Revisão contratual e função social

AutorGeraldo Scramin Neto - Jussara Suzi Assis Borges Nasser Ferreira
CargoPós-graduado em Gestão Pública Municipal pela Universidade Estadual de Maringá, UEM - Doutora em Direito das Relações Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC
Páginas53-86
SCRAMIN NETO, G.; FERREIRA, J. S. A. B. N. 53
Rev. Ciênc. Juríd. Soc. UNIPAR, v. 16, n. 1, p. 53-86, jan./jun. 2013
REVISÃO CONTRATUAL E FUNÇÃO SOCIAL
Geraldo Scramin Neto1
Jussara Suzi Assis Borges Nasser Ferreira2
SCRAMIN NETO, G.; FERREIRA, J. S. A. B. N. Revisão contratual e função
social. Rev. Ciênc. Juríd. Soc. UNIPAR. Umuarama. v. 16, n. 1, p. 53-86, jan./
jun. 2013.
RESUMO: Este artigo tem como objetivo estrutural a propositura de uma nova
interpretação da matéria revisional civil com fundamento, imperiosamente, no
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à aplicação da teoria da imprevisão, possibilitando rever ou não determinado
contrato. No intuito de alcançar referido escopo, será imprescindível percorrer
determinado lapso temporal, para que nesse decurso histórico possam-se pungir
as nuances da Função social dos contratos e da revisão contratual, num quase
silogismo retórico e, para que haja um concluso enlace harmonioso, vislumbrar
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tribuir para a renascença do texto normativo ante o contexto social efêmero e ao
mesmo tempo vivaz. Destarte, uma criteriosa revisão de literatura e uma pes-
quisa jurisprudencial são preceitos básicos de um ensaio cujos vagares perme-
arão o viés da funcionalização dos pactos, de cunho introdutório, conceitual e
fundante, até a doutrina revisionista e a (in)aplicabilidade hodierna e gradativa
dos pressupostos de admissibilidade ao caso concreto. A análise pontual de tais
institutos somente cede espaço quando na união dos mesmos para sobejar a pre-
sente proposta interpretativa, núcleo vital deste estudo. O raciocínio teleológico,
portanto, progride rumo à mescla destes dois temas de suma importância no di-
reito privado para que se possa fomentar a moderada, mas atuante aplicação dos
dispositivos de revisão ou resolução dos contratos, balizada pela aplicabilidade
da Função social dos contratos, enquanto moderno princípio e, também, exemplo
de cláusula geral.
PALAVRAS-CHAVE: Contratos. Função social. Teoria da Imprevisão. Revisão
contratual.
1Pós-graduado em Gestão Pública Municipal pela Universidade Estadual de Maringá - UEM; Gra-
duado em Gestão Pública pelo Instituto Federal do Paraná - IFPR; Graduado em Tecnologia em
Automação Industrial pelo Centro Universitário de Maringá - CESUMAR; Graduando em Direito
pela Universidade Paranaense - UNIPAR. Endereço: Rua São Tomé, 1178, Centro, São Manoel do
Paraná – Paraná. e-mail: geraldoscramin@hotmail.com
2Doutora em Direito das Relações Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC;
Mestre em Direito pela Universidade Estadual de Londrina - UEL; Bacharel em Direito pela Uni-
versidade Estadual de Londrina. Advogada. Professora Permanente do Programa de Mestrado em
Direito Processual e Cidadania da UNIPAR. Endereço: Rua Cruzeiro do Sul, 330, Jardim Bela Suíça,
Londrina – Paraná. e-mail: saraadv@sercomtel.com.br
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Rev. Ciênc. Juríd. Soc. UNIPAR, v. 16, n. 1, p. 53-86, jan./jun. 2013
1 INTRODUÇÃO
As conquistas alcançadas ante o incansável labor de estudiosos que se
debruçaram sobre os mais diversos temas e ciências são matérias-primas de todo
e qualquer estudo. A ciência do Direito não seria diferente. A sociedade segue em
passos intermitentes galgando mudanças. Com esse ideal de constante transição
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ensaio convive com uma visão mais social do direito privado, com a inserção de
-
vel e de uma profunda interconexão entre o direito público e o privado.
Na senda de tais aferições, o escopo substancial do presente estudo é
propor uma alternativa quanto à matéria revisional – Teoria da Imprevisão –
disposta no campo obrigacional, tendo como fundamento de tal prerrogativa a
Função social dos contratos, que é capaz de amoldar-se ao caso concreto devido
à sua disposição enquanto cláusula geral entre os dispositivos legais do Código
Civil e sua amplitude e hierarquia, sabendo ser um dos modernos princípios do
direito negocial, inovação introduzida no codex brasileiro.
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minado negócio jurídico com base na Teoria da Imprevisão, por força da exigên-
cia legal dos pressupostos de admissibilidade, mormente a incidência de evento
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nutenção do pacto possa atentar contra a Função social dos contratos, a temática
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possibilidade interpretativa de que o princípio contratual da socialização venha
em auxílio à discussão judicial, para ser fundamento da sentença que decida re-
ver ou não o caso concreto. Determinado contrato que não comungue com a sua
Função social não pode ser privado da revisão se, por acaso, não se completaram
todos aqueles pressupostos legais. Mais do que a aplicação casuística do fato à
norma, deverá ser a garantia e manutenção da Função social do contrato.
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abordados dois pilares fundamentais para a devida e exata compreensão, quais
sejam: Função social dos contratos e, posteriormente, a Teoria da Imprevisão.
Superado esse prévio desenvolvimento, aprofundar-se-á na análise dos pressu-

