Responsabilidade tributária e redirecionamento da execução fiscal - responsabilidade dos sócios

AutorCarlos Mário Velloso
Páginas220-226

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Min. Carlos Mário VELLOSO1-Exmo. Sr. Professor, meu querido amigo, Aires Barreto; caros Profs. Antônio Mariz de Oliveira e José Souto Maior Borges, participantes do painel; Profs. Roque Carrazza, Maria Leonor Vieira, Eduardo Bottallo, José Eduardo Soares de Melo, que compõem a Mesa; Srs. e Sras. Congressistas. Comovidamente, retorno ao Congresso do inesquecível Geraldo Ataliba. Gostaria de proclamar que participei praticamente de todos eles, sempre sob a liderança de Mestre Ataliba, de quem nós todos nos tornamos discípulos e cujo nome pronuncio com respeito, admiração e uma profunda saudade.

Ouvi a exposição do Prof. Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, do notável Advogado Criminalista, Criminalista "sangue puro", cuja prova tivemos aqui, ao qual não falta coragem para denunciar, e sempre o faz, em nome daqueles que não podem falar. Prof. Mariz, eu não poderia deixar de me referir às suas palavras. Já aposentado, não tenho mais a responsabilidade do car-

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go, mas carrego a tradição de 40 anos na Magistratura, desde o primeiro grau. Quero dizer-lhe que ouvi com profunda preocupação as suas palavras, e é preciso que cada um de nós se preocupe com isso.

Convidado a falar para os novos juízes federais, pelo Presidente da AJUFE, em razão de compromissos assumidos, não pude comparecer Por escrito mandei a minha mensagem, nela incluindo que me sentia preocupado com essas prisões provisórias de advogados que vêm ocorrendo. E - o que é realmente preocupante - todas elas mediante mandado judicial. Preocupado com essas buscas e apreensões que se fazem em escritórios de Advocacia. Todas elas cobertas, também, por mandado judicial. E eu dizia aos novos juizes: no meu tempo a Polícia sempre esteve a nosso serviço; hoje, parece que há juízes a serviço de um Estado policialesco. Isto gera conseqüências sérias. É preciso que cada um de nós dê seu testemunho a respeito. É preciso que outros advogados, da têmpera do Dr. Mariz, denunciem, porque o que está ocorrendo degrada o Estado Democrático de Direito em que se constitui a República Federativa do Brasil.

Passo ao exame do tema que me foi distribuído: a responsabilidade tributária, redirecionamento da execução fiscal, responsabilidade dos sócios. Começaria minha exposição relembrando a classificação das sociedades. As sociedades ou são de pessoas ou são de capital. Meu velho Mestre na Faculdade de Direito da UFMG, Prof. João Eunápio Borges, no seu Curso de Direito Comercial, ensina que as sociedades serão de pessoas quando contratadas intuitu personae. Os sócios se escolhem, tendo em conta principalmente razões de ordem pessoal, conhecimento e a confiança recíproca. E de capital seriam aquelas em que tais considerações não existem e passam a plano secundário.

Sempre preferi, entretanto, a classificação çelo grau de responsabilidade dos sócios. É dizer, as sociedades de pessoas são aquelas sociedades em que a responsabilidade dos sócios é ilimitada. Por exem-plo, a sociedade em nome coletivo e aquelas outras que não se enquadrem como sociedades anônimas ou sociedades por quotas de responsabilidade limitada. E as sociedades de capital seriam aquelas nas quais a responsabilidade dos sócios limita-se à integralização do capital. Então, são sociedades de capital, as sociedades anônimas, a comandita por ações e a sociedade por quotas de responsabilidade limitada.

Essas sociedades, pessoas jurídicas, têm personalidade jurídica. A personificação das sociedades é uma realidade. Teorias explicam essa personificação, explicam a natureza das pessoas jurídicas. Por exemplo, temos as teorias da ficção, da propriedade coletiva, da realidade, a teoria institucional. Outro grande Mestre, de quem fui aluno, Caio Mário da Silva Pereira, menciona a teoria da personalidade real, ensinando que as pessoas jurídicas constituem uma realidade técnica ou realidade jurídica. A lei, diante da realidade de que as pessoas se agrupam com a finalidade de satisfazer necessidades - se nos aprofundarmos no tema, vamos chegar às sociedades políticas e ao próprio Estado -, confere personalidade jurídica aos agrupamentos constituídos com observância de seus preceitos. Esses agrupamentos passam a ser, portanto, pessoas jurídicas, com vontade própria, capazes de adquirir direitos e contrair obrigações, sujeitos, portanto, de direitos e obrigações.

E surge outra questão. Aquela que os alemães chamam de disregard doctrine, a desconsideração dessa personalidade jurídica. Essa desconsideração da personalidade jurídica surgiu na Inglaterra, ainda no século XIX, num caso que se tornou famoso, "Salomon vs. Salomon & Co. Ltd., de 1897, julgado pela Sessão Judicial da Câmara dos Lordes. Pela primeira vez se desconsiderou a personalidade jurídica da sociedade e se impôs obrigação aos sócios dessa mesma sociedade.

Essa disregard doctrine teve desenvolvimento no Direito Norte-Americano, sob o nome disregard of legal entity ("desconsideração da pessoa jurídica") ou ///-

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ting the corporate veil ("descerramento do véu corporativo"). Legal entity: entidade jurídica; corporate entity: personalidade jurídica. É que, na realidade, há momentos em que os sócios, os acionistas, os dirigentes, abusam da personalidade jurídica da sociedade, e muitas vezes em detrimento dessa própria sociedade - é dizer, em detrimento de sócios, da maioria dos sócios, em detrimento da sociedade, das pessoas que contratam com esta.

A disregard doctrine não visa a anular a personalidade jurídica, mas apenas à sua desconsideração em determinados casos concretos. Essa doutrina foi acolhida pelo Direito Brasileiro e pela jurisprudência dos nossos Tribunais, e hoje está positivada, por exemplo, no...

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