Meio ambiente do trabalho - segurança, higiene e saúde do trabalho

AutorFrancisco Meton Marques De Lima/Francisco Péricles Rodrigues Marques De Lima
Ocupação do AutorMestre em Direito e Desenvolvimento pela UFC. Doutor em Direito Constitucional pela UFMG/Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Ceará
Páginas243-261

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1. Noções gerais

O Brasil investe aproximadamente 5% do PIB com a educação; e aproximadamente 4% com os custos do acidente do trabalho, lato sensu. Urge combatê-lo.

Os incisos XXII, XXIII, XXVIII e XXXIII do art. 7º da CF asseguram ao trabalhador, respectivamente: proteção contra os riscos à vida e à saúde; adicional de remuneração pelo trabalho insalubre, perigoso ou penoso; seguro contra acidente do trabalho, bancado pela Previdência Social, sem prejuízo de ação contra o empregador, quando este incorrer em culpa ou dolo; proibição ao menor de 18 anos de trabalho noturno, insalubre ou perigoso.

Insalubre é o trabalho em ambiente prejudicial à saúde; perigoso é o trabalho sob condições de risco à vida ou à integridade física.

As regras de segurança, higiene e saúde não se aplicam só ao trabalho perigoso ou insalubre, nem só às relações de emprego, mas a todas as formas de trabalho, sob quaisquer modalidades contratuais. Pois em todas elas o trabalhador está sujeito a acidentes de trabalho, a doença profissional e a doenças do trabalho. Mas o cuidado é redobrado no trabalho sob condições perigosas ou insalubres, porque é aqui onde se registram os maiores índices desses males. Por isso, o trabalhador que moureja sob essas condições tem tratamento diferenciado na legislação do trabalho e previdenciária.

A CLT dedica ao tema os arts. 154 a 201, tratando das condições ambientais de salubridade, de tração, dos equipamentos de proteção, dos órgãos de fiscalização e das providências legais obrigatórias visando a preservar a saúde e a integridade física do trabalhador. A Portaria n. 3.214/78, do MTE regulamenta fastidiosamente a matéria. A Lei
n. 7.369/86 institui o adicional de periculosidade no setor elétrico, regulamentada pelo Dec. n. 93.413/86, e a Lei n. 11.932/09 dispõe sobre os limites de exposição humana a campos elétricos, magnéticos e eletromagnéticos.

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2. Direito a um meio ambiente equilibrado

O Direito Ambiental enquadra-se nos direitos fundamentais de terceira geração, mas de primeira preocupação. Os dinossauros, com apenas cem gramas de cérebro, viveram 150 milhões de anos na Terra, enquanto o ser humano, com 1.500 gramas de cérebro, já dá sinais de sua autoextinção aos dois milhões de anos.

“O direito ao meio ambiente adequado é um prolongamento indispensável do próprio direito à vida, e nessa constatação repousam, basicamente, os fundamentos da proteção jurídica ao meio ambiente”, lembra Evana Soares54.

O Direito Ambiental tem por objeto a proteção do meio ambiente: natureza, vida e biodiversidade, tendo em vista a sobrevivência da espécie humana no Planeta Terra e a qualidade da vida. Daí Toshio Mukai lembrar que esse ramo do direito “diz respeito à proteção de interesses pluri-individuais que superam as noções tradicionais de interesse individual ou coletivo”55.

Enquadra-se na categoria de direito fundamental de terceira geração, posto dizer respeito a todos os humanos viventes na Terra. O meio ambiente não se confunde com ecologia, mas enfeixa um conjunto de bens naturais, como a qualidade do solo, do patrimônio florestal, da fauna, do ar atmosférico, da água, do sossego auditivo, da paisagem visual, averba Alsina56.

O Direito do Trabalho enquadra-se nos direitos fundamentais de segunda geração, mas, à proporção que avança, refina-se e vindica para seus destinatários os bônus da cidadania, da qualidade de vida, da dignidade, enfim. E não existe qualidade de vida sem um meio ambiente de trabalho equilibrado.

O ser humano desafia os obstáculos e não desiste de transformar a natureza, na busca incessante de produzir bens e condições para uma vida melhor no planeta Terra. O problema está em diferençar a exploração racional da exploração destruidora da natureza, causando o desequilíbrio ambiental.

Whitehead averba que “a função primordial da Razão é direcionar o ataque ao meio ambiente”, para, numa escala ascendente, atingir o viver < o viver melhor < o viver em condições satisfatórias < o aumento de satisfação57.

E tudo isso se faz através do trabalho humano, ora como explorador, ora como destruidor. E na transformação da natureza, pelo trabalho, o homem agride o meio ambiente e, ao mesmo tempo, sofre os influxos da destruição que provoca. Daí a necessidade de compreender-se melhor o meio ambiente e, neste, o meio ambiente do trabalho, para minimizar os efeitos de suas reações na segurança e na saúde do trabalhador.

