Tutelas Provisórias na Lei 13.105/15 - Novo Código de Processo Civil

AutorCarlos Alberto Del Papa Rossi
Páginas6-17

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Neste rápido ensaio, sem a pretensão de esgotar o tema, abordamos vários aspectos das tutelas de urgência trazidas pela Lei
13.105/15 – novo Código de Processo Civil. Na medida do possível, e até mesmo por motivos didáticos, tentamos traçar paralelos com as medidas cautelares e a tutela antecipada do Código de 1973, inclusive citando posicionamentos jurisprudenciais, e sempre ressaltando a necessidade de a legislação processual não se distanciar da garantia constitucional de que nenhuma lei pode, não importa a que pretexto, amesquinhar o direito de acesso à efetiva prestação da tutela jurisdicional.

Introdução

É notório que o Poder Judiciário está mais do que sobrecarregado, o que acaba por impor aos magistrados precárias condições de trabalho diante de excessivo volume. Essa sobrecarga, decorrente da grande quantidade de processos em andamento somados aos que são diariamente iniciados, leva, de modo inevitável, à morosidade da prestação jurisdicional. Isto, lamentavelmente, beneficia não apenas os maus pagadores, mas todas as pessoas que, mesmo cientes de que determinadas condutas são ilícitas, infringem a lei e não respeitam direitos alheios.

Salvo as excepcionalíssimas situações em que se admite a defesa de um direito pelas próprias mãos1, e até com o uso de força bruta, o ordenamento jurídico exige que os conflitos de interesses sejam dirimidos pacificamente. O ideal seria que as pessoas se conduzissem de maneira natural conforme o legal-mente regrado. Entretanto, apesar de normas jurídicas disciplinarem como um homem deve se comportar perante os demais, inúmeros e frequentes são os casos de inobservância.

Uma vez ameaçado ou lesado um direito, e não sendo umas das raras situações em que se admite a autotutela, deve o seu titular buscar amparo perante o Estado, a quem incumbe a aplicação do direito aos casos que lhe são apresentados, valendo lembrar que há, conforme o caso, a possibilidade de se optar pela arbitragem.

Dentre a vasta gama de normas jurídicas que integram o direito, uma parte delas regula a atividade do Estado – jurisdição – destinada à composição dos conflitos de interesses que frequentemente surgem no seio da sociedade.

Pode-se dizer, assim, que processo é o instrumento disponibilizado pelo ordenamento jurídico através do qual o Estado (terceiro imparcial e sem interesse), uma vez provocado, aplica o direito ao caso concreto, observando uma sequência de atos legalmente regrados2.

Exercido o direito de ação pelo autor, o Estado instaura o processo, e no seu curso vários atos devem ser praticados pelas partes, pelos órgãos jurisdicionais e por terceiros – tais como escrivães, peritos, assistentes técnicos, contadores etc.

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Todos esses atos têm como finali-dade exclusiva a prestação da tutela jurisdicional.

O processo, como instrumento de atuação do Estado na entrega da prestação jurisdicional, se desenvolve seguindo um determinado procedimento. Há todo um percurso desde o início da atividade jurisdicional até o seu fim, estando ele devida e legalmente disciplinado – devido processo constitucional e legal.

É certo que nesse caminhar do processo decorre tempo geralmente bastante longo, pois o modelo constitucional e legalmente disciplinado deve observar inúmeras regras e princípios relacionados ao contraditório, ampla defesa, juiz natural, publicidade dos atos processuais, duplo grau de jurisdição etc. É indiscutível, por assim dizer, que a prestação da tutela jurisdicional de caráter definitivo com vista a atender a segurança jurídica exige tempo.

Tendo o direito por objetivo viabilizar as relações entre os legislados, necessário é que o Estado tenha meios e condições de prestar a tutela jurisdicional de modo a não permitir o perecimento do direito ameaçado, coibindo e desestimulando comportamentos vedados pelo ordenamento jurídico. São indispensáveis, portanto, regras que permitam ao Estado, mesmo antes do término do processo judicial (cognição exauriente – definitiva), tutelar direitos de forma antecipada, evitando que o livre acesso à justiça seja visto como o singelo direito de provocar um poder estéril, o que acabaria por levar muitos a acreditarem que é mais eficiente a justiça pelas próprias mãos.

Mostra-se imprescindível a regulação da prestação da tutela jurisdicional de modo a obstar que a morosidade do processo prejudique o direito que a parte pretende ver tutelado quando sua pretensão estiver escorada em argumentos e provas que demonstrem sua plausibilidade.

Neste rápido trabalho, sem nenhuma pretensão de esgotar o assunto, faremos a análise das chamadas “tutelas provisórias” disciplinadas pela Lei 13.105/2015 (novo Código de Processo Civil), e na medida do possível, ainda que para fins exclusivamente didáticos, abordaremos alguns pontos da tutela antecipada e das medidas cautelares tal como reguladas pelo Código de Processo Civil de 1973.

1. Embasamento constitucional das tutelas provisórias

Entre as finalidades que justificaram a composição de uma assembleia para inaugurar o sistema positivado e constituir a República Federativa do Brasil está a garantia de acesso à Justiça.

Assegurando a distribuição da efetiva justiça, a Constituição Federal, no inciso XXXV, de seu artigo 5º, traz o basilar princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, preceituando, verbis:

Art. 5º, XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.

Dando maior ênfase a tal preceito, a EC 45/2004 inseriu o inciso LXXVIII no art. 5º, pelo qual, in verbis:

Art. 5º, LXXVIII – a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

A garantia constitucional de livre acesso ao Poder Judiciário não pode ser entendida como a mera faculdade de se provocar o órgão jurisdicional competente a se manifestar sobre um determinado direito, mas sim como a garantia de se obter do Estado a efetiva distribuição da justiça. A Constituição Federal assegura aos súditos o direito de provocarem o Poder Judiciário para que entregue o bem da vida a quem de direito em tempo hábil, a não se traduzir como mera liberdade de acesso a uma justiça inútil.

Em artigo publicado na Revista Consulex, o ministro Nilson Naves destacou queexiste um aspecto importante a considerar: o verdadeiro sentido do acesso à Justiça não está apenas na entrada; está, sobretudo, na saída dela. Com efeito, a questão do acesso aponta para o direito à efetiva tutela jurisdicional. Fica claro que de nenhuma utilidade seria o acesso se dele não resultasse pronta decisão. Na verdade, muitas medidas, se não concedidas com presteza, isto é, se concedidas tardiamente, serão inúteis”3.

Provocado, o Poder Judiciário deve pronunciar-se dizendo o direito, solucionando o conflito que lhe foi apresentado e entregando a efetiva justiça.

Tendo em vista que em muitos casos o titular do direito lesado ou ameaçado não pode aguardar o final do processo (cognição exauriente), que em regra é extremamente lento4, nosso ordenamento positivado deve disciplinar institutos processuais que tenham o condão de garantir a efetividade do direito.

Feitas estas rápidas considerações, começaremos a tratar das tutelas provisórias disciplinadas pelo novo Código de Processo Civil – Lei
13.105/15.

2. Tutelas provisórias - disposições gerais
2. 1 Espécies

De início, convém destacar que a Lei 13.105/15 (NCPC) deixa de tratar do “processo cautelar” tal como previsto no Código de Processo Civil de 1973 (livro III), surgindo as chamadas “tutelas provisórias” (livro V).

As tutelas provisórias foram pre-vistas em duas espécies, sendo elas as “de urgência” e as “de evidência” (art. 294). As primeiras exigem a de-

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monstração da verossimilhança (não de certeza) do direito afirmado e a urgência de sua proteção, enquanto as segundas dependem apenas do convencimento quanto à plausibili-dade.

As tutelas provisórias de urgência foram divididas em cautelares e antecipadas, que sempre terão por finalidade afastar “o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo” (art. 300, NCPC). Em qualquer dos casos de tutela de urgência, o que se busca proteger é o direito verossímil de que o autor alega ser titular. A distinção entre uma e outra está no fato de que a tutela cautelar visa assegurar o direito...

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