A leitura em sala de aula como mediadora de construção de igualdade de gênero

AutorMarlise Buchweitz Klug - Rosimeire Simões de Lima - Tatiana Bolivar Lebedeff
CargoDoutoranda em Memória Social e Patrimônio Cultural pela Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS - Mestre em Educação pela Universidade de Pelotas, Pelotas, RS - Doutora em Psicologia do Desenvolvimento pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Páginas95-113
http://dx.doi.org/10.5007/1807-1384.2016v13n1p95
A LEITURA EM SALA DE AULA COMO MEDIADORA DE CONSTRUÇÃO DE
IGUALDADE DE GÊNERO
Marlise Buchweitz Klug
1
Rosimeire Simões de Lima
2
Tatiana Bolivar Lebedeff
3
As mãos, porém, não tinham a agilidade da cabeça capaz de perceber
sutilezas e ardis. As mãos de Joana eram dois calos, dois montes de terra
seca, raízes de árvores os dedos, galhos disformes, mãos acostumadas ao
manejo da pá, da picareta, da enxada, do facão, do machado como
manejar lápis, caneta e pena? [...] Rompeu mil pontas de lápis, esgarrachou
quantidade de penas, estragou toneladas de papel, mas nessa maratona
contra o tempo e as mãos inábeis, Tereza foi de exemplar paciência e
Joana, convencida pelos argumentos de Lulu Santos, decidira ganhar,
vontade de ferro. Começou Tereza por cobrir a mão tratada a torpe de
Joana para lhe transmitir leveza e encaminhá-la. (Jorge Amado)
Resumo:
O presente artigo visa refletir sobre ações em sala de aula que permitem discutir a
igualdade de gênero. A partir disso, analisa-se um trabalho com educandos do
Ensino Médio das disciplinas de Língua Portuguesa, Literatura e Produção Textual,
no qual são trabalhados o vídeo Vida Maria, de Márcio Ramos, e os contos A moça
tecelã e Para que ninguém a quisesse, de Marina Colasanti. Os objetivos foram
levar ao universo dos alunos a temática de gênero e fazê-los confrontar suas ideias
com os textos apresentados, tanto pela leitura e debate dos contos, quanto pela
escrita de suas memórias em relação ao lido. A metodologia baseou-se na
discussão de assuntos pertinentes aos adolescentes, e na seleção de textos
escritos e visuais que pudessem trazer reflexões sobre o ser mulher, além do
trabalho em sala de aula de leitura, discussão e debate sobre os textos, e escrita de
análises por parte dos alunos. Os resultados visam a refletir sobre os modos de ser
e de agir que se repetem ao longo dos tempos, para os alunos sujeitos críticos e
talvez até transformadores da realidade em que vivem.
Palavras-chave: Leitura. Gênero. Igualdade. Memória. Identidade.
1
Doutoranda em Memória Social e Patrimônio Cultural pela Universidade Federal de Pelotas,
Pelotas, RS. Mestre em Literatura Comparada pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Bolsista CAPES. Pelotas, RS, Brasil. E-mail: marlise_klug@yahoo.com.br
2
Mestre em Educação pela Universidade de Pelotas, Pelotas, RS. Professora nas Disciplinas de
Língua Portuguesa, Literatura e Língua Inglesa no Instituto Federal Farroupilha, Campus São Vicente
do Sul. São Vicente do Sul, RS, Brasil. E-mail: rosimeiresimoes@gmail.com
3
Doutora em Psicologia do Desenvolvimento pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Pós -
Doutorado pela Montgomery County Comunity College em Ambler, Pensilvânia, EUA. Professora da
Universidade Federal de Pelotas. Pelotas, RS, Brasil. E-mail: tblebedeff@gmail.com
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R. Inter. Interdisc. INTERthesis, Florianópolis, v.13, n.1, p.95-113 Jan-Abr. 2016
1 INTRODUÇÃO
Ao longo da história da humanidade, têm-se inúmeros casos, exemplos de
discriminação dos mais variados possíveis. Dentre eles, os preconceitos e a falta de
respeito entre gêneros são temas que nos preocupam enquanto educadores. Essa
não é a única questão que media o trabalho docente, mas refletir sobre a mesma e
trabalhá-la em sala de aula é sempre urgente, atual e uma ação capaz de trazer
resultados efetivos.
Para Goellner et al (2011)
[...] por gênero entende-se a condição social através da qual nos
identificamos como masculinos e femininos. É diferente de sexo, termo
usado para identificar as características anatômicas que diferenciam os
homens das mulheres e vice-versa. O gênero, portanto, não é algo que está
dado, mas é construído social e culturalmente e envolve um conjunto de
processos que vão marcando os corpos, a partir daquilo que se identifica
ser masculino e/ou feminino (p.20).
Por ser algo que se constrói na sociedade, discutir e refletir sobre gênero é
questão pertinente para o contexto no qual estamos inseridos. Pesquisas mostram
índices altíssimos de violência contra a mulher (DATASENADO, 2013, p. 2-3) e
trazer o assunto para dentro da sala de aula é fator importante para gerar a reflexão
e permitir o olhar do sujeito sobre sua conduta e seus valores. Destaca-se que o viés
de trabalho a ser considerado aqui foi aquele voltado à questão da opressão de um
gênero em relação ao outro.
Além disso, gênero pode também ser designado como o verdadeiro aparato
de produção através do qual os sexos são estabelecidos e não está para a cultura
como o sexo para a natureza; ele é também o significado discursivo/cultural pelo
qual a “natureza sexuada” ou o “sexo natural” é produzido e estabelecido como uma
forma “pré-discursiva” anterior à cultura, uma superfície politicamente neutra sobre a
qual a cultura age (BUTLER, 1990, p. 30). Antes de tudo, a cultura age e nos
designa, nos forja, nos encaminha para o que somos e o que seremos dentro de
uma pauta pré-estabelecida pelas nossas circunstâncias.
Assim, busca-se sempre inserir a temática da igualdade de gênero no
processo contínuo e gradativo que é a docência. Atuando enquanto professoras da
área de Linguagens língua e literatura busca-se utilizar as ferramentas possíveis

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