A Composição do Litígio Via Acordo Judicial no Processo Previdenciário

AutorFernando Rubin
CargoMestre em Processo Civil (UFRGS)
Páginas6-10

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I Introdução

A o compulsarmos as hi-póteses de extinção do feito com julgamento de mérito, nos termos do art. 269 do Código do Processo Civil (CPC), temos que, fora da normal opção pelo julgamento propriamente dito1, ressai com superior importância a hipótese de reconhe-cimento da prescrição/decadência2 e a hipótese de composição do li-tígio via acordo judicial - cenário do nosso especial interesse nesta passagem em que sublinhadas as peculiaridades da sua incidência no processo previdenciário.

II Da disciplina do art. 269, III, articulado com o art. 475-N, III, ambos do Código Buzaid

O art. 269 do CPC disciplina as hipóteses de extinção do feito com julgamento de mérito. Trata-se dos casos de prolação de senten-ça deinitiva, que impedem exame posterior do Poder Judiciário em eventual ulterior lide (incidência da coisa julgada material), sujeitos ainda à possibilidade de ação rescisória, no prazo de dois anos do trânsito (após o qual se opera a coisa julgada soberanamente mate-rial). Diferenciam-se das hipóteses de extinção do feito sem julgamento de mérito, constantes no art. 267 do CPC3 - cenário das sentenças terminativas, sobre as quais só se opera o fenômeno da preclusão4.

Vê-se da comparação do art. 269 com o art. 267 que são maio-res as hipóteses de extinção do feito sem julgamento de mérito, autorizando o sistema à parte demandante que, superado eventual vício - como no indeferimento da petição inicial, na negligência no impulsionamento do feito, ou na ausência de condição da ação -, possa ser reajuizada a ação, sendo superada a preliminar de mérito5.

As hipóteses do art. 269 se limi-tam a cinco: I - acolhimento ou rejeição do pedido do autor pelo juiz; II - reconhecimento da procedência do pedido pelo réu; III - transação entre as partes; IV - pronunciamento da decadência ou prescrição; V - renúncia pelo autor do direito sobre o qual se funda a ação.

O objeto do nosso estudo - o inciso III - apresenta redação um tanto quanto restritiva, já que menciona tão somente o conceito de "transação". Na verdade, a extinção do feito com julgamento de mérito, envolve tanto a transação quando a conciliação6.

A primeira é de iniciativa exclusiva das partes, levada ao juízo para homologação; a segunda conta com participação direta do Esta-do-juiz. A primeira geralmente se dá com a formalização de petição conjunta entre os procuradores, que acertam determinados termos para pôr imediato im ao litígio e levam ao conhecimento do juízo para que homologue o acordo ir-mado; a segunda geralmente se dá em audiência, quando o Estado-juiz acompanha a formalização do acordo, e até interfere, para que se extinga da melhor forma possível

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ali o feito, razão pela qual não há necessidade de posterior homologação - assinando o magistrado, junto com os procuradores e as partes envolvidas, a ata da audiência de conciliação. Assim, transação e conciliação são espécies do gênero acordo judicial, sendo que em ambas as circunstâncias opera-se a extinção do feito forte no art. 269, III, do CPC.

O art. 475-N, III, do CPC é, por sua vez, mais claro ao tratar da conciliação e transação como hipóteses de extinção do feito que resultam em formação de um título executivo judicial7.

O importante dispositivo infraconstitucional diz mais: o acordo firmado pela conciliação ou transação é título executivo, ainda que inclua matéria não posta em juízo.

De fato, a central característica dos acordos judiciais é poder envolver matéria fora dos limites da causa de pedir e pedido, sendo que muitas vezes a união de interesses das partes litigantes só se dá se outras questões, não tratadas no processo até então, possam ser desde já formalizadas e decididas8.

Não deixa de ser esta uma importante válvula de escape do sistema processual pátrio, em que a exposição dos fatos jurídicos no feito é fundamental, sendo que há limites rígidos para alteração da causa de pedir e pedido até o saneamento da demanda para que o juízo possa proferir sentença nos limites postos (âmbito de aplicação da teoria da substanciação), mas há a possibilidade de ser formatado acordo entre os litigantes, sujeitos ao controle do Estadojuiz, em que eventualmente possa ser resolvida toda a relação jurídica que os enlaça, mesmo que não conste originariamente na causa de pedir e pedido todos esses contornos (âmbito de aplicação da teoria da individuação).

Portanto, a impossibilidade de o juízo proferir sentença ultra ou extra petita circunscreve-se ao cenário previsto no art. 269, I, do CPC, já que sendo formalizado acordo, com homologação judicial, nos termos do estudado art. 269, III, do CPC, pode ser extinto o feito em que abrangidas matérias não tratadas diretamente na lide. Esse aspecto processual realmente é relevante, razão pela qual insistimos: embora o princípio dispositivo9 em sentido próprio ou material determine que o juiz não possa julgar a lide fora dos parâmetros expressos propostos pelas partes na fase postulatória (a fim de que conserve a sua imparcialidade), não há qualquer impedimento para que o magistrado possa homologar transação ou mesmo conciliação, ainda que inclua matéria não posta em juízo.

III Da possibilidade de conciliação ao longo da instrução no processo previdenciário

As linhas acima seguramente valem para todos os processos em geral, sendo muito comum, aliás, conciliação em feitos trabalhistas, com o propósito de serem pagas as específicas parcelas laborais discutidas na lide, como também outras que ali não foram tratadas, sendo ainda dada quitação, mais ampla, do contrato de trabalho, com baixa, feita em secretaria, na carteira de trabalho e previdência social - CTPS10.

Da mesma forma, podem se realizados acordos em processos previdenciários, sendo que pelas suas peculiaridades (rectius: complexidade) vem sendo formalizados tão somente perante juízo competente, em audiência de conciliação.

Realmente, em processos previdenciários, há uma série de detalhes que precisam ser ajustados, muitas vezes com a participação direta do juízo, o que inibe a formalização da transação, mais afeita mesmo ao campo civil.

Ocorre que pode se operar na lide previdenciária discussão também sobre pontos acessórios, como a data do início do benefício (DIB) e data do início de pagamento (DIP), ainda mais quando deve ser concedido benefício a...

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