Liminares em Procedimentos Especiais. Parte I: Manutenção e Reintegração de Posse, Interdito Proibitório e Nunciação de Obra Nova

AutorLeandro Vieira
CargoBacharel em Direito com habilitação em Direito Empresarial e Ambiental, especialista pósgraduado em Direito Processual Civil.
Páginas5-8

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Resumo (da primeira parte)

Ao concluir trabalho monográfico que aborda o tema relativo as "tutelas de urgência no processo civil" brasileiro, sob a orientação do culto desembargador Nelson Juliano Schaefer Martins, MsC. (TJSC), percebi a necessidade de escrever sobre o tema "liminares em procedimentos especiais", especificamente tratando dos pressupostos necessários à obtenção dessas medidas.

É que embora as antecipações de tutela (cautelar, genérica e específica) possam, em alguns casos, fazer as vezes das liminares em procedimentos especiais (que no fundo também são antecipações de tutela), outras tantas hipóteses remanescem submetidas à aplicação dessas medidas que, naturalmente, não perderam seu vigor no cenário jurídico nacional.

Essa primeira parte do ensaio principia com a introdução geral do tema, a seguir explanando sobre a distinção dos procedimentos especiais codificados e extravagantes. Finaliza com a apresentação dos requisitos necessários à obtenção de "liminares" nos procedimentos possessórios, na nunciação de obra nova e nos embargos de terceiro.

Sem a pretensão de esgotar o tema ou de apresentar um inédito enfoque teórico sobre ele, a pesquisa tem como objetivo geral destacar a importância da efetividade e eficiência da jurisdição mediante a aplicação das liminares em procedimentos especiais.

1. Introdução

A constante evolução da sociedade e das relações humanas em todas as áreas do conhecimento tem exigido do Estado uma incansável busca pela adoção de políticas governamentais que possibilitem a satisfação do bem comum com eficiência, notadamente no que se refere aos serviços públicos.

Esse objetivo inegavelmente também se insere na atuação do Poder Judiciário, que naturalmente faz parte do vocábulo 'Governo', pois a jurisdição revela uma das funções do Estado1 .

O princípio da eficiência2 da Administração Pública, aplicado aos órgãos do Poder Judiciário, densifica o princípio geral do acesso à Justiça3 e "corresponde, na prática, à prestação de uma justiça eficaz, expedita, rápida, eficiente e adequada às exigências e às necessidades da sociedade", conforme ensina Schaefer Martins4.

Nesse contexto, o estudo e a compreensão das tutelas jurisdicionais denominadas "sumárias" ou "de urgência" deixa de ser tema destinado apenas ao meio acadêmico-científico e passa a ser uma necessidade do cotidiano forense.

Dentre essas espécies de medidas de urgência estão as chamadas "liminares" em procedimentos especiais, cuja concessão se submete à satisfação de requisitos específicos definidos pelo Código de Processo Civil ou pela legislação esparsa.

2. Desenvolvimento
2.1. Os procedimentos especiais (codificados e extravagantes)

O Código de Processo Civil define três espécies de "processo" à disposição dos jurisdicionados: o processo de conhecimento ou de cognição (classificação quinária5 ), o processo de execução (strictu sensu), e o processo cautelar.

A forma e tempo dos atos e solenidades processuais praticados em cada espécie de "processo" define os vários tipos de "procedimentos" existentes no direito processual brasileiro.

O objeto de nosso estudo limita-se à análise dos procedimentos especiais, codificados e extravagantes, que admitem a concessão das chamadas medidas "liminares", e que ao lado do procedimento comum ordinário e sumário compõem o processo de conhecimento (ou de cognição).

Os procedimentos especiais "codificados" são aqueles previstos no Código de Processo Civil, entre os artigos 890 e 1.102c, enquanto os procedimentos especiais chamados "extravagantes" são aqueles previstos em leis federais esparsas.

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Dos procedimentos codificados que admitem a concessão de "liminar" destacam-se as ações possessórias (art. 928), a de nunciação de obra nova (art. 937), os embargos de terceiro (art. 1.051) e a ação de apreensão e depósito decorrente de venda a crédito com reserva de domínio (art. 1.071).

Na legislação extravagante é vasta a gama de procedimentos especiais que admitem a concessão de "liminar", razão pela qual abordaremos apenas os mais comuns às lides forenses primárias, quais sejam o mandado de segurança (LMS, 7º, II), a ação civil pública (LACP, 12), a ação popular (LAP, 5º, § 4º), a ação de alimentos (LA, 4º), a busca e apreensão de bem alienado fiduciariamente (DL 911, 3º) e a ação de despejo (Li, 59, § 1º).

Antes, contudo, de adentrar a análise específica dos requisitos para obtenção de "liminar" nessas várias espécies de procedimentos especiais, impõe-se esclarecer o que é uma medida "liminar".

De acordo com Wambier, as medidas liminares devem ser compreendidas como atos judiciais de cunho decisório praticados no decurso do procedimento, com caráter cautelar (do próprio procedimento) ou satisfativo (tutela antecipatória genérica ou específica), com base em cognição não-exauriente, mas meramente sumária (ou superficial) do juiz6 .

Calmon de Passos7 esclarece que toda liminar é antecipação de tutela, seja ela deferida antes ou depois da citação do réu, pois se defere antes da sentença final aquilo que só com ela seria conferido e, segundo ele, a "tutela que se adiante liminarmente tanto pode ser de natureza cautelar quanto de natureza substancial."

Nota-se, portanto, que as liminares podem ser deferidas (no processo de conhecimento) em qualquer fase do processo, até mesmo na sentença.

Nos procedimentos especiais, todavia, a expressão "liminar" é utilizada sempre como medida antecipatória deferida antes da citação do réu, pois essa é a característica do procedimento, de maneira que se o pedido liminar não for apreciado antes do ato citatório alguns sustentam ser vedado concedê-lo em fase posterior. Nesse sentido, veja-se o Agravo de Instrumento nº 1998.002872-8, julgado pelo TJSC8 .

Passa-se, pois, à análise dos pressupostos de deferimento dessas medidas em cada espécie de procedimento especial.

2.2. Requisitos para concessão de liminar nas ações possessórias

Começando pelos procedimentos especiais codificados, de imediato encontramos as ações possessórias, de reintegração e manutenção de posse, e o interdito proibitório.

Oriundas dos interditos romanos, as ações possessórias no direito brasileiro visam à proteção (manutenção) ou recuperação (reintegração) da posse, ou ainda, sua não-lesão (interdito proibitório).

Todas admitem a concessão de liminar (CPC, 928, caput c.c. 933).

A lei não apresenta requisitos específicos para a concessão de liminar nos procedimentos possessórios, fazendo, em relação às duas primeiras ações (reintegração e manutenção), referência a "estar devidamente instruída" a exordial.

Significa dizer que para a obtenção da liminar o autor de ação possessória deverá demonstrar de forma perfunctória seu direito possessório e a necessidade de urgente intervenção estatal no caso concreto.

Embora nosso tema seja estritamente processual, não haveria como abordá-lo sem que se compreenda o conceito de "posse".

Como é sabido, duas são as teorias que principiaram a discussão científica acerca do conceito de posse, se opondo uma à outra.

A primeira é a teoria subjetiva, criada pelo francês Savigny (Traité de la possession), segundo o qual a posse "é o poder que tem a pessoa de dispor fisicamente de uma coisa, com intenção de tê-la para si e de defendê-la contra a intervenção de outrem"9 . Nota-se que para Savigny dois são os elementos constitutivos da posse, quais sejam o poder físico exercido sobre a coisa (corpus) e a intenção subjetiva do possuidor em mantê-la sob seu domínio (animus).

Opõe-se a essa doutrina a teoria objetiva de Ihering, segundo quem para constituição da posse basta o corpus, dispensando-se o animus. Conforme novamente lembra Washington de Barros10 , "Ihering não contesta a necessidade do...

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