Notas acerca dos tipos societários e da responsabilidade patrimonial dos sócios no direito estrangeiro

AutorFernando Schwarz Gaggini
Ocupação do AutorAdvogado e professor universitário. Pós-graduado/especialista em Direito Mobiliário (Mercado de Capitais) e Mestre em Direito Comercial pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo
Páginas123-135

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Feita a análise da legislação e da situação brasileira, parecem apropriados alguns comentários sobre o direito estrangeiro. Embora se tenha tratado de algumas questões de direito estrangeiro ao longo de passagens do trabalho, tais referências foram feitas de modo pontual. O presente ponto busca sistematizar as características principais que se destacam na legislação societária de alguns países, em especial os tipos societários adotados e as particulari-

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dades neles identificadas, de modo a permitir uma análise comparativa com as escolhas realizadas no Brasil acerca das espécies societárias e responsabilidades atribuídas aos sócios78 - 79.

No direito português, o ordenamento jurídico local contempla cinco tipos de sociedades comerciais, previstas no CSC - Código das Sociedades Comerciais, aprovado pelo Decreto-Lei n. 262, de 2 de setembro de 1986. São elas as sociedades em nome colectivo (SNC), sociedade por quotas (SQ), sociedade anónima (SA) e sociedades em comandita, que podem ser simples ou por ações.

Nas sociedades em nome colectivo (SNC), o CSC determina a responsabilidade subsidiária pessoal ilimitada e solidária entre os sócios, que são detentores de partes sociais correspondentes a frações do capital. Neste tipo, admite-se o sócio de indústria, que poderá ser chamado a responder pelos débitos sociais, hipótese em que lhe surgirá o direito de regresso em relação à sociedade ou, acaso previsto sua responsabilidade, se tornará sócio de capital.

Nas sociedades em comandita, constam os sócios comanditados e os comanditários. Os primeiros de responsabilidade ilimitada, à semelhança da SNC, ou seja, respondem, subsidiariamente à socie-dade, de forma ilimitada e solidária entre sócios dessa categoria, ao passo que os sócios comanditários respondem limitadamente, de forma restrita à sua participação. A comandita divide-se nos subtipos simples e por ações, sendo que nas primeiras os sócios possuem partes sociais, à semelhança da sociedade em nome coletivo, enquanto que, na segunda, possuem ações, tais como na sociedade anônima. Admitem-se sócios de indústria na condição de coman-

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ditados, bem como que a condição de sócio comanditado seja ocupada por sociedade anônima ou sociedade por quotas.

As sociedades por quotas surgiram em Portugal em 1901, sendo este um dos primeiros países a adotar a espécie. Caracteriza o tipo a responsabilidade dos sócios limitada ao valor investido (vide artigo 197, n. 3, do CSC), sendo todos os sócios solidários pelos valores atribuídos a título de entradas. A legislação admite a assunção, por um ou mais sócios, de responsabilidade direta perante credores, solidariamente com a sociedade, desde que previsto em contrato. Nas sociedades por quotas, adota-se um sistema de quota inicial única por sócio, que deve ter valor mínimo de 100 euros, salvo norma legal em contrário.

Ainda em relação à sociedade por quotas, foi feita uma alteração no CSC, efetuada pelo Decreto-Lei n. 257/96, que introduziu a figura das sociedades unipessoais por quotas (SUQ - art. 270 do CSC), em atenção à Décima Segunda Diretiva da Comunidade Europeia. No caso, a SUQ não é um novo tipo de sociedade, mas um subtipo da sociedade por quotas, sendo que o sócio único pode ser pessoa natural ou coletiva. Contudo, uma pessoa natural só pode ser sócia de uma única SUQ, e uma SUQ não pode ser sócia única de outra SUQ.

As sociedades anónimas, por seu turno, adotam as características gerais da responsabilidade limitada atribuída a todos os sócios, determinando o CSC que cada sócio responde somente pelo valor das ações que subscreveu, como de praxe nestas sociedades.

As sociedades comerciais portuguesas são personificadas a partir do registro definitivo do ato constitutivo. Observa-se, ainda, na legislação portuguesa, a estipulação de regras variáveis quanto ao número de sócios admitidos em uma sociedade comercial. Nesse aspecto, a constituição de sociedade anônima exige número mínimo de cinco sócios, e a sociedade em comandita por ações exige um número mínimo de seis sócios, sendo um sócio comanditado e mínimo de cinco comanditários, representando tais regras certa

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restrição ao acesso a estes tipos societários. Ao mesmo tempo, o ordenamento português admite, como visto, a sociedade por quotas unipessoal.

Quanto à forma de integralização do capital social, para alguns tipos societários é exigida a integralização do capital à vista, simultaneamente à celebração do contrato social. Entretanto, algumas exceções são abertas, admitindo-se integralização a prazo, o que se verifica no caso das sociedades por quotas e nas sociedades anônimas. Nestas duas, entretanto, dado o fato do patrimônio social ser a única garantia dos credores, são exigidos montantes mínimos de capital, sendo o de cinco mil euros (€ 5.000) para as sociedades por quotas e cinquenta mil euros (€ 50.000) para as sociedades anônimas. Nas sociedades por quotas, exige-se a integralização, à vista, de no mínimo 50% da quota, e nas sociedades anônimas exige-se 30% do valor nominal das ações subscritas, sendo que o restante deve ser integralizado no período máximo de cinco anos da celebração do contrato de sociedade.

É interessante observar o amplo destaque dado, em Portugal, à questão do valor do capital social da sociedade. Nesse sentido, constata-se a prática de menção da cifra do capital em diversos documentos, como recibos e cupons fiscais, de modo a dar publici-dade do valor do capital da sociedade.

No direito francês, a legislação (Code de Commerce) contempla os seguintes tipos de sociedades comerciais, personificadas a partir de seu registro: a société en nom collectif (SNC), correspondente à sociedade em nome coletivo, com atribuição geral e ilimitada de responsabilidade aos sócios; a société en commandite simple, correspondente à sociedade em comandita simples, com a divisão dos sócios em dois grupos, um de responsabilidade limitada e outro ilimitada; a société en commandite par actions (SCA), equivalente à sociedade em comandita por ações, também com a divisão de sócios quanto à responsabilidade; a société a responsabilité limitée (SARL), equivalente à sociedade limitada; e a société anonyme (SA), corres-

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pondente à tradicional sociedade anônima. Interessante observar a existência, na França, da figura da sociedade anônima simplificada (société par actions simplifiée -...

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