Tensionamentos sociais e justiça de transição: Contribuições ao Constitucionalismo Latino-Americano

AutorRoberta Camineiro Baggio
CargoProfessora adjunta da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, doutora em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina e conselheira da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça
Páginas627-661
R N E J - E, V. 19 - . 2 - - 2014
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Resumo: Partindo da ideia de que os tensionamentos sociais
podem estabelecer importantes zonas de tensões institucionais
capazes de despertar e aprofundar práticas legitimadas pelos
textos constitucionais, o presente artigo objetiva caracterizar a
justiça de transição como um campo de tensionamento que tem
se revelado extremamente importante para o aperfeiçoamento
das democracias latino-americanas.
Palavras-chave: Tensionamentos Sociais. Justiça de Transição.
Constitucionalismo Latino-Americano.
TENSIONAMENTOS SOCIAIS
E JUSTIÇA DE TRANSIÇÃO:
CONTRIBUIÇÕES AO
CONSTITUCIONALISMO
LATINO-AMERICANO
SOCIAL TENSIONS AND TRANSITIONAL JUSTICE: CONTRIBUTIONS TO LATIN
AMERICAN CONSTITUTIONALISM
TENSIONAMIENTOS SOCIALES Y JUSTICIA DE TRANSICIÓN: CONTRIBUCIONES AL
CONSTITUCIONALISMO LATINOAMERICANO
Roberta Camineiro Baggio1
1 Professora adjunta da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
doutora em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina e conselheira da Comissão
de Anistia do Ministério da Justiça. E-mail: robertabaggio@uol.com.br.
D : www.univali.br/periodicos
D: 10.14210/nej.v19n2.p627-661
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Abstract: Starting from the idea that social tensions may provide
important areas of institutional tensions able to awaken and
deepen practices legitimized by constitutional texts, this study
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has turned out to be extremely important for the improvement
of Latin American democracies.
Keywords: Social Tensions. Transitional Justice. Latin American
Constitutionalism.
Resumen: Partiendo de la idea de que los tensionamientos
sociales pueden establecer importantes zonas de tensiones
institucionales capaces de despertar y profundizar prácticas
legitimadas por los textos constitucionales, el presente artículo
se propone caracterizar la justicia de transición como un
campo de tensionamiento que se ha revelado extremadamente
importante para el perfeccionamiento de las democracias
latinoamericanas.
Palabras clave: Tensionamientos Sociales. Justicia de
Transición. Constitucionalismo Latinoamericano.
INTRODUÇÃO
Entre as décadas de 1960 e 1990 diversos países da América Latina
vivenciaram experiências de regimes políticos de exceção, seja pela
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As transições desses regimes foram marcadas, sob o ponto de vista jurídico, por
processos de reconstitucionalização que englobam tanto a restauração dos textos
constitucionais anteriores – incluindo as reformas sofridas a posteriori –, como a
instituição de novas constituições por meio de Assembleias Constituintes.
O simples advento da implementação de novos textos constitucionais ou
a tentativa de retomada da legitimidade daqueles que foram ignorados pelos
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regimes de exceção, no entanto, não constituem causas imediatas de garantias de
direitos ou medidas automáticas de uma ampla produção de efeitos normativos,
sobretudo, na retomada das bases do Estado Constitucional de Direito. E,
nesses contextos, o modus operandi das transições políticas é decisivo para a
consolidação de condições políticas e jurídicas que favoreçam a efetivação dos
textos constitucionais. Tais condições passam necessariamente pela construção
social de estratégias de tensionamento que se imponham aos diversos âmbitos
institucionais em reformulação.
A forma como, por exemplo, a Argentina conduziu seu processo de transição
política tanto por meio dos grupos sociais vinculados ao debate da defesa
dos direitos humanos mobilizados em torno das questões transicionais como
institucionalmente, com ênfase na busca pela memória e verdade sobre as violações
aos direitos humanos ocorridas durante o período do Estado de exceção e a posterior
construção de possibilidades jurídicas de responsabilização dos agentes estatais,
impulsionou internamente um debate amplo sobre a necessidade de proteção
dos direitos humanos, que permitiu um avanço no campo da aplicabilidade
interna do direito internacional dos direitos humanos com a adoção pelo texto
constitucional, na reforma de 1994, do inciso 22 do art. 75, que reconheceu a
hierarquia constitucional de tratados e convenções internacionais no plano interno.
Esse processo não ocorreu sem resistências ou grandes tensionamentos internos
tanto por parte da sociedade civil como em âmbito institucional e, é justamente a
existência dessas tensões, que permite ou até mesmo impõe a necessidade de que
o debate público acerca das demandas político-constitucionais seja enfrentado
no campo das disputas valorativas da sociedade2 e, também, nas instituições
constituídas como parte do poder estatal.
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reconhecimento indispensáveis para a formação de uma dinâmica de integração da socieda-
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versos desacordos morais se consolidam e as disputas valorativas determinam um campo de
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seriam fruto dessas disputas. Para uma leitura sobre uma concepção de justiça de transição
como reconhecimento conferir: BAGGIO, Roberta Camineiro. Justiça de transição como reco-
nhecimento: limites e possibilidades do processo brasileiro. In: Repressão e memória política
no contexto ibero brasileiro
Brasília, DF: Ministério da Justiça. Comissão de Anistia, 2010. p. 260-285.

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