Temas Conexos

AutorDeusmar José Rodrigues
Páginas289-335

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1. Direitos Humanos e Direitos Fundamentais

Direitos humanos são direitos inerentes à própria condição humana, que não se liga a particularidades de indivíduos ou grupos (Fábio Konder Comparato), garantindo ao ser humano o respeito, inclusive por parte do Estado, à sua vida, liberdade, igualdade, dignidade, bem como ao pleno desenvolvimento da sua personalidade1.

A doutrina jurídica germânica distingue os direitos humanos dos direitos fundamentais2.

Direitos humanos são os inatos, inerentes, imanentes a todo e qualquer ser humano, independentemente de tempo ou lugar.

Direitos fundamentais seriam os direitos humanos positivados pelas autoridades que detêm o poder de editar normas, sejam internas, como as Constituições e as leis infraconstitucionais, sejam normas internacionais, como os tratados internacionais.

Segundo Ingo Wolgang Sarlet, a doutrina separa os direitos naturais dos direitos humanos e dos direitos fundamentais.

- direitos naturais seriam os pré-estatais, fruto da doutrina jusnaturalista, que os concebia como inerentes ao ser humano;

- direitos humanos e os direitos fundamentais seriam aqueles já reconhecidos, mas que se diferem em dois aspectos: a) concreção positiva, em que aqueles seriam reconhecidos em documentos internacionais, enquanto estes,

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positivados em seus documentos nacionais3; b) grau de efetiva aplicação e proteção, em que os segundos atingem, em regra, maior grau, em virtude da existência de instâncias, principalmente as judiciárias, para os fazer respeitar e realizar.

Características: historicidade, universalidade, inalienabilidade, imprescritibilidade, irrenunciabilidade4, inviolabilidade, indivisibilidade, efetividade e complementaridade5.

Dimensões:
I) direitos de primeira dimensão: são os primeiros a constar dos instrumentos normativos constitucionais. São os direitos civis e políticos, que surgiram no século XVII. Representavam, na doutrina liberal, a emancipação do poder político das amarras do poder religioso e a emancipação do poder econômico dos indivíduos do jugo e do arbítrio do poder político. São direitos de liberdade, ou direitos negativos, ou liberdades públicas negativas, tendo por titular o indivíduo, sendo oponível ao Estado; v.g., direito de opinião e de expressão, à honra, à imagem, à integridade física e moral, à intimidade, à privacidade, direito de propriedade, liberdade de locomoção etc.;
II) direitos de segunda dimensão: dominam o século XX. A partir da Constituição de Weimar, passaram a dominar, inteiramente, as Constituições do segundo pós-guerra. Tais direitos referem-se às necessidades mínimas de sobrevivência do ser humano, para que possa viver dignamente. São direitos de crédito do indivíduo em relação à coletividade. Tais direitos – como ao trabalho, à saúde, à educação, à assistência e à previdência social etc. – têm como sujeito passivo o Estado, mas o titular desses direitos, no entanto, continua sendo, como nos direitos de primeira geração6, o homem na sua individualidade. Daí a complementaridade entre os direitos de primeira e segunda gerações;

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III) direitos de terceira dimensão: a divisão do mundo em nações desenvolvidas e subdesenvolvidas levou à busca de uma terceira geração de direitos, que vêm se afirmando desde o final do século XX e início do século XXI, os direitos de fraternidade, que não compreendem somente os direitos individuais ou coletivos, mas se destinam a proteger os interesses do gênero humano, pois são dotados de alto teor de humanismo e de universalidade. Têm como titular não o indivíduo na sua singularidade, mas sim grupos humanos, como a família, o povo, a nação, coletividade regionais ou étnicas e a própria humanidade. São direitos de titularidade coletiva; v.g.: direito ao desenvolvimento, à paz, o direito ao meio ambiente, o direito de propriedade sobre o patrimônio comum da humanidade, o direito de comunicação, o direito de autodeterminação dos povos, o direito à qualidade de vida...;
IV) outras dimensões: os de quarta dimensão não têm uma classificação uniforme, sendo que há autores que não os consideram, classificando os direitos humanos em três gerações. Segundo Paulo Bonavides, são dessa geração o direito à democracia, à informação e do direito ao pluralismo. Seria, necessariamente, a democracia direta, sustentada pela informação correta (sem as contaminações da mídia manipuladora) e o pluralismo do sistema (sem monopólio do poder).

