Prescrição da Medida de Segurança

AutorHeráclito Antônio Mossin/Júlio César O.G. Mossin
Ocupação do AutorAdvogados criminalistas
Páginas225-236

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O instituto da medida de segurança se encontra disciplinado nos artigos 96 usque 99 do Código Penal.

Do ponto de vista de sua natureza jurídica, a medida de segurança não deixa de ter caráter de pena, uma vez que, não obstante seu fim último, que é a procura da cura daquele autor do crime que a ela se submete, culmina, de qualquer maneira, em restringir a liberdade corpórea do autor do fato punível, porquanto o indivíduo que dela é objeto será compulsoriamente colocado em estabelecimento hospitalar de natureza psiquiátrica ou em nível de tratamento ambulatorial. Logo, o sentido de limitação da liberdade individual deve ser compreendido no aspecto amplo e natural, sempre ligado à faculdade de se fazer ou não fazer o que quer, ou seja, agir segundo sua própria determinação.

É imprescindível estabelecer esse caráter punitivo, mesmo que seja concebido em sentido anômalo, porquanto ele constitui a pilastra sobre a qual se assenta a discussão em torno do tema jurídico enfrentado, que é a prescrição envolvendo a medida de segurança.

Assim é que, reforçando o que está sendo objeto de dissertação, a medida de segurança, embora não deixando de ter também aspecto preventivo, se funda na periculosidade do indivíduo inimputável, que uma vez excluindo sua culpabilidade lhe impõe, como resultante da prática de um fato punível e antijurídico, uma sanção penal, posto que limita sua liberdade, porém voltada à sua cura, seu tratamento, sua recuperação psíquica.301

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Com efeito, “sanção penal é a reação do Estado à transgressão de uma norma incriminadora. Pena e medida de segurança são as duas espécies de sanção penal que integram os meios de luta contra a criminalidade302.

Ainda,

(...) a doutrina sustenta que constituem sanção penal, diferenciando-as das penas pela natureza e fundamento. As penas têm caráter retributivo e preventivo; as medidas de segurança têm somente natureza preventiva. As penas assentam-se na culpabilidade do agente; as medidas de segurança, na periculosidade.303Outro não é o magistério da lavra de Guilherme de Souza Nucci, em torno da natureza jurídica da medida de segurança: “Trata-se de uma forma de sanção penal, com caráter preventivo e curativo, visando a evitar que o autor de um fato havido como infração penal, inimputável ou semi-imputável, mostrando periculosidade, torne a cometer outro injusto e receba tratamento adequado”304.

Como se observará no transcorrer desta dissertação, a medida de segurança consiste em subordinar o inimputável à internação em hospital para efeito de tratamento psiquiátrico ou ambulatorial, e ao semi-imputável poderá ser imposto o tratamento ambulatorial. Essas medidas de cunho precipuamente curativo, impostas coativamente por intermédio de regular sentença judicial, não deixam de se elevar à condição de sanção, porém amplamente diferenciada daquela de índole carcerária.

Aliás, a propósito do exposto, atualmente, diante do direito penal moderno, não há como confundir medida de segurança com pena, o que ocorria antes da última reforma da Parte Geral do Código Penal.

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Assim,

Abandonado o chamado sistema do ‘duplo binário’ a reforma penal de 1984 adotou, em toda sua extensão, o sistema vicariante, eliminando definitivamente a aplicação dupla de pena e medida de segurança para os imputáveis e semi-imputáveis. A aplicação conjunta de pena e medida de segurança lesa o princípio do ne bis in idem, pois, por mais que se diga que o fundamento e os fins de uma e outra são distintos, na realidade, é o mesmo indivíduo que suporta as duas consequências pelo mesmo fato praticado.305

Porque oportuno – e ainda a propósito da medida de segurança, mais o tema jurídico enfocado – assunto de direito que merece ser sopesado diz respeito ao tempo de duração da medida de segurança. De forma iterativa sempre se entendeu, quer em nível de doutrina, quer nos termos pretorianos, que a medida cuidada não tem termo de duração. Deverá perdurar enquanto não houver exame positivo de cessação de periculosidade do agente que está sendo submetido a tratamento médico-psiquiátrico.

E mais, o primeiro exame de cessão da periculosidade deve ser feito entre 1 a 3 anos e, se perdurar a anomalia psíquica, ser repetido anualmente (art. 97, §§ 1º e 2º, CP). Entretanto, o prazo de duração da medida de segurança não pode ser por tempo indeterminado.

Sem dúvida, portanto, a medida de segurança não deixa de ser uma modalidade de pena, não se pode conceber que sua duração seja indeterminada no tempo. Não existe na legislação pátria pena perpétua. Toda a sanção tem seu tempo de duração previamente demarcado pelo legislador.

Isso tudo considerado, se houvesse entendimento sufragado no sentido de não haver espaço temporal em torno da duração da medida de segurança, eventual discussão em torno do instituto da prescrição no mencionado instituto perderia consideravelmente seu objeto.

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A respeito do tema jurídico dissertado, o Superior Tribunal de Justiça se posicionou no seguinte sentido:

Nos termos do atual posicionamento desta Corte, o art. 97, § 1º, do Código Penal, deve ser interpretado em consonância com os princípios da isonomia e da proporcionalidade. Assim, o tempo de cumprimento da medida de segurança, na modalidade internação ou tratamento ambulatorial, deve ser limitado ao máximo da pena abstratamente cominada ao delito perpetrado, bem como ao máximo de 30 (trinta) anos. Precedente.306Nos cânones do Supremo Tribunal Federal, “esta corte já firmou entendimento no sentido de que o prazo máximo de duração da medida de segurança é o previsto no art. 75 do CP, ou seja, trinta anos”307.

Observando os dizeres inseridos naqueles posicionamentos pretorianos, enquanto o Superior Tribunal de Justiça leva em conta não só o tempo de 30 anos – mas também o máximo da pena abstratamente cominada em relação ao delito que fez decorrer a medida de segurança –, por seu turno a Excelsa Corte se fixa apenas no prazo de 30 anos, que é o limite de duração do cumprimento das penas privativas de liberdade na legislação pátria.

Tendo em vista o critério da proporcionalidade, que sempre se afina com o texto constitucional, deve preponderar a inteligência lavrada pelo Superior Tribunal de Justiça.

Sem dúvida, não seria conforme o melhor direito nem em harmonia com a equidade, mas simplesmente de bom senso, que todo prazo, indistintamente, para a duração da medida de segurança fosse de 30 anos. Esse espaço temporal, inexoravelmente, deve ser tolerado como sendo o máximo, o que se concilia com o limite temporal de duração da sanctio legis corporal.

De se conceber, porque oportuno, que deve haver tratamento diferenciado mesmo no campo da medida de segurança no que diz

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respeito à sua duração, levando-se em consideração a quantidade da pena...

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