Práticas Antissindicais

AutorAloysio Corrêa da Veiga
Ocupação do AutorMinistro do Tribunal Superior do Trabalho, Presidente da 6ª Turma, Conselheiro do CSJT, membro da Academia Nacional de Direito do Trabalho e do Instituto dos Advogados Brasileiros.
Páginas224-235

Page 224

Introdução

Escrever sobre um tema de relevância social e de tamanha importância é, sem dúvida, um grande desafio! - Parece que a repetição do lugar comum se torna frequente. - Longe de mim alertar para a complexidade deste tema. É presente e atual. Além disso, trata-se de uma realidade que se manifesta a cada dia, de modo a despertar o interesse para que seja amplamente debatido e, com prudência, consciência e sensibilidade, proporcionar o aprimoramento das relações sociais coletivas.

As Práticas antissindicais fazem parte de um cotidiano de uma relação social instigante que vê, na maturidade das relações sociais, um momento de reflexão profunda, sem preconceitos, visando, sobretudo, concluir as relações sociais entre capital e trabalho na visão coletiva, com o fim de estabelecer uma linha de evolução, em comunhão com as fontes de produção de riqueza e em sintonia com os meios necessários a este fim comum - capital e trabalho -, segmentos sociais que se voltam para o bem comum.

Organizam-se coletivamente empregados e empregadores. É da organização que advém o êxito da busca do ideal comum.

Empregado e empregador! Relação jurídica que se esgota num contrato típico, o de trabalho.

No trato individual é uma relação subordinada a regras de conduta, delineada em normas que individualmente regulam o desenvolvimento no campo singular, e que não se esgota na regulação indivíduo e empresa.

E é essa relação jurídica que estabelece e transcende o campo individual para se transformar numa relação coletiva de difícil solução, na busca de harmonizar o histórico conflito capital e trabalho.

Necessário apreciar o tema, levando em consideração a postura do Estado em face do princípio que assegura a liberdade sindical.

Também é preciso enxergar a atividade sindical no mundo, com toda essa estrutura relacionada aos organismos internacionais, notadamente a Organização Internacional do Trabalho, no que se refere à regulamentação dos princípios que norteiam a atuação dos sindicatos no Brasil e no mundo diante da filiação dos Países ao Organismo Internacional.

Toda essa estrutura - claro que voltada para o Direito interno e para as manifestações da atividade sindical no Brasil, também com relação à postura do Estado, das diversas ingerências; enfim, da liberdade sindical como pressuposto.

Na realidade, precisamos entender qual foi a evolução de toda a história da representatividade no Brasil, de como ela se manifesta e de qual o anseio, qual a aspiração da sociedade nesse sentido.

Precisamos saber também a quem é dirigida toda essa estrutura internacional, toda essa questão voltada à proteção contra práticas antissindicais.

Page 225

Qual é o alcance subjetivo dessa proteção? Se é, natural e tão somente, a classe trabalhadora; se, em contrapartida, os sindicatos patronais também têm o alcance dirigido à proteção contra práticas antissindicais. Enfim, qual é o alcance objetivo e o que se quer proteger.

O direito coletivo do trabalho, de singular relevância, tem por fundamento as garantias fundamentais que irão consagrar as melhorias das condições do trabalho.

As manifestações das Organizações Sindicais, na busca do ideal que lhe é inerente, têm procurado desempenhar sua função, na defesa de direitos e aspirações para preservar as melhorias das condições de trabalho, a justificar que o Estado garanta a liberdade de exercício do direito coletivo.

É neste contexto que o Estado Democrático de Direito irá desempenhar o papel de repelir toda e qualquer prática que venha macular o princípio de liberdade sindical, a inibir e impedir toda e qualquer prática antissindical.

A liberdade sindical

As transformações do trabalho gerando novos desafios no direito contemporâneo exigem dos estudiosos do direito do trabalho uma constante e permanente reflexão com vistas às melhorias das condições sociais.

O direito coletivo do trabalho não se distancia dessas transformações.

Os estudiosos do direito do trabalho necessitam ter uma familiaridade íntima com os paradigmas do direito coletivo, diante das frequentes alterações políticas, econômicas e sociais. O papel que desempenha o direito coletivo, neste cenário, não pode e nem deve ser ignorado, sob pena de se estabelecer o retrocesso nas relações sociais.

Os ideais de liberdade, trazidos com a revolução industrial, consubstanciados na liberdade do trabalho, de longe reclamam uma atuação eficiente, em que a categoria profissional organizada possa contribuir, de maneira efetiva, para estabelecer, com segurança, nos planos ideológico, jurídico e político, os destinos dos trabalhadores vinculados a uma organização, capazes de reivindicar a tão sonhada melhoria das condições de trabalho. Condições essas que jamais poderão obter individualmente.

