Única Vara do Trabalho de Limoeiro do Norte ? CE

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Processo: 0129000-52.2009.5.07.0023
RITO ORDINÁRIO
Requerente:
Maria Gerlene Silva dos Santos Requerida: Del Monte Fresh Produce Brasil Ltda.

1. Relatório

Maria Gerlene Silva dos Santos ajuizou reclamação trabalhista em desfavor de Del Monte Fresh Produce Brasil Ltda. requerendo a concessão do benefício da justiça gratuita e alegando, em síntese, que seu companheiro falecido, Sr. Vanderlei Matos da Silva foi admitido pela reclamada em 8.4.2005, na função de auxiliar de almoxarifado, consistindo o serviço especi?camente no preparo da solução de agrotóxicos utilizados para serem borrifados sobre a lavoura de fruticultura da empresa, sendo que, a partir de julho de 2008, o obreiro passou a sentir fortes dores de cabeça, febre, falta de apetite, olhos amarelados e inchaço no abdômen. A?rma, ainda, que, em agosto deste mesmo ano, os sintomas se agravaram e o empregado foi obrigado a se afastar da atividade laboral, vindo a falecer em
30.11.2008, três meses após o agravamento de suas condições de saúde, com o diagnóstico de Insu?ciência Renal e Hepática Aguda, bem como Hemorragia Digestiva Alta. Aduz que a empresa realizava exames de saúde semestrais nos seus empregados, porém os resultados não eram disponibilizados aos interessados. Alega, ainda, que a empresa reclamada não contabilizava, no cálculo da jornada laborada, o tempo de percurso para locomoção até o local de trabalho em veículo fornecido pelo empregador, bem como não contabilizava corretamente as horas extras prestadas.

Ante o exposto, requer a condenação da reclamada ao pagamento das horas in itinere e extras não pagas durante o contrato e seus re?exos, auxílio-doença e indenização por danos materiais e morais, bem como o pagamento da verba honorária.

Deu à causa o valor de R$ 358.167,78 (trezentos e cinquenta e oito mil, cento e sessenta e sete reais e setenta e oito centavos).

Procuração do patrono do reclamante às ?s. 24. Foram juntados os documentos de ?s. 25/61. Regularmente noti?cada, a parte reclamada se fez presente à audiência por meio de preposto, sendo recusada a primeira proposta de conciliação.

Defesa escrita do reclamado às ?s. 68/106, alegando, em síntese, que, nos primeiros meses de seu trabalho, no ano de 2005, a jornada do reclamante era através de turnos de revezamento, tendo sido respeitada a legislação obreira vigente e, posteriormente, o trabalhador passou a laborar das 17 h às 01 h, de segunda a sexta, e aos sábados, das 18 h às 2 2h, sempre com 1 h de intervalo, sendo que, nos últimos meses de trabalho a jornada era das 18 h às 03 h, de segunda a sexta, e aos sábados, das 18 h às 22 h, sempre com 1 h de intervalo para repouso. Alega, outrossim, que o de cujus não trabalhava todas as horas do dia, ?cando muitas vezes esperando um chamado para transportar

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material e que eventuais horas extraordinárias foram devidamente pagas. Quanto às horas in itinere, destaca que o percurso do obreiro falecido era inferior a 1 h, tanto na ida como na volta, e que houve celebração de Convenção Coletiva de Trabalho tratando como in itinere somente o percurso que ultrapassar 1 h. Aduz, outrossim, que a doença que ocasionou a morte do de cujus não teve nexo causal com as atividades desenvolvidas na empresa, vez que o obreiro não mantinha contato direto com os produtos químicos, transportando-os fechados e munido de todos os equipamentos de proteção individual. Além disso, alega que todos os exames periódicos realizados pela empresa não apontavam qualquer doença do obreiro e que nenhum outro empregado faleceu em decorrência do trabalho na empresa. Isto posto, requereu, dessa forma, a improcedência de todos os pedidos da inicial.

Procuração dos patronos da demandada às ?s. 117 e Carta de Preposto às ?s. 118.

Foram juntados os documentos de ?s. 63/307. A parte reclamante se manifestou acerca da contestação e documentos apresentados pela reclamada às ?s. 312/318.

A requerimento da reclamada, este Juízo determinou que fosse fornecido o prontuário completo do de cujus durante o período em que ?cou internado no Hospital Universitário Walter Cantídio, tendo sido fornecido pelo referido órgão os documentos de ?s. 320/452.

A reclamada se manifestou acerca do prontuário médico do de cujus às ?s. 458/461.

Foram dispensados os depoimentos pessoais. Prova testemunhal às ?s. 504/505.

Opinou o Ministério Público do Trabalho, às ?s. 507/516, pela existência de nexo causal entre o óbito do empregado Vanderlei Matos da Silva e o seu labor em contato com os agrotóxicos na empresa e consequentemente pela condenação da reclamada ao pagamento à reclamante de indenização pelos danos morais e materiais sofridos.

