Religiosidade Cívica na Bahia: Comemorando o Primeiro Centenário da Independência a 2 de Julho de 1923. Entre a memória nacional e a memória regional

AutorGerson Galo Ledezma
CargoProfessor do Departamento de História da Universidade Federal do Ceará
Páginas69-87
RELIGIOSIDADE CÍVICA NA BAHIA: COMEMORANDO ORELIGIOSIDADE CÍVICA NA BAHIA: COMEMORANDO O
RELIGIOSIDADE CÍVICA NA BAHIA: COMEMORANDO ORELIGIOSIDADE CÍVICA NA BAHIA: COMEMORANDO O
RELIGIOSIDADE CÍVICA NA BAHIA: COMEMORANDO O
PRIMEIRO CENTENÁRIO DA INDEPENDÊNCIA A 2 DEPRIMEIRO CENTENÁRIO DA INDEPENDÊNCIA A 2 DE
PRIMEIRO CENTENÁRIO DA INDEPENDÊNCIA A 2 DEPRIMEIRO CENTENÁRIO DA INDEPENDÊNCIA A 2 DE
PRIMEIRO CENTENÁRIO DA INDEPENDÊNCIA A 2 DE
JULHO DE 1923. ENTRE A MEMÓRIA NACIONAL E AJULHO DE 1923. ENTRE A MEMÓRIA NACIONAL E A
JULHO DE 1923. ENTRE A MEMÓRIA NACIONAL E AJULHO DE 1923. ENTRE A MEMÓRIA NACIONAL E A
JULHO DE 1923. ENTRE A MEMÓRIA NACIONAL E A
MEMÓRIA REGIONALMEMÓRIA REGIONAL
MEMÓRIA REGIONALMEMÓRIA REGIONAL
MEMÓRIA REGIONAL1
Prof. Dr. Gerson Galo Ledezma2
Resumo: Os baianos se negaram a compartilhar da memória coletiva veiculada
pelo Rio de Janeiro em 1922, quando o Brasil comemorou cem anos de Indepen-
dência. Em Salvador foi rejeitado o projeto nacional proposto pelo presidente
Epitácio Pessoa e os baianos voltaram-se para festejar o Centenário que, para
eles, deveria ser a festa de todos os brasileiros: 2 de Julho de 1923. Culto cívico
comemorado desde 1826 que toma força durante todo o século XIX, se apresen-
ta com esplendor em 1922-1923 para continuar competindo com 7 de setembro
de 1822.
Palavras-Chave: Primeiro Centenário da Independência; Identidade, Memória;
Bahia.
Abstract: The people from Bahia refused to share the colective memory for the
celebration of a hundred years of Nacional Independence coming from Rio de
Janeiro in 1922. The national project proposed by the president Epitacio Pessoa
was rejected in Salvador. The “baianos” celebrated the centenary in July 2, 1923,
which for them should be the party of all Brazilians. In 1922 and 1923 flourishes
the celebration of the civical cult that takes place since 1826, getting stronger
during all the XIX century, and therefore continues competing nowadays with
September 7 of 1822.
Key-Words: Brazilian Independence First Centenary; Identity; Memory; Bahia
(Brazil)
Durante a Revolução Francesa surge o culto cívico em torno, já não mais
de santos da Igreja, porém de homens ainda vivos. Estes cultos dão passagem às
festas cívicas inexistentes nas ruas das cidades do Antigo Regime. A festa cívica
1 Agradeço, de maneira especial, a hospitalidade que, generosamente, me ofereceram em Salvador,
durante os meses de janeiro e fevereiro de 2003, minha cara amiga Angélica Freitas e sua família.
2 Professor do Departamento de História da Universidade Federal do Ceará. E-mail para contato:
gersonledezma@yaoo.com
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na Revolução Francesa foi estudada por Albert Soboul e Albert Mathiez há algu-
mas décadas, posteriormente por Michel Vovelle e Mona Ozouf que aprofunda-
ram o tema. Fala-se então da festa cívica como momento no qual se entretece
passado, presente e futuro na medida em que, como afirma Ozouf3, o tempo da
festa não é o tempo do historiador. Também se tem interpretado o culto cívico,
através da festa, como um fenômeno para sair das angústias e projetar os nossos
sonhos e esperanças. Porém, seria também o ato máximo criador do espetáculo
que nos comunica com o coletivo e nos faz sentir cidadãos, pertencentes a uma
nação: “este é o verdadeiro sentido da festa cívica que sonhava Rousseau, cria-
ção e redescobrimento da cidadania, momento de elaboração de uma consciên-
cia de pertencimento a uma nação e sua história, re-invenção da nossa identidade
como parte de um povo”4.
Este tipo de religiosidade cívica, em torno de festas de rua, foi proposto por
Rousseau no século XVIII, na sua famosa Carta a d’Alembert5, onde propôs a
festa cívica, já não mais ao interior de teatros, lugares freqüentados apenas pela
aristocracia, mas na rua, onde o povo participasse e, assim, envolvê-lo com a
pátria.Foi durante e depois da ditadura de Robespierre quando o povo foi se pre-
parando para criar e encarar um novo culto, já não mais a seus antigos deuses e
santos ou heróis da antiguidade francesa, romana ou grega, senão aos heróis
vivos da Revolução. Instaura-se o culto à Deusa da Razão e ao Ser Supremo;
rende-se culto a Robespierre depois de ser executado e aos mártires da Revolu-
ção: Marat, Danton, etc., estando ainda vivos; instala-se o culto aos santos pa-
triotas, onde predomina, segundo Darío Acevedo Carmona, as formas religiosas
sobre as práticas políticas e não existe substituição do velho culto, dando-se um
caso de sincretismo, no qual o sentimento religioso tradicional se apodera de
valores e significados derivados da intensidade do momento político6. Desta ma-
neira, a festa cívica reclama pela ordem para criar o culto em volta de novos
costumes e disciplinar o povo no calor das comemorações, lugar da memória.
Criando uma comunidade que aprende a cidadania mediante a repetição de atos
de igualdade e fraternidade.
A esta luz, entende-se que a futura apropriação revolucioná-
ria dos seus ensinamentos venha fazer da festa cívica uma
prática construtora da cidadania, manifestação o mais espon-
tânea possível, que devia ter como atores os seus próprios
espectadores, isto é, o povo reunido e em confraternização,
ao ar livre, em jornadas revivificadoras do elo social7
É nos países andinos onde Georges Lomné verifica até onde os rituais da
Revolução Francesa foram amplamente vividos. Demonstra como o culto aos

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