A imigração judaica no Brasil e o anti-semitismo no discurso das elites

AutorNatália Dos Reis Cruz
CargoDoutora em História pela Universidade Federal Fluminense e professora do Departamento de Ciências da Sociedade e Desenvolvimento Regional da Universidade Federal Fluminense
Páginas225-250
Artigo
A imigração judaica no Brasil e o
anti-semitismo no discurso das elites
Natália dos Reis Cruz*
Resumo
Este artigo aborda o anti-semitismo no Brasil, da década de 1920 à de
1940, enfatizando o imaginário das elites brasileiras a respeito dos judeus.
A perseguição aos judeus na Europa contribuiu para imigração judaica
para o Brasil, fazendo com que se formassem bairros judaicos em várias
cidades brasileiras. O discurso das elites do período passava pela defesa
da teoria do branqueamento, com base na miscigenação racial e cultural
e na negação de quistos raciais no país, fazendo com que os judeus se
tornassem um dos alvos de uma política de nacionalização e intolerância
por parte do Estado brasileiro.
Palavras-chave: anti-semitismo, nacionalismo, racismo, intolerância, elites.
Este artigo aborda o discurso das elites, da década de 1920 à de
1940, a respeito da presença de minorias étnicas em território
brasileiro, notadamente os judeus, tendo como princípio norteador
de tal discurso a intolerância quanto à coexistência das diferenças
no espaço público brasileiro.
Até o final do século XIX, a população judaica no Brasil
era pequena, consistindo oficialmente de apenas 300 pessoas.
Dentre elas, havia os descendentes de norte-africanos sefarditas
que haviam migrado para a Amazônia, para participar do surto
econômico da Borracha na segunda metade do século XIX. Já os
* Doutora em História pela Universidade Federal Fluminense e professora do
Departamento de Ciências da Sociedade e Desenvolvimento Regional da Uni-
versidade Federal Fluminense. Endereço eletrônico: ndrc@globo.com.
226 p. 225 – 250
Volume 8 – Nº 15 – outubro de 2009
judeus provenientes da Inglaterra, Alsácia-Lorena, Alemanha e
EUA faziam parte de uma classe média de imigrantes composta
por comerciantes, trabalhadores especializados e profissionais
que, segundo Lobo (1978, p. 446), dedicavam-se ao comércio e
à manufatura no Rio Janeiro. A partir do século XX, notadamente
nas décadas de 20 e 30, a imigração judaica começou a chamar a
atenção de intelectuais brasileiros e membros do governo devido à
“visibilidade excedente”, afinal a população judaica brasileira havia
passado de aproximadamente 15 mil em 1920, para cerca de 75
mil na década de 1940, em conseqüência da vinda de imigrantes
do leste europeu. (LESSER, 1995, p. 29)
Na Europa, os judeus enfrentavam constantemente os cha-
mados Pogroms1, e tal realidade fez com que se iniciasse já no final
do século XIX, tentativas de emigração por parte dessa população
judaica. Este grande fluxo de emigrantes judeus da Europa para
outros países, durante as últimas décadas do século XIX, levou a
um intenso debate entre organizações e lideranças judaicas sobre
a atitude a ser adotada frente à emigração. Enquanto alguns eram
favoráveis à emigração como forma de resolver o problema judaico,
outros achavam que se deviam fazer mais esforços para melhorar a
situação dos judeus nos países em que viviam. Dentre os que defen-
diam a emigração, destacava-se o barão Maurice de Hirsch, nascido
em Munique, em 1831, e pertencente a uma das grandes famílias
judaicas dos séculos XVIII e XIX. O barão de Hirsch dedicava-se à
filantropia especialmente voltada para os judeus da Rússia, com o in-
tuito de ajudá-los a enfrentar as conseqüências das perseguições. Por
isso, em 1891, fundou a Jewish Colonization Association (JCA), que
deixou de lado as práticas tradicionais da filantropia judaica - que
objetivavam aliviar as dificuldades enfrentadas pelos refugiados de
pogroms e pelos emigrantes que afluíam para as capitais da Europa
central e ocidental e para os EUA - para estabelecer uma expatriação
metódica e ordenada de judeus russos. O barão acreditava que a
emigração daria início a um processo de regeneração física e moral
1 Os “pogroms” eram perseguições em massa realizadas contra judeus, incluindo
saques e destruições de casas, realizados em vários países da Europa Ocidental
e oriental.

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