Oficina: Processo Judicial Tributário

AutorCarla de Lourdes Gonçalves
Páginas147-166

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Camila Vergueiro C atún da [Texto sem revisão da Autora] - [Truncado na gravação] (...) o contribuinte oferece os seus embargos à execução, ele vai discutir a dívida tributária, e hoje ele vai, então, ter que pleitear, demonstrar a presença dos requisitos do fumus, a relevância jurídica dò Direito e do risco de dano, caso seja dado prosseguimento a essa execução fiscal. E, aí, o que me causa um pouco de espanto é a aplicação dessa regra geral do Código de Processo Civil que fala que não precisa, os embargos, hoje, não são mais dotados de efeito suspensivo. Essa regra, quando nós pensamos no âmbito do direito privado, dentro do processo civil, até faria algum sentido, porque você faria uma execução provisória e o ente privado, aquele que vai promover a execução provisória, ele está obrigado, por força do art. 475-0 do CPC, a oferecer uma caução. Então, você até admitiria. Agora, quando nós estamos falando da relação entre o Fisco e o contribuinte, o Fisco não pode oferecer uma caução. Então, imaginando que você apresentou seus embargos, não conseguiu o efeito suspensivo, o juiz reportou que não são relevantes, ele dá prosseguimento à execução fiscal, imaginando que essa execução fiscal está garantida por uma fiança bancária. Sem o efeito suspensivo, a Fazenda vai dar continuidade, ela vai executar essa fiança bancária.

Bom, o que é que isso vai representar? Um prejuízo à própria análise dos seus embargos. Vamos imaginar que essa fiança é executada. O dinheiro vai ser depositado em juízo, vai haver a conversão em renda. Pela via dos embargos, você não vai poder obter a restituição, eventualmente, no futuro. Vamos imaginar que esses embargos à execução acabem por ser providos, mesmo que seja em um grau de apelação ou em recurso especial ou extraordinário. Como você vai fazer a recomposição do seu patrimônio? Você teria que entrar com uma nova medida judicial, ação de repetição do indébito, para obter de volta algo que já deveria ter obtido. No meu modo de ver, seria melhor que a execução tivesse sido suspensa e se aguardasse, cautelarmente, o resultado definitivo dessa demanda.

Então, eu acho que esse é um primeiro problema que a gente verifica. Na verdade, são dois. Essa questão de que a execução provisória não vai exigir a caução do Fisco e o fato de que os embargos à execução podem ficar prejudicados pela análise do seu próprio mérito.

Outro ponto que eu levanto aqui, sobre essa questão dos embargos, da falta de efeitos suspensivos nos embargos de execução fiscal, é a seguinte situação: existem duas leis que tratam dessa questão do depósito. Vai ser dada continuidade à minha execução, a minha fiança vai ser executada, e, aí, existem duas leis, a Lei federal 10.819/2003 e a Lei federal 11.429/2006, que autorizam - a primeira os Municípios, e a segunda os Estados - efetuar o levantamento de 70% dos depósitos que são feitos em garantia das execuções.

É lógico que essas leis estabelecem a necessidade dos Municípios e dos Estados de criarem um fundo para assegurar a devolução que as próprias leis estabelecem e devem ser feitas em até três dias, mas eu fico imaginando: é uma realidade do nosso país? Ou seja: eu vou permitir a execução, a continuidade da execução, vou permitir o levantamento, porque a legislação assegura, com esse risco eminente, que nós sabemos, de que o Poder Público não vá devolver com a presteza que deveria se, eventualmente, nos embargos à execução.

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eles forem providos. Será que a solução que foi dada no âmbito do processo tributário foi, efetivamente, a melhor? Houve uma preocupação de se analisar a relação jurídica de direito material de fundo? Porque nós trabalhamos com a concepção de que o processo é instrumento da relação jurídica de direito material. Eu não posso pegar as regras do Código de Processo Civil, que eventualmente, digamos assim, são voltadas para o âmbito das relações privadas, e transportá-las para o âmbito do processo tributário, sem nos preocuparmos com essas situações peculiares que acontecem dentro de um processo tributário, ignorá-las, e falar: - "Como hoje os valores embutidos nessa nova legislação do Código de Processo Civil buscam dar mais efetividade à execução da dívida, eu pego, como uma 'bigorna', e jogo em cima do processo de execução fiscal, sem considerar a grande violação que os contribuintes podem sofrer em suas garantias fundamentais se não for atribuído efeito suspensivo aos embargos à execução fiscal". Então, coloco aqui essas considerações, e passo a palavra à professora Carla, eventualmente ao professor Cássio, para que possam trabalhar com essas sugestões que eu fiz aqui. Muito obrigada.

Carla de Lourdes Gonçalves - Agradeço as precisas colocações da professora Camila, trazendo esse acórdão recente do STJ. Vou passar, agora, a palavra para o professor Cássio, se ele quiser fazer algumas considerações adicionais sobre a questão. Depois, vou tecer considerações adicionais.

