IRPJ, CSLL e Planejamento Tributário - 1

AutorOctavio Bulcão
Páginas167-183

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IOctávio Bulcão - Bom dia a todos! É com grande satisfação que damos início a mais uma Mesa de debates do XXVII Congresso Brasileiro de Direito Tributário do Instituto Geraldo Ataliba-IDEPE. O tema central, hoje, é "IRPJ, CSLL e Planejamento Tributário". Em primeiro lugar, gostaria de agradecer à organização do Congresso, na pessoa da sua Presidente, professora Maria Leonor Leite Vieira, pelo honroso convite para integrar esta Mesa de debates. Aliás, honra redobrada, pela oportunidade de estar, aqui, ao lado de Professores que eu tanto estimo e admiro, o professor Júlio Maria de Oliveira, o professor José Henrique Longo e o professor Paulo Ayres Barreto. Para iniciarmos os trabalhos, vamos ouvir, primeiro, o professor Júlio Maria de Oliveira, que abordará o tema "A Nova Contabilidade e o IRPJ: Limites na Aplicação das Novas Regras Contábeis". Como os Srs. sabem, o professor Júlio é Mestre e Doutor pela PUC, professor dos Cursos de Pós-Graduação do COGEAE, do IBET e da GV-Law. Com a palavra o professor Júlio de Oliveira.

A Nova Contabilidade e o IRPJ: Limites na Aplicação das Novas Regras Contábeis

Júlio Maria de Oliveira - Bom dia a todos! Inicialmente, eu gostaria de agradecer ao convite que me foi feito. É sempre uma honra estar neste que é, com certeza, um dos mais importantes eventos na área do direito tributário. Gostaria de cumprimentar a todos na Mesa, o professor Octavio Bulcão, o professor José Henrique Longo e o professor Paulo Ayres Barreto. Estou nesta Mesa em uma missão mais de aprendiz do que de transmissor de conhecimento. Essa é uma área que aqueles que estão comigo na

Mesa dominam com um grau de eficiência extremamente elevado. E já aprendi muitas lições com esses Professores, quer seja na esfera doutrinária, quer seja nos diversos julgamentos do CARF e de outros órgãos administrativos.

Hoje nós vivemos - e eu gostaria de começar por este ponto - certa crise dentro deste mundo de relacionamento entre Contabilidade, Direito - e vou até mais longe - e Economia. A Contabilidade querendo trazer o fenômeno econômico mais próximo possível da realidade contábil. O Direito querendo, em algumas situações, espelhar o fenômeno econômico, e muitas vezes querendo se utilizar de uma linguagem contábil mais econômica. Esse fenômeno tem sido vivido dentro da legislação, dentro dos julgados, dentro do grande tema chamado planejamento tributário, que virou um misto de mito e de conduta com características criminais, dentro de alguns vieses e cores.

Há uma tentativa de tratar o Direito como algo estritamente formal, tratar a Contabilidade como algo que se aproxima mais da Economia e da realidade real - perdoem-me a redundância -já que a realidade do Direito não seria suficiente para atingir aquilo que, de fato, acontece no fenômeno econômico. E claro que nós, neste Congresso, temos uma postura de valorizar o Direito. Nós somos profissionais do Direito. Não significa dizer que os profissionais do Direito e o Direito estão acima da Contabilidade, acima da Economia ou o que seja. Mas o fato é: quem é que tem competência para estabelecer condutas e para estabelecer obrigações no mundo social? Sempre foi dito que a linguagem adequada para isso é a linguagem do Direito. E não porque o Direito é superior ou inferior aos demais, mas porque o Direito nasce da representação

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e da legitimidade das urnas. Então, o Direito está legitimado a criar uma realidade que vale para todas as áreas, porque ele vem legitimado por nós, pelo povo, por aqueles que, democraticamente, elegeram seus representantes e criaram o chamado Estado Democrático de Direito.

Então, não me causa nenhuma espécie afirmar que quem cria relações e quem cria obrigações tem que ser, necessariamente, o Direito. A linguagem contábil e a linguagem econômica, para que sejam hábeis e aptas a criar efeitos no mundo jurídico, devem nascer das normas - normas, estas, validamente colocadas no sistema. Eis a razão pela qual eu quis fazer esta introdução, pois dentro do material por mim preparado isso perpassará por toda a idéia que procuro defender. Que não importa seja a antiga Contabilidade ou a nova Contabilidade, o fato é que, para que tenhamos efeitos jurídicos, quer seja na tributação sobre a renda, com o IR e a CSLL, quer seja sobre outras contribuições, como PIS e COFINS, ou outros efeitos diversos, só podemos ter efeitos jurídico-tributários se alterações, se considerações, se ficções, forem criadas dentro do âmbito legislativo. Fora daí, o que teremos são intervenções de outras áreas, que não têm aptidão para gerar obrigações.