Francisco Vieira Lima Neto diz que a quarta geração de direitos humanos somente é possível porque as inovações tecnológicas criariam para a humanidade problemas de ordem tal que o direito, forçosamente, sob pena de alteração e deterioração do genoma humano, se veria instado a apresentar soluções, propondo limites e regulamentos às pesquisas e uso de dados com vistas à preservação do patrimônio genético da espécie humana. Com isso, o direito estaria protegendo não só o homem enquanto indivíduo, mas também, e principalmente, como membro de uma espécie. Entre os possíveis direitos típicos da quarta geração de direitos humanos, estaria o de não ter seu patrimônio genético alterado.

A quarta geração de direitos é caracterizada pela pesquisa biológica e científica, pela defesa do patrimônio genético, pelo avanço tecnológico, pelo direito à democracia, à informação e ao pluralismo (clonagem, células-tronco, biossegurança etc.). E por tratar de princípios tão valiosos como a vida, é necessário ainda enfocar a questão da ética e da moralidade.

A quinta geração de direitos é defendida apenas por alguns autores, que tentam justificar os avanços tecnológicos, como as questões da internet, conforme vaticina Lorena Pretti.

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Resumidamente, pode-se dizer que a quarta geração são os direitos de manipulação genética, da biotecnologia, da bioengenharia, que envolvem o debate sobre a bioética. Enquanto os de quinta geração são os direitos da realidade virtual, da informática e da internet e cibernética, na formulação de Douglas Domingos.

O legislador constituinte quis dar ênfase ao tema dos direitos humanos e, principalmente quanto aos direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais (DESCA), estabeleceu diversos dispositivos que os preveem.

Há o entendimento de que, hoje, a expressão mais correta para se referir aos direitos sociais, em sentido amplo, não seria mais DESC, mas DESCA, pois tais direitos englobariam também os direitos ambientais.

Podemos dividir o DESCA em:
I) Direitos Econômicos: - direito ao trabalho;
direito à alimentação; - direito à moradia;
direitos trabalhistas;
II) Direitos Sociais:
direito à segurança social;
direitos das famílias;
direito das mães;
direitos das crianças e dos adolescentes; - direitos dos idosos;
direito à saúde física e mental;
III) Direitos Culturais:
direito a participar da vida cultural e do progresso científico; - direito das minorias;
IV) Direitos Ambientais:
direito a um ambiente de vida saudável;
direito a um meio ambiente do trabalho saudável.

1.1. Distinção Entre Direitos Humanos e Fundamentais

Doutrinadores há que não fazem distinção entre direitos humanos e direitos fundamentais, tomando os institutos como equivalentes ou fungíveis.

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Outra forte vertente faz a distinção. Para tanto, parte ela dos seguintes critérios:
I) o critério formal diz que direitos fundamentais seriam aqueles previstos na Constituição7;

II) pelo critério da essência, seriam humanos os direitos que fossem exclusivos dos seres humanos8;

III) pelo critério sistemático, fundamentais poderiam ser até direitos reconhecidos em norma infraconstitucional, desde que haja referência inicial da Constituição. Assim, seriam fundamentais os direitos encartados no Estatuto da Criança e do Adolescente, no Estatuto do Idoso etc., já que a Constituição protege a infância, a adolescência e a velhice.

O primeiro passo, na análise da diferença entre direitos humanos e direitos fundamentais, é trazer a lume quem são os destinatários de sua proteção9.

Adotado esse fator de diferenciação, não ficaria clara a separação entre direitos humanos e fundamentais, permanecendo a zona de penumbra original-mente existente, pois nos dois casos o destinatário da proteção é a pessoa humana. Logo, não sendo o critério pessoal suficiente para se determinar a diferença, qual seria então o aspecto capaz de separar os dois termos jurídicos?

Para responder essa questão, Ingo Wolfgang SARLET confere...

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