Ato Jurídico Trabalhista

AutorEvaristo de Moraes Filho - Antonio Carlos Flores de Moraes
Ocupação do AutorProfessor Emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro - Professor do Departamento de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
Páginas172-185

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1. Conceito e elementos constitutivos - O parágrafo único do art. da CLT determina que o direito comum será fonte subsidiária do direito do trabalho, naquilo em que não for incompatível com os princípios fundamentais deste.

Tal dispositivo nos permite lançar mão do Código Civil, que em sua versão de 2002 divide o Livro III da Parte Geral "Dos Fatos Jurídicos" em quatro títulos, titulados como "Do Negócio Jurídico", "Dos Atos Jurídicos Lícitos", "Dos Atos Ilícitos" e "Da Prescrição e da Decadência".

Quanto aos atos jurídicos, o art. 185 do Código Civil considerou que aos "lícitos, que não sejam negócios jurídicos, aplicam-se, no quer couber, as disposições do Título anterior". Esse artigo corresponde ao art. 81 do Código de 1916, que dispunha: "todo ato lícito que tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar ou extinguir direitos se denomina ato jurídico".

No que se refere à validade do negócio jurídico, o art. 104 do Código aprovado em 2002 elenca os elementos necessários, in verbis:

Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:

I - agente capaz;

II - objeto lícito, possível, determinado ou deter-minável;

III - forma prescrita ou não defesa em lei.

A partir desses princípios apresentados no Título I do Livro III da Parte Geral do Código Civil, cada elemento constitutivo do negócio jurídico trabalhista há de ser avaliado de acordo com a óptica do direito do trabalho, uma vez que possui ele suas próprias regras fundamentais.

2. Agente capaz - Por ter como característica básica a vontade do agente, a capacidade deste é essencial para a validade do ato jurídico.

No direito comum, o art. 3º do Código Civil classifica as hipóteses dos absolutamente incapazes; enquanto o art. 4º, dos relativamente incapazes. Dos sete casos elencados, dois hão de sofrer o crivo do intérprete trabalhista, pois as suas normas diferem das do Direito Comum. Trata-se dos menores de 16 anos e daqueles maiores dessa idade e menores de 18 anos, citados, respectivamente, nos arts. 3º, inciso I, e 4º, inciso I, do Código Civil.

No direito do trabalho, os maiores de 16 e menores de 18 anos, embora não tenham plena capacidade para contratar, podem obter a sua Carteira de Trabalho e Previdência Social e, assim, habilitar-se ao trabalho. Quanto aos maiores de 18 anos, são totalmente capazes perante a nova legislação civil e há muito na trabalhista.

A legislação pátria, todavia, ao garantir o trabalho ao menor de 18 anos, impôs-lhe uma série de normas restritivas, visando a protegê-lo.

A Emenda Constitucional n. 20 de 1998 alterou o limite de idade de trabalho, fixando-o em 16 anos, salvo na condição de aprendiz a partir de 14. O Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei n. 8.069, de 13.7.1990, adaptado às novas normas constitucionais, proibiu de qualquer trabalho os menores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz (art. 60), e assegurou:

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I - bolsa de aprendizagem ao adolescente até 16 anos de idade (art. 64);

II - os direitos trabalhistas e previdenciários ao adolescente aprendiz, maior de 16 anos (art. 65).

Assim, o trabalho desenvolvido pelo menor de 16 anos somente é possível, nos termos do art. 428 da CLT, conforme redação dada pela Lei n. 11.180, de 23.9.2005, mediante um contrato especial, inscrito em programa de aprendizagem, formação técnico-profissional metódica, compatível com o seu desenvolvimento físico, moral e psicológico. Essa formação técnico-profissional a que se refere o caput do art. 428 da CLT caracteriza-se por atividades teóricas e práticas, metodicamente organizadas em tarefas de complexidade progressiva desenvolvidas no ambiente de trabalho.

Assim, tanto o aprendiz, a partir de 14 (quatorze) anos, como o menor de 18 (dezoito) anos, não sujeito à formação profissional metódica de ofício ou ocupação, celebram com o seu empregador um verdadeiro contrato de trabalho.

O art. 417 da CLT continua em pleno vigor e estabelece uma série de documentos a serem apresentados pelo menor de 18 (dezoito) anos para obter a sua carteira de trabalho, entre os quais:

  1. Certidão de idade ou documento legal que a substitua;

  2. Autorização do pai, mãe ou responsável legal;

  3. Autorização do Juiz de Menores, nos casos dos arts. 405, § 2º e 406;

  4. Atestado médico de capacidade física e mental;

  5. Atestado de vacinação;

  6. Prova de saber ler, escrever e contar;

  7. Duas fotografias de frente, com as dimensões de 0,04 m x 0,03 m.

Tais documentos serão fornecidos gratuitamente, e no caso de não apresentação do citado documento oficial, o responsável fornecerá a qualificação do menor de 18 (dezoito) anos (art. 17, § 1º, CLT).