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2.1. Meio ambiente

Em termos gerais, são as condições “que influenciam os seres vivos (biota) de um determinado espaço geográfico”, diz Acquaviva58. Observa o mesmo autor que o crescimento demográfico, o desenvolvimento econômico e a concorrência constituem fatores de intensificação da agressão à natureza, motivo pelo qual se impôs uma legislação repressiva eficaz, visando a atenuar os malefícios que a exploração descontrolada causa ao meio ambiente.

A Lei n. 6.938/81 dispõe em seu art. 3º: “Meio ambiente é o conjunto de condições, leis, influência e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”.

A CF/88 dedica ao meio ambiente o art. 225, situado no Título VIIIDa Ordem Social, de onde se extrai que: todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Oportuna a consideração que nos traz Norma Sueli Padilha de que o Direito Ambiental enquadra-se na categoria de direito fundamental da pessoa humana, visto que inerente ao direito à vida e à vida com qualidade. Essa qualidade foi-lhe reconhecida na Declaração do Meio Ambiente, adotada pela Conferência das Nações Unidas, em Estocolmo, em junho de 1972, cujos vinte e seis princípios constituem prolongamento da Declaração Universal dos Direitos do Homem59.

Legislação ambiental principal — Leis ns. 4.771/65 (Código Florestal); 5.197/67 (Código de Caça); 6.938/81 (Política nacional do meio ambiente); 7.347/85 (Ação Civil Pública); 7.735/89 (IBAMA); 7.754/89 (medidas de proteção às florestas das nascentes dos rios); 7.797/89 (danos ao meio ambiente); 8.974/95 (engenharia genética e organismos geneticamente modificados); 9.605/98 (proteção ambiental); Decreto-Lei n. 221/67 (Código de Pesca) e Dec. n. 750/93 (disciplina o corte, a exploração e a supressão de vegetação primária ou nos estágios avançado e médio de regeneração da mata atlântica).

2.2. Meio ambiente do trabalho

É uma parcela do meio ambiente geral. É o local onde se exerce o trabalho, compreendidas as circunvizinhanças. Essa porção de meio ambiente, antes de interessar aos que ali mourejam, constitui um bem de todos, dado que seus rescaldos contaminam todos os circundantes.

E como um microssistema do sistema geral, deve ser protegido, até porque não se terá um todo equilibrado sem que as partes o sejam. Em termos mais restritos, trata-se da humanização do trabalho. Com efeito, o trabalhador consome um terço de sua vida no ambiente de trabalho. E um ambiente sadio integra os direitos fundamentais de todos os seres humanos.

Por isso, observa Sebastião Geraldo de Oliveira, que, estando o meio ambiente do trabalho inserido no meio ambiente geral (art. 225, V, da CF), “é impossível alcançar

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qualidade de vida sem ter qualidade de trabalho, nem se pode atingir meio ambiente equilibrado e sustentável ignorando o meio ambiente de trabalho”60. Daí estabelecer a Constituição Federal que a ordem econômica deve observar o princípio de defesa do meio ambiente (art. 170, VI).

Contundente a lição de Rodolfo Mancuso:

O conceito holístico de meio ambiente não se compadece com situações em que os recursos naturais venham (muito justamente) preservados, mas sem que o ser humano ali radicado seja objeto de iguais cuidados, como quando se vê constrangido a trabalhar em condições subumanas, perigosas, insalubres, degradantes, excessivamente estressantes ou ainda percebendo remuneração irrisória, contrariando a sabedoria popular de que o trabalho é meio de vida e não de morte.61

Em consequência do que se expõe, o objeto do Direito Ambiental do Trabalho é a proteção de um ambiente de trabalho sadio, que proporcione boa qualidade de vida aos trabalhadores, um ambiente desprovido dos agentes insalubres, perigosos, penosos, estressantes. A atuação desse Direito dá-se mediante uma regulamentação rigorosa, normas de caráter imperativo, tendo em vista evitar, neutralizar ou diminuir a ocorrência e os efeitos dos agentes nocivos à saúde ou perigosos à vida.

3. Tutela legal e judicial do meio ambiente do trabalho

Não se trata de ficção ou de produção cerebrina. O ambiente de trabalho, tendo em vista a saúde do trabalhador, encontra ampla disciplinação legal.

Na Constituição, a tutela pode ser identificada de duas maneiras: mediata e imediata. A primeira brota dos arts. 225, V, CF (“controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente”), 170, que alinha, dentre os princípios da Ordem Econômica, a “defesa do...

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