e delimitação da proposta já referida.
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2 FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS
2.1 Teoria contratual clássica
No compasso desse considerável lapso temporal em que o direito con-
tratual está inserido, a autonomia privada é elemento marcante neste caminho
de passos lentos, pelos quais a sociedade evolui e, com ela, também o Direito.
Todavia há um vagar temeroso quando na abordagem deste princípio, já que
insurge certo desconforto entre os estudiosos jurídicos em eleger como sinônimo
do mesmo a autonomia da vontade. Em síntese, para muitos, ambas as expres-
sões – “autonomia privada” e “autonomia da vontade” – correspondem a um
  
se fazer a distinção e, embora seja sensível a diferença, ressalta que “a expressão
‘autonomia da vontade’ tem uma conotação subjetiva, psicológica, enquanto a
autonomia privada marca o poder da vontade no direito de um modo objetivo,
autonomia privada – “princípio

interesses mediante acordos” (COELHO, 2009, p. 25) –, devido a sua maior
aplicação3.
Rogério Zuel Gomes (2004 apud TORRES, 2006, p. 51), sobre as ex-
pressões em comento, constata que enquanto a autonomia da vontade “tem ca-
   
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obrigacional”.
No que consta dos ensinamentos de Eduardo Sens dos Santos (2003),
em meio ao direito egípcio, babilônico, hebraico e mesopotâmico não se falava,
ainda, em autonomia privada, ou seja, a palavra dada cedia espaço àquilo que os
deuses queriam. Daí a razão pela qual somente no direito canônico contrapondo
o romano e aquela visão mística é que se poderia falar na formação desse balu-
arte.
Em tal contexto jurídico, há uma mescla entre Estado e Igreja muito
determinante, própria da Idade Média e do período feudalista vigente, fatos his-
tóricos estes de suma importância na pré-compreensão do movimento de ascen-
são da classe burguesa ulterior, buscando a queda da monarquia e a transição do
regime feudal para o capitalismo. O que se queria era a criação de contratos libe-
rais onde a autonomia privada surgiria como princípio fundamental e convenções
da forma como as partes se lhes aprouvessem (SANTOS, 2003). Corroborando,
em entrevista para Revista Veja, o poeta e ex-militante do Partido Comunista
3Cf. AMARAL NETO, sem data.

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