Ainda é bem atual a advertência de Evaristo de Moraes, cuja reedição publicada pela LTR tem o prefácio de seu filho o grande Evaristo de Moraes Filho:

"Os economistas clássicos mantêm ainda, contra a evidência dos fatos, no interesse do capitalismo moderno, a crença nas virtudes da liberdade do trabalho, não admitindo regras, nem normas legais, que fixem as bases do contrato entre o empregador e o empregado... O homem é livre - argumentam; tem o direito de vender o seu trabalho pelo preço e nas condições que quiser. Mas, na vida industrial moderna, essa liberdade de trabalho só tem gerado a opressão e a miséria, a exploração do operariado e seu rebaixamento progressivo. Hoje, já ninguém contesta quanto influi a inexorável lei da concorrência na remuneração do trabalho - e isso basta para desfazer o encanto ilusório da liberdade do trabalho." 1

A liberdade do trabalho só existirá se consagrada no direito coletivo. Para tanto, é o movimento sindical, por excelência, no plano jurídico, o meio capaz de realizar, na plenitude, os anseios de toda uma categoria, que se materializa na liberdade de associação.

A luta pelo reconhecimento internacional do direito de sindicalização é histórica. Segadas Vianna conta que foi somente no término da Primeira Guerra Mundial que surge uma declaração de princípio incluída no art. 427, inciso 2º do Tratado de Versailles: - "O direito de associação, desde que não contrarie às leis, é reconhecido tanto para os assalariados como para os patrões"2.

A importância do Tratado de Versailles, como reconhecimento de uma declaração que consagrava um princípio de dignidade da pessoa humana, é essencial. Era, no dizer de Segadas Vianna, "uma declaração platônica"3 mas, com toda certeza, foi fundamental na origem dos sindicatos na sociedade moderna.

A Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948, em Paris, reafirma e concretiza a liberdade do trabalho e a proteção dos direitos dela inerentes.

Page 226

O Ministro Arnaldo Süssekind afirma que: "Apesar de não se revestir da forma de tratado ratificável, essa Declaração constitui fonte de máxima hierarquia no mundo do Direito, enunciando princípios que devem iluminar a elaboração e a aplicação das normas jurídicas. Ela substitui a Declaração dos Direitos do Homem adotada pela Assembleia Nacional da Revolução Francesa em 26 de agosto de 1789 4.

A Declaração Universal dos Direitos do Homem reafirmava o princípio da liberdade do trabalho, nos itens 1, 2, 3 e 4, do art. XXIII5, consagrando as condições dignas de desenvolvimento do trabalho, preservando a não discriminação e a retribuição justa pelo trabalho prestado.

O direito à sindicalização, para defesa e proteção dos interesses do trabalhador, bem dimensiona o papel dos Sindicatos na garantia da liberdade de trabalho.

A liberdade do trabalho está, por isso, estreitamente ligada à liberdade sindical e cabe a todos pôr em prática a proteção ao direito de organização, ao direito de negociação coletiva, no firme propósito de preservar o princípio da dignidade da pessoa humana e, portanto, repelir toda e qualquer prática ou conduta antissindicais.

As convenções da oit

O maior valor a ser protegido, no estudo do direito sindical, é a liberdade. É um direito humano fundamental.

A liberdade é o valor ideal supremo que uma nação elege como garantia da cidadania. Deste valor ideal se retira qualquer resquício de escravidão, servidão ou sujeição do Homem, a possibilitar os meios necessários para que ele alcance, na medida do possível, o bem-estar social e, a partir daí, a felicidade na terra.

O cenário de desigualdade que habita nas relações entre capital e trabalho merece profunda atenção a garantir o exercício das reivindicações, para que as conquistas sirvam de exemplo a todas as categorias profissionais, pela obtenção de condições mais vantajosas na busca da justa retribuição da força de trabalho, como fonte de riqueza.

A liberdade é um direito formal e materialmente fundamental, afirma Luciano Martinez:

"uma vez que, além de previsto expressamente nos arts. , , 10 e 37, VII e VIII, da Constituição Federal e de mencionado obliquamente em outros tantos dispositivos, tem conteúdo que fortemente se relaciona com os direitos naturais da pessoa humana. Apesar disso, o direito à liberdade sindical, como direito fundamental de conteúdo complexo e abrangente, está receptivo a uma permanente construção mediante aportes proporcionados pela abertura do catálogo a outros tantos direitos fundamentais, observado, evidentemente, o procedimento para tanto previsto na própria Constituição e o que seja considerado importante para a comunidade, segundo os sistemas-paradigmas que tenham valores sociais ao menos semelhantes." 6

O termo conduta sindical cria uma amplitude tão grande que, realmente, é preciso se definir o alcance ou a proteção efetiva, porque tudo decorre e tem origem na "liberdade".

É relevante tratar dessa liberdade sindical, consagrada pela primeira vez na Declaração de Filadélfia, de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT