O paradigma da verdade no processo do trabalho: uma necessária mudança de perspectiva

AutorKonrad Saraiva Mota
CargoGraduado em Direito (2003)
Páginas137-142

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1. Introdução

O presente artigo tem por ?nalidade rediscutir o paradigma da verdade no processo do trabalho.
Para tanto, será demonstrada a necessidade de um deslocamento de perspectiva da busca da verdade e a consequente identi?cação do seu adequado lugar na dinâmica processual.

A abordagem, contudo, dependerá da superação de algumas teorias, como aquela que coloca a descoberta da verdade como ?nalidade última da prova, pressupondo-se que o empenho cognitivo visa unicamente à reconstrução dos fatos narrados tal como aconteceram e nos quais será embasada a decisão judicial.

Também não será esquecida a re?exão crítica sobre o risco da verdade enquanto evidência como elemento de contaminação alucinatória da decisão judicial, favorecendo uma colonização do processo pelo julgador no incentivo de julgamentos que pouca ou nenhuma importância conferem ao diálogo probatório.

Outro aspecto que igualmente será abordado refere-se ao uso da verdade como elemento de inspiração psicológica do julgador, fazendo com que o magistrado, embora ciente de que não pode atingir a verdade absoluta, alicerça sua atividade neste desiderato como caminho para legitimação de sua atuação.

Finalmente, a verdade será posta no seu devido lugar, como elemento de conectividade na teia processual, teia esta dotada de dinâmica e movimento, sobretudo discursivo, de modo que a verdade não se apresenta como objetivo ?nal da prova, mas como elemento de demo-cratização do processo, enquanto facilitadora do discurso na construção do provimento jurisdicional.

2. A verdade no processo: deslocamento de perspectiva

Falar em processo cognitivo remete inevitavelmente à evocação da prova e de sua função. Não raros são os escritos que, sem a merecida profundidade, sustentam a descoberta da verdade como desiderato probatório absoluto. Entretanto, a busca da verdade no processo exerce uma funcionalidade diversa e muito menos substancial do que o escopo último do empenho probatório.

Inúmeros são os estudos, mormente no campo ?losó?co, acerca do conteúdo da ver-dade. No processo, porém, a verdade sempre foi vista como objetivo a ser alcançado pelo juiz na reconstrução dos fatos que permeiam o litígio. Recorre-se, muitas vezes, à a?rmação de que o julgamento atingiu o verdadeiro, tal como ocorrido, restabelecendo às partes naquilo que lhes é de direito. Acontece que essa visão irre?etida da atuação jurisdicional não mais encontra sustentação teórica e prática, diante do paradigma do processo democrático.

Necessário e urgente, pois, uma rede?nição adequada do problema da verdade no processo do trabalho, o que somente será possível mediante de um deslocamento de perspectiva, tal como ensina Martins (2010, p. 81):

Enquanto o debate se mantiver dentro das mesmas regras do jogo que outrora conduziram à consagração do ‘verdadeiro’ como eixo central do sistema processual, enquanto a argumentação utilizada para propor o

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deslocamento funcional a partir de dentro da mesma província de signi?cado que a argumentação utilizada para re-dizer (sic) a centralidade, a possibilidade de produzir uma efectiva reconsideração do problema será sempre escassa.

Ao invés dos debates inócuos e intermináveis sobre o conteúdo da verdade, é preciso, como primordial ao seu correto enfretamento, estabelecer o “lugar do ‘verdadeiro’ no âmbito de uma dinâmica processual que reconfigura e o move a cada momento”. (MARTINS, 2010, p. 81.)

3. O abandono da verdade como finalidade última da prova

Antes de estabelecer o lugar que a verdade deve ocupar no sistema processual, sobretudo no campo da prova, imperioso o abandono de algumas teorias que, de tão repisadas, acabam por se dogmatizar no tempo.

Remansosos são os escritos que apontam a busca da verdade como escopo probatório no âmbito do processo do trabalho. A fase cognitiva estaria, assim, à disposição do juiz para, na qualidade de dirigente do feito, descobrir a verdade tal como de fato aconteceu.

Recai-se, nesse particular, na discussão de vários...

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