Introdução

AutorEduardo Gabriel Saad
Ocupação do AutorAdvogado, Professor, Membro do Instituto dos Advogados de São Paulo
Páginas892-938

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Art 643

Os dissídios oriundos das relações entre empregados e empregadores, bem como de trabalhadores avulsos e seus tomadores de serviços, em atividades reguladas na legislação social, serão dirimidos pela Justiça do Trabalho, de acordo com o presente título e na forma estabelecida pelo processo judiciário do trabalho. (O caput deste artigo tem redação dada pela Lei n. 7.494, de 17.6.86).

§ 1º Revogado pela Lei Orgânica da Previdência Social, L.
3.807, 26.8.60, DOU 29.8.60.

§ 2º As questões referentes a acidentes do trabalho continuam sujeitas à justiça ordinária, na forma do Decreto n. 24.637, de 10 de julho de 1934, e legislação subsequente.

§ 3º A Justiça do Trabalho é competente, ainda, para processar e julgar as ações entre trabalhadores portuários e os operadores portuários ou o Órgão Gestor de Mão de obra — OGMO decorrentes da relação de trabalho. (Acrescentado pela Medida Provisória n. 2.164-41, de 24.8.01).

Notas

1) Competência da Justiça do Trabalho: A Emenda Constitucional n. 45, de 8.12.04, publicada no DOU de 31.12.04, deu nova redação ao art. 114, da Constituição Federal, ampliando apreciavelmente sua competência, verbis: “Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:

I — as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

II — as ações que envolvam exercício do direito de greve;

III — as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores;

IV — os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data, quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição;

V — os conflitos de competência entre órgãos com jurisdição trabalhista, ressalvado o disposto no art. 102, I, o;

VI — as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho;

VII — as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho;

VIII — a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir;

IX — outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei”.

No caso da negociação coletiva for frustrada, assegura a norma constitucional o poder às partes de eleger árbitro (art. 114, § 1º, CF/88).

Contudo, recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente, como estabelece o § 2º, do art. 114, da CF/88, com redação dada pela Emenda Constitucional n. 45, já citada.

Por força dessa mesma Emenda, em caso de greve em atividade essencial à sociedade, com possibilidade de lesão do interesse público, o Ministério Público do Trabalho poderá ajuizar dissídio coletivo, competindo à Justiça do Trabalho decidir o conflito (art. 114, § 3º). Essa titularidade do Ministério Público do Trabalho relativamente ao dissídio coletivo de greve é, no caso, concorrente relativamente ao empregador exercente da atividade essencial à sociedade. Quer dizer, esse empregador poderá, também, ajuizar o dissídio coletivo de greve, o que desobriga o Ministério Público do Trabalho em ajuizar também essa ação. Com isso, haverá o respeito do direito individual desse empregador de acesso ao Poder Judiciário, conforme lhe garante o disposto no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal: “XXXV — a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

1.1) Hermenêutica da Norma Constitucional em Geral e da Norma Constitucional Processual do Trabalho: Como aqui estamos examinando certos dispositivos constitucionais (art. 114), devemos fazer algumas considerações acerca das técnicas que são utilizadas para bem se descobrir o real significado da norma neles insertos. Para isso, devemos utilizar da denominada hermenêutica.

A hermenêutica tem por finalidade o estudo sistemático dos processos utilizados na fixação do sentido e da abrangência das normas legais. As regras de hermenêutica são legais (arts. , e , da Lei de Introdução ao Código Civil, que, com a Lei n. 12.376, de 30.12.10, passou a ser denominada Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro — LINDB), de jurisprudência, criadas pelos tribunais, e científicas, apontadas pelos doutrinadores.

Estão compreendidas na hermenêutica (a) a interpretação (b) a integração — que se desdobra na analogia, na equidade, na jurisprudência, princípios gerais do direito (v.art. 8º, da CLT); e (c) a aplicação da lei no tempo e no espaço territorial.

De origem etimológica grega, a hermenêutica tem sua gene-alogia no deus Hermes, que era o intérprete da vontade divida. Hermenêutica, em um sentido amplo, quer dizer “compreender o significado do mundo”, conforme Heidegger.

