Ação civil pública - Declaração de nulidade de Constituição e funcionamento de sindicato - Dissolução de entidade sindical
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EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUÍZA FEDERAL DA VARA DO TRABALHO DE ITAPETININGA
O Ministério Público do Trabalho — Procuradoria Regional do Trabalho da 15â Região — Procuradoria do Trabalho no Município de Sorocaba, CNPJ n. 26.989.715/0046-04, situado na Rua Belarmino Moraes de Arruda, n. 120, Vila Jardini, CEP: 18044-080, Sorocaba-SP, pelo Procurador do Trabalho que a esta subscreve (a ser intimado pessoalmente nos autos no endereço supra, consoante o art. 18, inciso II, alínea h da Lei Complementar n. 75, de 20.5.1993), consubstanciado nosarts. 127e 129, incisos II e III, da Constituição da República, no art. 83, inciso IV, da Lei Complementar n. 75, de 20.5.1993, e arts. 12 e seguintes da Lei n. 7.347/85, vem, à presença de Vossa Excelência, propor a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA
em face do Sindicato dos Empregados Rurais de Itapetininga, Angatuba e Capela do Alto, inscrito no CNPJ sob o n. 58.977.380/0001-07, com sede na Rua Antonio Fogaça de Almeida, n. 683, Centro, Itapetininga/SP, CEP: 18201--100, pelos motivos de fato e de direito que passa a expor:
O Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itapetininga apresentou petição ao MPT, através da qual informava que o Sindicato réu seria uma entidade de
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fachada, permanecendo fechado a maior parte do tempo, não tutelando os interesses dos trabalhadores.
A petição foi recebida como pedido de mediação, sendo designada audiência (fl. 6).
Em audiência, fls. 15/16, não foi obtida uma composição amigável para o problema, sendo, então, determinado aos Sindicatos que procedessem a juntada de cópia integral de seus atos constitutivos, bem como balancetes e balanço patrimonial dos últimos cinco anos, com cópias do livro caixa do mesmo período, relação de todos os associados, com cópia do livro de registro de associados; cópia do edital de convocação de assembleia para aprovação de contas da diretoria dos últimos cinco anos; bem como cópia das carteiras de trabalho dos representantes de suas diretorias; por último cópia de toda a documentação referente à eleição das atuais administrações, ou seja, cópia de edital, lista de associados, lista de votantes, cópias de todos os acordos coletivos celebrados nos últimos cinco anos.
Pois bem, o Sindicato denunciante procedeu a juntada de todos os documentos requisitados (fl. 95).
Contudo, o mesmo não ocorreu com o Sindicato denunciado, o qual só procedeu a juntada de cópia da ata de posse da diretoria (fls. 54/55).
Através da petição de fls. 88/90, o Sindicato denunciante informou que o Sindicato denunciado teria publicado edital convocatório para a aprovação das contas do período de 2006 e 2007 (fl. 91).
Conforme despacho de fl. 96, foi designada audiência, requisitando-se a apresentação de documentos por parte do Sindicato réu.
Lamentavelmente, o Sindicato denunciado não compareceu à citada audiência, tampouco apresentou os documentos requisitados.
Diante disso, através do despacho de fl. 104, a mediação inicial foi convertida em procedimento preparatório em face do réu, agendando-se diligência na sede do mesmo.
No dia 28.8.2008, este Procurador esteve presente na sede do Sindicato denunciado, tendo colhido o depoimento de fl. 108, bem como deixado notificação para nova audiência, a qual seria realizada no dia 12.9.2008, contudo, mais uma vez o investigado não compareceu (fl. 109).
Do depoimento do Sr. Geermas Dolacruz Meira, fl. 108, constou:
que trabalha no Sindicato há cerca de 20 dias, como recepcionista, sua função é atender os trabalhadores que procuram o sindicato e encaminhá-los ao escritório do Dr. Wilson, situado na Rua Monsenhor Soares, n. 702, telefone (15) 3271-7012, o qual faz o atendimento dos
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trabalhadores; que o depoente só fica num cômodo da casa do sindicato, já que os demais cômodos ficam fechados com cadeado e o depoente nem sabe o que tem lá dentro; que na sala onde o depoente trabalha tem apenas três cadeiras, uma mesa, uma escrivaninha e um banco de três lugares, também há um telefone; que o depoente não foi registrado, já que pretende ir para outra empresa; que da diretoria do sindicato, só conhece o Sr. José Máximo, presidente, e o Dr. Wilson que é o advogado.
Apesar de deixada notificação para nova audiência, fl. 107, mais uma vez o Sindicato réu não compareceu (fl. 109).
Em razão disso, foi proposta ação cautelar de exibição de documentos, feito n. 01286-2008-041-15-00-0, perante essa Vara do Trabalho, sendo determinado ao Sindicato réu que procedesse a juntada dos seguintes documentos:
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seus atos constitutivos e carta sindical;
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balancetes dos últimos cinco anos;
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balanço patrimonial dos últimos cinco anos;
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livro caixa dos últimos cinco anos;
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relação de todos os associados;
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livro de registro de associados;
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edital de convocação de assembleia para aprovação de contas da diretoria dos últimos cinco anos;
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CTPS de todos os integrantes de sua diretoria;
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toda a documentação referente à eleição da atual administração, ou seja, edital, lista de associados, lista de votantes;
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todos os acordos coletivos celebrados nos últimos cinco anos;
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informar onde possuiu ou possui conta bancária, juntando os extratos respectivos dos últimos cinco anos;
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livro de atas de reunião da diretoria;
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livro de atas de assembleias gerais;
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livro de atas do conselho fiscal;
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contrato de locação de sua sede;
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relação dos atuais componentes da administração do sindicato;
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declarações de IRPJ dos últimos 5 (cinco) anos.
Mais uma vez o Sindicato réu não cumpriu a determinação de uma autoridade, no caso, do Poder Judiciário, e não procedeu a juntada de documentos, cuja elaboração, guarda e apresentação aos órgãos públicos é determinada por lei.
De todo o exposto, percebe-se que o Sindicato denunciante não respeita o ordenamento jurídico do país, na medida em que descumpre, de forma reiterada, as notificações para apresentação de documentos.
Sendo assim, não restou outra alternativa ao Parquet, a não ser o ajuizamento da presente demanda.
É inquestionável que o art. 82, I, da Constituição da República proíbe a interferência e a intervenção na organização sindical. Contudo, a liberdade de criação e funcionamento das organizações sindicais não é tão ampla como pode fazer crer uma leitura mais descompromissada do referido texto constitucional. Isso porque, a autonomia da entidade sindical não pode jamais significar soberania, pois limitada pelo direito dos indivíduos e dos demais grupos sociais, incumbindo ao Estado velar pelo respeito a esse direito.
Nesse diapasão, a condição de o réu ser uma entidade sindical não o exclui do controle do Poder Judiciário, sendo perfeitamente cabível o controle da legalidade dos atos praticados pelo mesmo. Desse modo, não se pode excluir do Poder Judiciário a apreciação da lesão ou ameaça a direito, possuindo competência, destarte, para decidir sobre a regularidade das eleições sindicais. Ademais, tal competência é prevista expressamente no inciso III do art. 114 da Constituição da República ao dispor competir à Justiça
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do Trabalho processar e julgar as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores.
Na opinião abalizada de Mozart Victor Russomano1, mesmo no mais puro regime democrático, o Estado tem o direito (e o dever, inclusive) de exercer vigilância sobre o comportamento dos sindicatos, em defesa de suas próprias finalidades sociais. Desse modo, quando o sindicato descumprir os fins legais e estatutários que o justificam, não há como negar ao Estado competência para intervir na vida sindical, a fim de normalizar seu funcionamento e ajustá-lo ao fiel desempenho de sua missão histórica.
E conclui o mestre:2
"O art. 82, capute inciso I, declara que o Estado está proibido de intervir, por qualquer forma, na vida sindical. É de se entender essa norma, entretanto, como vedação — e o final do inciso I apoia esse entendimento — de ingerência do Poder Público na organização sindical ou no funcionamento da entidade de classe. Não pode o preceito constitucional significar, obviamente, que o sindicato se subtraia às regras legais que sejam adotadas para discipliná-lo, as quais, entretanto, não poderão ferir sua legítima autonomia. E, além disso, não há como excluir a possibilidade de medidas judiciais que reprimam vícios e erros das administrações dos sindicatos." (grifos nossos)
Trazemos à colação esses ensinamentos para reforçar que o Poder Judiciário não somente pode, como deve, enquanto não houver liberdade sindical no sentido individualístico, ou seja, enquanto houver a unicidade sindical, interferir sobre a estrutura organizativa das entidades sindicais para lhes exigir observância aos pressupostos do regime democrático, da legalidade e da legitimidade. Toda liberdade tem limites e não há justificativas para liberdade sindical ser absoluta e ilimitada.
Em suma, o poder público não poderá intervir ou interferir na organização (entidade) sindical, via ato administrativo, contudo, poderá reprimir vícios e erros das administrações das organizações sindicais através de medidas judiciais, principalmente para submetê-las aos pressupostos do regime democrático, da legitimidade e da legalidade, como qualquer entidade de direito privado, bem como para resguardar a liberdade individual dos integrantes da categoria.
Para Cristiane Rozicki3, a única exigência que é feita à autonomia interna das associações sindicais é o seu necessário ajustamento aos princípios de
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organização e gestão democrática. Em razão...
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