O Ministério Público do Trabalho juntou aos autos, às ?s. 517/1547, o processo de Inquérito Civil, no qual foi investigada a possível responsabilidade da reclamada pelo óbito do Sr. Vanderlei Matos da Silva.

As partes se manifestaram acerca do Inquérito Civil às ?s. 1564/1578 e 1583/1591.

Foram apresentados memoriais pelas partes às ?s. 1607/1617 e 1620/1624.

Em sede de memoriais, o MPT reiterou os termos da manifestação de ?s. 507/516 (?s. 1630).

Foi encerrada a instrução processual sem a produção de outras provas (ata de ?s. 1605).

Em síntese, é o relatório.

2. Fundamentação
2.1. Dos Benefícios da Justiça Gratuita

Defere-se em favor da autora os benefícios da Justiça Gratuita, posto que o pleito preenche os requisitos legais para a sua concessão, nos termos do art. 789, § 3º, da CLT, sendo certo que a declaração de miserabilidade pode ser efetuada a qualquer tempo e através de procurador na própria petição inicial, sem necessidade de poderes especiais para tal ?nalidade, conforme já paci?cado pelo C. TST nas Orientações Jurisprudenciais de ns. 269 e 331 da SDI-1.

Ressalte-se, por oportuno, que com a edição da Lei n. 7.115/83 (art. 1º), deixou de ser obrigatória a apresentação do atestado de pobreza, bastando que o interessado, de próprio punho, ou por procurador com poderes especí?cos, sob as penas da lei, declare na petição inicial que não tem condições de arcar com as custas e despesas processuais sem prejuízo do próprio sustento ou de sua família.

2.2. Do mérito propriamente dito
2.2.1. Das horas extras
2.2.2. Do labor em turnos ininterruptos de revezamento

A autora pleiteia o cômputo como extras das horas laboradas que ultrapassavam o limite

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de seis horas, sob o argumento de que o de cujus laborava em regime de turnos ininterruptos de revezamento.

A empresa demandada, por sua vez, em sua peça de defesa reconhece que nos primeiros meses do seu trabalho, no ano de 2005, o funcionário cumpria jornada através de turnos de revezamento, mas sempre observando a legislação obreira. Aduz, ainda, que o obreiro não laborava efetivamente todas as horas do dia e muitas vezes ?cava ou aguardando ser chamado para transportar os produtos químicos ou conversando na portaria ou no setor de segurança.

Para a con?guração da atividade em turnos ininterruptos de revezamento são necessários dois requisitos: 1) atividade ininterrupta da empresa e 2) revezamento dos trabalhadores em diversas jornadas.

No caso vertente, inexiste controvérsia quanto à con?guração de turnos ininterruptos de revezamento, na medida em que a própria demandada reconhece tal circunstância, corroborada também pelo exame dos controles de ponto adunados aos autos. Entretanto, esses controles revelam que o ex-obreiro somente esteve submetido a tal espécie de jornada no período de agosto de 2005 a janeiro de 2006, ocasião em que laborava em semanas alternadas de 6 h às 15 h ou de 17 h às 1 h, consoante documentos de ?s. 222/228.

Cotejando-se os controles de jornada de tal interregno com os comprovantes de pagamento de salários, veri?ca-se que a reclamada efetuava o pagamento da hora como extra tão somente em relação àquela excedente à 8a diária.

Assim, con?gurado o cumprimento de jornada em turnos ininterruptos de revezamento pelo de cujus em determinados meses do período laboral e inexistindo regular negociação coletiva autorizando o labor em jornada superior a 6 h e limitada a 8 h (Súmula n. 423 do TST) , faz jus a autora, nos termos do art. 7º, XIV, da CF, ao pagamento da 7a e 8a hora como extras, com re?exos, em face da habitualidade, em repouso semanal remunerado, férias, 13º salário, e em FGTS, a serem apuradas no período de agosto de 2005 a janeiro de 2006, observando-se o valor da remuneração à época da rescisão(CLT, art. 59, § 3º), já integrada com o adicional de insalubridade (OJ 47, da SDI-1, TST).

2.2.3. Das horas in itinere

Pleiteia a autora o pagamento de horas extras, sob o argumento de que o de cujus trabalhava em local de difícil acesso, na Fazenda Ouro Verde, Comunidade do km 60, zona rural de Limoeiro do Norte/CE, não servido por transporte público e que sempre utilizava o transporte fornecido pela empresa reclamada, despendendo 2 (duas) horas para chegar ao local de trabalho e mais igual tempo para voltar para casa.

A reclamada, por seu turno, contesta a pretensão, aduzindo que o tempo despendido, tanto no percurso de ida como no de volta, é de aproximadamente 52 (cinquenta e dois) minutos na ida e 55 (cinquenta e cinco) minutos na volta, e que a Convenção Coletiva de Trabalho, no parágrafo segundo da Cláusula 15a (transporte para trabalhadores) estipula que será devido o pagamento das horas in itinere apenas daquelas que ultrapassarem o limite de uma hora para cada percurso.

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