Já a interpretação, como parte integrante da hermenêutica, “tem origem latina — “interpres” — que designava aquele que descobria o futuro nas entranhas das vítimas. Tirar das entranhas ou desentranhar era, portanto, o atributo do “interpres”, de que deriva para a palavra interpretar com o significado específico de desenhar o próprio sentido das palavras da lei, deixando implícito que a tradução do verdadeiro sentido da lei é algo bem guardado, entranhado, portanto, em sua própria essência” (conf. Fernando Coelho, s/ob “Lógica jurídica e interpretação das leis”, ed. Forense, 1981, p. 182).

É curial que, em termos interpretativos, os Princípios Fundamentais da República Federativa do Brasil (art. 1º a art. 4º, CF/88) têm precedência quanto à enunciação dos Direitos e Garantias Fundamentais (art. 5º a art. 17). Porém, isto não quer dizer que essa precedência acarrete o surgimento de uma hierarquia entre as normas constitucionais, de modo a classificá-las em normas superiores e normas secundárias. Na verdade, todas são normas fundamentais.

A interpretação da Constituição Federal é uma necessidade constante, pois somente por meio da conjugação da letra do texto com as características do momento — históricas, políticas e outras essenciais para a inteligência da sociedade e da compreensão

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do ser humano — encontrar-se-á o melhor sentido e conteúdo da norma jurídica, em confronto com a realidade sociopolítico-econômica. Com isso, deseja-se encontrar sua plena eficácia.

Em sua preciosa obra “Fundamentos da Constituição”, Moreira Canotilho, enumera os princípios e regras interpretativas das normas constitucionais, quais sejam:

a) da unidade da constituição: a interpretação constitucional deve ser realizada de maneira a evitar contradições entre suas normas; b) do efeito integrador: na resolução dos problemas jurídico-constitucionais, deverá ser dada maior primazia aos critérios favorecedores da integração política e social, bem como ao reforço da unidade política; c) da máxima efetividade ou da eficiência: a norma constitucional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe conceda; d) da justeza ou da conformidade funcional: os órgãos encarregados da interpretação da norma constitucional não poderão chegar a uma posição que subverta, altere ou perturbe o esquema organizatório-funcional constitucionalmente estabelecido pelo legislador constituinte originário; e) da concordância prática ou da harmonização: exige-se a coordenação e combinação dos bens jurídicos em conflito de forma a evitar o sacrifício total de uns em relação aos outros ; f) da força normativa da constituição: entre as interpretações possíveis, deve ser adotada aquela que garanta maior eficácia, aplicabilidade e permanência das normas constitucionais (ob. cit. p. 136, Coimbra editora, 1991).

Além desses princípios muito bem analisados por Canotilho, impõe-se que haja a necessidade de delimitação do âmbito normativo de cada norma constitucional. Com isso, identifica-se sua razão de existência, finalidade e extensão. Atente-se, ainda, que uma norma constitucional tem uma finalidade ou função útil no ordenamento, não sendo cabível uma interpretação que lhe suprima ou diminua essa finalidade ou função.

E mais, ainda.

Surgiu, no universo jurídico, em tempo recente, a opinião de que a ideologia é imprescindível na interpretação das leis, de modo geral. Pela ideologia, é feita a valoração que leva aos objetivos da ação do homem dentro da sociedade. Segundo essa corrente, na interpretação se há de levar em conta a apontada valoração predominante num dado momento social, o que importa dizer ter ela de modificar-se à medida que se transforma o contexto social.

Por outras palavras, não se vai buscar o significado da norma na vontade histórica do legislador, mas do intérprete no instante em que se pretende aplicar a lei a uma situação concreta.

A crítica que fazemos a esse método de interpretação é que lhe é implícita a ideia de que a maioria da sociedade segue a ideologia invocada na análise do texto legal. E a minoria que não abraça essa ideologia como deve entender a lei? O exame de uma lei não tolera discriminação ideológica, sob pena de cairmos em uma ditadura criada pelas pessoas que julgam.

Aqui lembramos de Kelsen. Para ele (‘‘Teoria General del derecho y del Estado’’, p. 140 e seguintes) o intérprete extrai da norma legal as várias decisões que ela comporta e escolhe uma delas. Assim, a interpretação não equivale a uma atividade puramente intelectual, mas a um ato de vontade. Na raiz desse ato de vontade, estão múltiplas influências que não se há de desconhecer. O pensamento kelseniano — descritivo como é — não é rejeitado por nós.

Como dito anteriormente, o Direito do Trabalho desgarrou-se do Direito...

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