Começamos com a promulgação da Lei 11.638/2007, que alterou a Lei 6.404/1976, e comum objetivo bastante claro: adaptar as demonstrações financeiras das companhias brasileiras aos preceitos e demonstrações contábeis adotados internacionalmente. Há diversos autores - e eu poderia citar vários aqui, mas vou citar alguns, e cometerei, com certeza, algumas impropriedades, ao me esquecer de outros. Mas, por exemplo, a professora Elidie Bifano, o professor Roberto Quiroga, o professor Eliseu Martins - e estou até transitando por profissionais que não são estritamente da área jurídica, mas profissionais extremamente habilitados a tratar desses assuntos -, o professor Paulo Ayres, que está aqui à Mesa, também -, que trazem, dentro dessa adaptação, características muito positivas disso. Por quê? A linguagem da Contabilidade quer buscar uma linguagem eficiente, que meça adequadamente o fenômeno econômico. É claro que é uma utopia achar que qualquer ciência ou qualquer técnica vá atingir a realidade. E, aí, lembro alguns autores, como Dardo Scavino e diversos outros, que dizem que a missão de buscar a realidade é sempre uma missão utópica. Nós não conseguimos fazer esse tangenciamento e atingir a realidade, até porque o Direito cria a sua realidade. A Contabilidade e a Economia não criam a sua realidade. O objetivo delas, normalmente, é tentar se aproximar de uma realidade existente. O Direito é mais - me perdoem a palavra - "abusado". Ele adora ficções e ele cria realidades próprias. Muitas vezes somos criticados por isso, porque vivemos nas nuvens, não somos de gabinete e não queremos entender aquilo que está acontecendo na sociedade e tudo o mais. Mas faz parte da linguagem jurídica a abstração daquilo que se quer chamar de realidade real, daquilo que, de fato, é criado pelo Direito.

Então, esse objetivo de trazer a Contabilidade a uma linguagem mais próxima da realidade e uma linguagem mais uníssona, até internacional, é por muitos colocado como extremamente positivo, porque quebra aquele parâmetro de que existe uma Contabilidade para os bancos, uma Contabilidade para o Fisco e uma Contabilidade para outros, terceiros. E, aí, é possível se manusear ou até, entre aspas, manipular resultados, prejuízos e o que seja, dependendo do objetivo que se quer atingir. Na verdade, a Contabilidade teria que ser uníssona - e, aí, copiando Elidie Bifano -, para que se tenha uma Contabilidade tão adequada ao ponto de ser, inclusive, desnecessário existir uma chamada Contabilidade Fiscal - o que seria até uma contradição, porque a Contabilidade não é escrava da área tributária ou de qualquer outra área, mas, sim, independente disso. Mas também, por outro lado, a Contabilidade não pode querer influir em conceitos que são de tributação.

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Essa é a crise que existe neste momento. Se temos uma Contabilidade que, por um lado, não é escrava da tributação, a Contabilidade não existe para habilitar a tributação. Esse é só um dos usos dela. Por outro lado, não se pode adotar conceitos estritamente contábeis não normativos para gerar efeitos tributários normativos.

As principais alterações: convergência às normas internacionais e expressa menção ao Comitê de Pronunciamento Fiscal. E, aí, esse assunto é cheio de letras. Uma "sopa de letrinhas", que é impressionante como, às vezes, podemos nos perder. Só para tornar um pouquinho mais interessante, fiz aqui um arrolamento de siglas, como PRGAP, CFC, CPC, CGM, ECF, FASB, FECONT, IASB, IFRS, MPRTT, SIC, SFAC, FCONT. Então, realmente, é uma área que exige um grau de profundidade e de seriedade para se tratar, em que, para que um profissional de fato esteja pronto a atuar com todo esse universo de siglas e de efeitos, se exige um tempo considerável e uma constante atualização.

E, aí, o mito da prevalência da essência sobre a forma, que foi mais ou menos o que tentei falar desde o começo. Esse é o mito que se vive hoje. Existe uma essência e existe uma forma. Como se a forma fosse contra a essência. Não existe essência sem forma. Se essa essência que se quer buscar não tem uma forma definida, então, ela não é humana. Logo, precisamos, na verdade, de alguém que tenha dons espirituais para que se consiga atingir isso. Uma essência que não está vestida em uma forma não é controlável, não é aferível. Então, essa dicotomía essência/forma me parece muito mais teórica do que real. Porque nós, seres humanos, precisamos da forma para nos expressar. A linguagem é uma forma, e os mecanismos contábeis são, com certeza, uma forma definida. Mas isso não significa que algo que foi feito possa buscar uma essência não declarada ou inexistente, porque se adotou uma forma errônea.

As normas internacionais de Contabilidade estão dentro desse parâmetro. São baseadas mais em princípios do que em regras. Essa é uma característica importante - e todos os que são alunos ou foram alunos do professor Paulo sabem da valoração que o professor traz em relação a esses pontos. Há, atualmente, uma forte tendência de se criar tributação baseada em princípios. Tenho visto alguns autos de infração, lavrados pela Secretaria da Receita Federal, das contribuições ao PIS e à COFINS, baseados em princípios constitucionais, sem a menção a sequer uma norma legal nesse sentido. Aqueles que aprenderam que os princípios são mais abertos, são mais abstratos e não permitem aferir um conteúdo normativo específico provavelmente...

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