Cássio Scarpinella Bueno [Texto sem revisão do Autor] - Boa tarde a todos! E um privilégio muito grande estar neste XXVII Congresso Brasileiro de Direito Tributário. Agradeço imensamente, na pessoa da Maria Leonor Leite Vieira, pelo honroso convite. E um privilégio estar aqui, sob a presidência da professora Carla Gonçalves, dividindo esta Mesa também com a professora Camila Vergueiro Catunda. Eu também, assim como a professora Carla, estava na praia na época do XIV Congresso, nem sonhava em fazer Direito. Mentira! Eu, particularmente, participo da vida do IDEPE, até porque eu era vizinho de escritório, numa época da minha vida, do IDEPE, do escritório lá na Senador Paulo Egídio, 72, durante um enorme período da minha vida. E, com muito privilégio, acompanhava, literalmente, diariamente, o dia a dia do IDEPE, inclusive do ponto de vista administrativo, com o próprio professor Geraldo Ataliba, o próprio IDAP, o próprio professor Celso Antônio Bandeira de Melo, o professor Adilson Dallari. Felizmente, iam freqüentemente ao escritório, e eu tive o privilégio, então, de acabar convivendo com eles, de forma realmente muito privilegiada.

Concordo com o que a professora Camila falou. Até para justificar que eu não sou necessariamente um "peixe fora da água" - embora o seja -, quanto a essa questão, em uma Oficina como esta, com o privilégio de poder falar para uma platéia ultrassofisticada sobre processo tributário, concordo plenamente com o que ela falou.

O processualista civil, no geral, pouco se importa - e isso é péssimo, e eu posso afirmar, como um processualista que eu sou - com o mérito, como o direito material. Na verdade, ele acha que o processo civil, efetivamente, não reage diferentemente a questões de direito privado ou questões de direito público. Em geral, o processualista tem muita dificuldade de discernir como o processo deve reagir se o conflito de interesses levado ao Poder Judiciário é típico de direito privado, contrato de compra e venda, ou uma relação tributária, com toda a indisponibilidade absolutamente necessária, até por força de lei, que é colocada nela. Essa a grande dificuldade, em geral, de todos nós - e isso, talvez, seja uma ma-croculpa dos nossos bancos escolares, das nossas faculdades. Sempre falo isso, não como uma crítica, mas, sobretudo, como uma constatação - e com muito orgulho quanto a ser professor de graduação há 20

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anos, já, lá na PUC/SP. E, evidentemente, eu procuro não passar esta informação desta maneira. Mas, em geral, o processo civil é estudado numa perspectiva de direito privado. Não que as pessoas duvidem de que o direito processual civil seja, ele próprio, matéria de direito público. Isso as pessoas em geral não criticam, não duvidam ou, pelo menos, não infirmam. Mas os exemplos, as considerações, as problematizações, as situações em geral, envolvem o Caio, o Tício, um problema de vizinhança, uma locação etc. Evidentemente, nada contra o Caio ou o Tício ou o Tercio - no exemplo de intervenção de terceiros é o Tercio que vai aparecer. Evidentemente, nada contra o direito privado, embora até por ter sido formado pela PUC - e eu fiquei cinco anos da graduação ouvindo coisas do tipo "o Direito Privado é subdireito". Coisas que eu acho que posso falar aqui. Se fosse um congresso de direito civil eu não falaria, eu falaria o contrário.

Mas falo isso com muita tranqüilidade, mas claramente. A razão de ser do direito público, na perspectiva material, nos conduz, necessariamente, a reflexões diversas quando a questão é processual civil. Questões até não expressas no Código. Por exemplo, eu vou fazer uma audiência de conciliação numa repetição de indébito. A resposta não é processual, a resposta é material. Depende, o Fisco faz acordo ou não faz. E eu preciso consultar a lei federal, a lei estadual, a lei municipal, para saber se aquele Fisco faz acordo ou não. Porque, se não, é perda de tempo. Juizado Especial da Fazenda Pública? Aberração. Aberração. Na minha opinião, até inconstitucional, por outras razões. É uma perda de tempo. Por quê? O Juizado Especial só tem sentido se fizer acordo, se for matéria disponível, der para transigir, "o diabo a quatro". Se não dá para fazer, como no caso do Estado de São Paulo, de que é que adianta Juizado Especial? Não julga nem mais rápido, nem mais devagar; pelo contrário. Portanto, é uma questão sobre se cabe a uma lei federal criar organismos na Justiça Estadual, se é que cabe a uma lei federal. Porque isso é muito claro para o tributarista, o papel da lei federal, o papel da lei estadual, e assim por diante. Para o processualista tudo se basta numa lei federal. É olhar o projeto de Código de Processo Civil e seu show de horrores, invadindo matéria de lei complementar, matéria da Constituição, matéria da Constituição Estadual, matéria de lei estadual, matéria de lei federal. Estavam até querendo regular honorários de advogado público do Município na lei federal. Nada contra o advogado público do Município, bendito,seja ele. A questão é: pode uma lei federal criar...

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