. Não ocorrem (com eventuais exceções) movimentos repetitivos, seja na produção direta, seja na operação de máquinas (com acionamento repetitivo, por exemplo). Não há, de modo geral, manipulação direta do produto em consecução.

10. Tal processo de produção tem como característica básica a ampla automação da produção, baseada na circulação e transformação das matérias--primas e insumos através dos equipamentos e instalações que constituem cada unidade da planta. Por isso, a produtividade da fábrica é basicamente corolário da produtividade obtida a partir do funcionamento e desempenho dos equipamentos e instalações. Assim, o cerne da intervenção humana é manter as instalações e equipamentos funcionando, e da melhor forma possível. Esse funcionamento depende de duas categorias de trabalhadores, com atribuições distintas, mas complementares, necessárias e essenciais para a produção química: os trabalhadores enquadrados na operação e aqueles classificados como da manutenção.

11. Sem dúvida, a operação e a manutenção são atividades distintas, contudo, em essência, num processo produtivo contínuo elas têm o mesmo objetivo, qual seja, manter a planta operando nas melhores condições através do perfeito funcionamento dos equipamentos e instalações. Os chamados operadores executam tarefas com o objetivo de garantir a qualidade do supracitado funcionamento, com o menor tempo possível de paralisação da produção (no caso da Du Pont do Brasil S/A, coletam amostras, coordenam carregamento/descarregamento de produto). É exatamente esse o objetivo dos

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trabalhadores considerados do setor de manutenção (caldeiraria, mecânica, solda, elétrica, instrumentação, pintura industrial, isolamento): garantir a qualidade da produção (mantendo equipamentos e instalações em perfeito funcionamento), com o menor tempo possível de paralisação (realizando as intervenções com o máximo de eficiência).

12. Todavia, a despeito da essencialidade e complementaridade das atividades, a Du Pont do Brasil S/A contrata diretamente os trabalhadores classificados como operadores (com exceção dos trabalhadores irregularmente contratados através da empresa interposta Sólida Soluções Industriais Ltda., infração essa objeto de outra autuação), e utiliza trabalhadores contratados através de empresas interpostas para a execução da manutenção. As atividades executadas por estes trabalhadores não se enquadram, em nenhuma hipótese, nas atividades meio de uma empresa, que são, conforme definição do Ministro do TST, Mauricio Godinho Delgado (2008, p. 442-443): "atividades periféricas à essência da dinâmica empresarial do tomador de serviços. São, ilustrativamente, as atividades referidas pela Lei n. 5.645, de 1970: 'transporte, conservação, custódia, operação de elevadores, limpeza e outras assemelhadas'. São também outras atividades meramente instrumentais, de estrito apoio logístico ao empreendimento (serviço de alimentação aos empregados do estabelecimento, etc.".

13. Ser essencial à dinâmica empresarial do tomador de serviços é exata-mente a definição da manutenção na produção de processo contínuo. A manutenção define a inserção da empresa no contexto econômico mais amplo. As atividades consideradas de manutenção são sistemáticas e perenes dentro do processo produtivo em análise (diferentemente da manutenção em outros setores econômicos). Mais importante, as atividades de manutenção são necessárias e essenciais no processo contínuo porque definem a produtividade da empresa: 1e) determinam a qualidade (por conseguinte, eficiência) do funcionamento dos equipamentos e instalações (além disso, uma vez que a manutenção não ocorra ou seja má efetuada, haverá geração de produto fora de especificação e imediata parada do processo produtivo); 2e) determinam o tempo que a produção para em cada intervenção (o chamado "tempo morto"), tempo esse que, para a produtividade da...

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