Uma vez obtida a carteira profissional, o menor de 18 anos estará habilitado a trabalhar, embora a sua capacidade de contratar não seja plena, considerando que:

  1. há restrição de trabalho em locais perigosos, insalubres ou prejudiciais à sua moralidade (art. 405 da CLT);

  2. exige-se, ainda, autorização do juiz de menores, nos serviços prestados em teatros de revista, cinemas, boates, cassinos, cabarés, dancings e estabelecimentos análogos, além dos trabalhos em circos, nas funções de acrobata, saltimbanco, ginasta e outros semelhantes (art. 405, § 3º a e b, combinado com o art. 406 da CLT);

  3. o responsável pelo adolescente poderá extinguir o contrato, desde que o serviço possa acarretar para ele prejuízos de ordem física ou moral (art. 408 da CLT), bem como deve afastá-lo de empregos que diminuam consideravelmente o seu tempo de estudo, reduzam o tempo de repouso necessário à sua saúde e constituição física ou prejudiquem a sua educação moral (art. 424 da CLT).

Durante a vigência do contrato, a legislação pátria considera lícito ao adolescente firmar recibo pelo pagamento dos salários. O mesmo art. 439, consolidado, veda-o de assinar a rescisão do contrato de trabalho sem assistência de seu responsável.

Contra o menor de 18 anos, não corre nenhum prazo de prescrição, nos termos do art. 440 da CLT.

Com relação ao maior de 18 e menor de 21 anos, há muito inexiste qualquer restrição legal para trabalhar, a partir do momento em que o art. 446 da CLT foi revogado pela Lei n. 7.855, de 24.10.1989. O citado artigo, apesar de admitir a presunção de o jovem adulto nessa faixa etária estar autorizado a trabalhar por seu pai ou responsável, autorizava este, por seu turno, a pleitear a rescisão contratual quando ficasse manifesto o prejuízo de sua ordem física ou moral. Com a redação dada ao art. 5º do Código Civil de 2002, inexiste qualquer contradição entre o direito comum e o trabalhista, sendo perfeitamente possível o maior de 18 e o menor de 21 anos exercerem o direito de voto, bem como investirem-se em cargo de administração ou representação econômica ou profissional (art. 529, b, da CLT).

No que se refere à mulher casada, o art. 226, § 5º, da Constituição Federal, considera, a partir de 1988, que "os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher". Na esfera trabalhista, há muito a mulher casada não sofria qualquer restrição quanto à sua capacidade jurídica. O art. 792 consolidado reconheceu, inclusive, o seu direito de pleitear perante a Justiça do Trabalho sem assistência do marido.

Finalmente, o trabalho é garantido ao estrangeiro, nos termos do art. 5º da Constituição Federal. O inciso XIII do citado artigo garante igualmente aos

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brasileiros e estrangeiros residentes no País "o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer".

Em edições anteriores, apresentamos como exemplos de restrições contidas na Constituição Federal, no que se refere a atividades e ofícios, o § 1º do art. 176, os §§ 1º e 2º do art. 178 e o art. 222 e seu § 1º. Acontece que as Emendas Constitucionais n. 6 e 7, ambas de 15.8.1995, alteraram os arts. 176 e 178, aumentando, ainda mais, o grau de mundialização, como diriam os franceses, ou globalização, como diriam os americanos, do Brasil.

Assim, o § 1º do art. 176 passou a ter a seguinte redação:

A pesquisa e a lavra de recursos minerais e o aproveitamento dos potenciais a que se refere o caput deste artigo somente poderão ser efetuados mediante autorização ou concessão da União, no interesse nacional, por brasileiros ou empresa constituída sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e administração no País, na forma da lei, que estabelecerá as condições específicas quando essas atividades se desenvolverem em faixa de fronteira ou terras indígenas.

Por sua vez, o art. 178 teve nova redação dada ao seu caput e ao seu parágrafo, que passou a ser único, in verbis:

Art. 178. A lei disporá sobre a ordenação dos transportes aéreo, aquático e terrestre, devendo, quanto à ordenação do transporte internacional, observar os acordos firmados pela União, atendido o princípio da reciprocidade.

Parágrafo único. Na ordenação do transporte aquático, a lei estabelecerá as condições em que o transporte de mercadorias na cabotagem e a navegação interior poderão ser feitos por embarcações estrangeiras.

O art. 222 foi alterado pela Emenda Constitucional n. 36, de 28 de maio de 2002, passando a ser possível a participação de estrangeiro em até trinta por cento (30%) no capital votante das empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e imagens. Os outros setenta por cento (70%) deverão pertencer a brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, ou de pessoas jurídicas constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sede no País.

De qualquer forma, nas atividades que lhes são permitidas, o empregador há de exigir a apresentação da Carteira de Trabalho e Previdência Social, uma vez que essa demonstrará, inequivocamente, a regularização do estrangeiro no País. É o que se depreende do disposto no inciso IV do art. 16 da CLT, que exige, na citada carteira, a inclusão do decreto de naturalização ou documento de identidade de estrangeiro, fornecido pelo Ministério da Justiça. Os demais aspectos do trabalho do estrangeiro...

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