Notas sobre o direito de recesso na incorporação, fusão e cisão das companhias

AutorNelson Eizirik
Páginas124-129

Page 124

I - Introdução

A Lei 9.457/97 introduziu algumas modificações de relevo no tratamento legal do direito de recesso nas hipóteses de incorporação, fusão e cisão das sociedades anónimas.

Os novos dispositivos legais tem trazido alguma controvérsia na sua aplicação prática às operações de reestruturação societária, particularmente no caso de companhias abertas.

Trataremos, no presente artigo, de analisar o novo tratamento legal conferido ao direito de recesso nas hipóteses de incorporação, fusão e cisão de sociedades anónimas, tendo em vista, principalmente, as dificuldades práticas que se tem observado na interpretação sistemática das disposições legais introduzidas mediante a Lei 9.457, de 5.5.97.

Para tanto, desenvolveremos o presente estudo analisando:

  1. os objetivos da reforma no que se refere aos processos de reestruturação societária implementados por meio de fusões, incorporações ou cisões;

  2. o novo tratamento legal conferido ao direito de recesso na cisão;

  3. a disciplina do recesso nas hipóteses de incorporação e fusão;

  4. a hipótese de recesso caso a cisão, incorporação ou fusão envolva companhia aberta e a sociedade que a suceder seja uma companhia fechada.

II - Os objetivos da reforma

Conforme se verifica da leitura do Projeto de Lei 1.564/96 ("Projeto Kan-dir"), que constituiu o primeiro impulso de relevo para a mini-reforma da Lei das S/À, visava-se, primordialmente, com as alterações propostas: a) reduzir os custos dos projetos de privatização, e b) facilitar os processos de concentração empresarial, tornando-os menos onerosos.

Para tanto, conforme já analisamos,1 foram flexibilizadas as normas disciplinando o direito de recesso por ocasião da in-

Page 125

corporação, fusão e cisão das companhias, inclusive no que se refere ao valor do reembolso, assim como eliminada a obrigatoriedade de oferta pública para os minoritários na alienação de controle acionário de companhia aberta.

Com a implementação da mini-refor-ma indiscutivelmente facilitou-se a realização de operações de reestruturação empresarial, tornando-as menos onerosas, na medida em que diminuídas as hipóteses de recesso para os acionistas dissidentes.

No que se refere especificamente aos casos de fusão, incorporação e cisão de companhias, visou a Lei 9.457/97 a:

  1. dirimir as dúvidas surgidas a partir da promulgação da Lei 7.958/89 (Lei Lo-bão) sobre a sobrevivência do direito de recesso nas hipóteses de cisão, fusão e incorporação;

  2. eliminar, em princípio, o direito de recesso na cisão (atendendo diretamente aos objetivos governamentais de reduzir os custos dos processos de privatização de concessionárias de telecomunicações e de energia, nos quais as cisões seriam utilizadas como ajustes prévios à alienação do controle das empresas);

  3. manter o direito de recesso nos casos de fusão e incorporação, exceto quando a companhia fundida ou incorporada apresenta elevados índices de dispersão de seu capital social ou de liquidez em suas ações;

  4. criar uma nova hipótese de direito de recesso, nos casos de cisão, incorporação e fusão envolvendo companhia aberta, ao exigir que a companhia sucessora também seja uma companhia aberta.

III - Eliminação do direito de recesso na cisão

Com a nova redação dada pela Lei 9.457/97 aos arts. 136, 137 e 230 da Lei 6.404/76, restou, em princípio, eliminado o direito de recesso na cisão.

Com efeito, dentre, as causas enseja-doras do direito de recesso, enumeradas no àrt. 137 da Lei das S/A, não mais consta aquela prevista no (agora) inciso IX do art. 136, que trata da cisão da companhia.

Ademais, o art. 230 da Lei das S/A, com a nova redação que lhe foi dada pela Lei 9.457/97, prevê expressamente o direito de recesso somente para os casos de incorporação e fusão, não mais para o de cisão de companhias.

É inequívoco, por outro lado, que não foi eliminado o direito de recesso em todas as hipóteses de cisão.

Em primeiro lugar, conforme analisaremos mais adiante, se a cisão envolver companhia aberta e a sociedade sucessora não for companhia aberta, ou não registrar-se como tal na CVM, o acionista dissidente poderá exercer o seu direito de recesso.

Em segundo lugar, conforme já analisado doutrinariamente,2 é mantido o direito de recesso em outras hipóteses que podem decorrer da operação de cisão, mas que são autónomas com relação à cisão, em si.

As causas ensej adoras do direito de recesso previstas nos incisos I a VI do art. 136 são, inequivocamente, autónomas, decorrendo, de qualquer delas, o nascimento do direito de retirada para o acionista dissidente, mesmo que eventualmente verificadas como consequência de um processo de cisão, o qual, por si só, não mais acarreta o direito de recesso.

Assim, se, eventualmente, em decorrência da cisão ocorrem: a mudança do ob-jeto social da companhia resultante da cisão; a redução do dividendo obrigatório; a criação de ações preferenciais ou aumento de classes existentes, sem guardar proporção com as demais espécies ou classes; a

Page 126

alteração nas preferências, vantagens e condições de resgate de uma ou...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT